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Adão Negro


Por: Odailson Volpe de Abreu
Data: 27/10/2022
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Nessas duas últimas semanas que estive fora e sem possibilidades de escrever para esta coluna, muita coisa aconteceu no cinema e não diria que foram coisas positivas. Por exemplo, nesses quinze dias que antecedem a  coluna vimos a promissora nova trilogia Halloween que trouxe de volta em grande estilo a musa do gênero slasher Jamie Lee Curtis ter um fechamento muito aquém do que todos esperavam. Para piorar, na semana passada o aguardado filme encabeçado pelo The Rock, sonhado e gestado por ele ao longo de pesarosos dez anos, chegou ao cinema amargando críticas terríveis. Ou seja, a temporada em Hollywood não anda nada boa. Será que os profissionais destinados à escrita e criação estão precisando de uma lufada de ar fresco e inspiração para trazerem histórias realmente de sucesso para a Sétima Arte? De qualquer forma, na coluna dessa semana, dedicarei-me a esse filme de The Rock, que é a nova estreia da DC/Warner apresentando um aguardado anti-herói nas telonas, o poderoso Adão Negro.

Qualquer pessoa que tenha mais de 30 anos traz gravada na memória a terrível imagem do péssimo trabalho de CG (computação gráfica) do Escorpião Rei no filme o Retorno da Múmia, de 2001. Aquela foi a primeira vez que tive contato com The Rock, que hoje prefere deixar essa sua alcunha dos tempos de lutador de lado e ser chamado de Dwayne Johnson. O (d)efeito especial era tão ruim que ele parecia ter saído de um jogo de computador de quinta categoria, mas justiça seja feita, era o que a tecnologia podia oferecer naquele momento. Desde então eu nunca vi Dwayne Johnson como um grande ator, para mim ele sempre foi apenas um estereótipo muito bem-vindo para filmes rasos que abusavam de clichês.

No entanto, ao longo da última década o mundo saiu dos eixos sob vários aspectos e, podemos dizer, que um deles foi no gosto pelo mal gosto (a afirmação poderia ser muito bem aplicada no sentido político, mas o foco aqui é outro, por isso está voltada apenas para a cultura, então sigamos). Esse mal gosto está em filmes rasos, classificados assim por exibirem roteiros genéricos e fundamentados exclusivamente no excesso de violência. Foram esses filmes que fizeram de Dwayne Johnson um dos atores mais bem pagos de Hollywood. Com isso, não é possível afirmar que ele usufrua de prestígio no mundo do cinema, mas tem influência o suficiente para orbitar ao redor de grandes franquias de blockbusters que o ajudaram a estar permanentemente na mídia. Ao longo desse tempo ele passou a nutrir o sonho de levar para as telas grandes um personagem poderoso e pouco conhecido do panteão da DC Comics, o Adão Negro.

Acreditar que Adão Negro é apenas um contraponto ou um tipo de nêmesis do Capitão Marvel (agora conhecido como Shazam por causa da empresa concorrente) é um erro bastante crasso. Digo isso porque esse personagem que originalmente recebeu os poderes do Mago Shazam foi capaz de potencializá-los quando se deixou seduzir pelo, digamos, “lado negro da força”. Nos quadrinhos ele se mostra tão louco e onipotente que não está de igual para igual apenas com seu arqui-inimigo Shazam, mas é capaz de cobrir na porrada os seres mais poderosos da mitologia da DC, tais como o Superman ou a Mulher-Maravilha. Por isso, ele é um personagem de peso e uma mina de ouro para qualquer tipo de produção cinematográfica.

Possivelmente essas características do Adão Negro nos quadrinhos tenham sido o ponto forte que levou The Rock a sonhar em interpretar esse personagem no cinema, sonho esse que perdurou ao longo de uma década. Nesse meio tempo, tivemos o encerramento da incrível trilogia do Batman de Christopher Nolan e a ascensão e queda do Universo Cinematográfico da DC idealizado por Zack Snyder. Agora, o que restou foi uma colcha de retalhos que tenta aproveitar da melhor forma um ou outro herói de maneira isolada, numa busca desesperada por fazer frente comercialmente à concorrência acirrada da Marvel/Disney.

Aproveitando esse momento de fraqueza da DC/Warner, DwayneThe Rock” Johnson conseguiu convencer os figurões a investirem em seu projeto. Angariou um excelente diretor, Jaume Collet-Serra, que já havia feito parceria com ele no recente Jungle Cruise e levaram o projeto a cabo. Aí, temos um problema! Dwayne não é o suprassumo da interpretação e seu maior dom é fazer cara feia enquanto desce a porrada indistintamente sobre qualquer um. Em seus filmes essa única qualidade é levada à exaustão enquanto ele troca apenas o pano de fundo e os coadjuvantes entre uma obra e outra. Mantendo essa zona de conforto, tudo isso se repete em Adão Negro.

Como grande apreciador das obras cinematográficas da DC/Warner desde o final dos anos 1980, quando o grande Tim Burton apresentou ao mundo o seu memorável Batman, sempre sou positivo em relação aos filmes de heróis da DC. Sempre espero o melhor, porque sei que eles têm consciência do valor que seus personagens possuem para a cultura pop ao redor do mundo. Por isso, mesmo quando os críticos enxergam apenas defeito, sempre tento manter o olhar do fã, que se diverte e se deleita com a obra, independente das picuinhas que os críticos insistem em perpetuar entre Marvel e DC. Mas, nesse caso, é preciso ter em mente que alguns aspectos do filme podem incomodar até o mais fervoroso dos fãs.

Tudo bem que no site agregador de críticas mais famoso do mundo, o Rotten Tomatoes, a avaliação dos fãs é exorbitante perto da avaliação da crítica especializada. Mas independente disso, o que mata no filme é seu roteiro e fica muito difícil defender uma obra que se estende por duas horas, tendo começo, meio e fim seguidos por um novo começo dentro de um arco só! O roteiro escrito por Sohrab Noshirvani, Adam Sztykiel e Rory Haines dá a impressão de  que cada um escreveu a sua própria história e depois juntou tudo, como os alunos do Ensino Médio fazem em suas apresentações de trabalho em grupo. Para fazer isso funcionar, várias reviravoltas foram incorporadas entre uma luta e outra, mas mesmo assim, é difícil manter o foco. Por se tratar de um filme de origem, o melhor núcleo narrativo é justamente aquele que trabalha o protagonista, mas, infelizmente, justamente esse núcleo parece ser o menos contemplado ao longo da trama.

O trabalho de direção se esforça sobremaneira para incorporar um tom mais artístico à herança estética que Zack Snyder deixou para os filmes da DC. Por isso, entre uma ou outra cena de ação em câmera exageradamente lenta, você tem ângulos diferentes, jogos de câmera e tomadas em alta velocidade em ambientes urbanos que são muito legais. O Trabalho de CG é sólido e bastante crível, os figurinos são bonitos e convincentes, a trilha sonora não é memorável, mas ainda assim é marcante. Por isso, tecnicamente o filme é bom, seu problema é pura e simplesmente o roteiro.

As atuações atendem à demanda. Como de costume, The Rock gosta de ostentar um elenco coadjuvante de peso em seus blockbusters, por isso estão na obra o eterno 007 Pierce Brosnan, o rei da comédia romântica adolescente da Netflix, Noah Centineo e os excelentes Quintessa Swindell e Aldis Hodge, todos eles compondo os heróis da subutilizada Sociedade da Justiça. E sim, estou indignado! Incorporar esse grupo de heróis clássicos das HQs para servir apenas de suporte ou ocasionalmente de saco de pancadas para o The Rock é no mínimo um sacrilégio (olha eu sendo fan-boy aqui). Além deles, está de volta Viola Davis, incorporando novamente a famigerada Amanda Waller (Davis interpretou esse mesmo papel anteriormente nos dois longas do Esquadrão Suicida). Vamos à trama!

Nascido no Egito Antigo, Adão Negro foi um servo durante toda a sua vida, até a sua morte trágica. No entanto, ele renasceu como um deus, recebendo os poderes de sete deuses egípcios, sendo eles super força, velocidade, resistência, capacidade de voar e de disparar raios. Consumido pelo próprio poder, foi aprisionado logo em seguida. Ao ser finalmente liberto de sua tumba, ele ressurgirá como aquele que estabelecerá um novo nível de justiça para o mundo atual.

Qual o balanço final, vale a pena assistir? A resposta é: vale sim! Não me interpretem mal, mas esse não é um filme ruim, ele só não está aos pés das grandes obras apresentadas pela DC/Warner anteriormente. Ele é divertido, é visualmente bonito e faz jus ao preço da entrada do cinema. Mas, lembre-se, Adão Negro traz em seu bojo os mesmos problemas dos filmes de heróis que se arrastam a anos, principalmente aqueles que apresentam equipes, como no caso a Sociedade da Justiça. Dentre esses problemas, é possível destacar a rapidez no desenvolvimento dos vários personagens, as frases de efeito exageradas, ou mesmo, os infindáveis clichês típicos do gênero. Sem falar no problema do roteiro que não irei retomar aqui. Independente disso, o cara que quer ir ao cinema para ver um herói ou, no caso, um anti-herói descer porrada em geral vai ficar feliz e vai sair de lá mais do que satisfeito. Por isso, se você deseja diversão descomprometida, vá ao cinema e aprecie a obra na tela grande, pois Adão Negro é seu filme! Boa sessão!

Assista ao trailer:

Odailson Volpe de Abreu


Anuncie com Jornal Noroeste
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