O amor, a cidade e a ilusão
Li Noites Brancas com um misto de sensações. Só Dostoiévski é capaz de fazer a alma doer e, ao mesmo tempo, aquecer. Seu personagem? Um sonhador sem nome. Sua história? Quatro noites e uma manhã. E, ainda assim, parece que vivemos uma vida inteira com ele.
Noites Brancas não é um romance qualquer. É uma pequena joia da literatura russa. Escrita antes das obras mais densas e existencialistas de Dostoiévski, ela guarda algo raro em sua bibliografia: ternura. É um Dostoiévski jovem, mais lírico do que sombrio, mais esperançoso do que revoltado. Mas, ainda assim, um Dostoiévski — com tudo aquilo que só ele sabe dizer.
O cenário é São Petersburgo. Uma cidade que não dorme, onde as noites de verão são claras demais para esconder os sentimentos. E ali, entre pontes, canais e bancos de praça, dois solitários se encontram. Ele sonha com o amor. Ela espera por outro. O que se segue é um diálogo de almas. Um balé de palavras ditas e não ditas. Uma dança entre o que poderia ter sido e o que jamais será.
A literatura russa tem esse poder: ela entende que somos feitos de ausências. Que, às vezes, um encontro breve marca mais do que anos de convivência. Que há pessoas que passam pela nossa vida para mostrar que aquilo que sentimos era, sim, real — mesmo que não tenha durado.
Dostoiévski escreveu Noites Brancas em 1848, mas poderia ter escrito ontem. Porque todo mundo, em algum momento da vida, já foi esse personagem sem nome, alguém que ama sozinho, que sonha demais, que se agarra a uma esperança como quem se agarra à beira do abismo. E, no fim, aprende que até a dor pode ser bonita, se for sentida com verdade.
Se você está cansado de histórias previsíveis, de amores de plástico e de finais amarrados com laços vermelhos, leia Noites Brancas. É um conto de amor e de perda, sim. Mas, acima de tudo, é um lembrete: há beleza em sentir, mesmo que seja só por quatro noites e uma manhã.
Boa leitura!