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Contra o Mundo


Por: Odailson Volpe de Abreu
Data: 02/05/2024
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Quem nasceu entre os anos 1980 e 1990 cresceu tendo como principal divertimento os filmes de ação. Uma época em que filmes de valentões truculentos, especialistas em “tiro, porrada e bomba” faziam a alegria desde os mais jovens até mais velhos. Nomes como Arnold Schwarzenegger, Sylvester Stallone, Bruce Willis e Mel Gibson alcançaram fama incontestável nesse período e colhem até hoje os frutos dessa época. Com o passar do tempo os filmes de ação cederam espaço para os filmes de aventura, que muitas vezes aproveitam muito desse gênero para dar mais dinamismo e adrenalina a seus enredos. Atualmente, o cinema de ação vive uma espécie de ressurgimento, com filmes que resgatam a essência do gênero e o apresentam de maneiras inovadoras. Um bom exemplo disso é a franquia John Wick. Lançada em 2014, ela conquistou tanto o público quanto a crítica por meio de um estilo visual único que combina lutas coreografadas com cenários estilizados e uma trilha sonora envolvente. Com isso, estava composta a receita para o novo tipo de filme de ação, que vem cada vez mais ganhando espaço. Outro ponto interessante dessa nova leva de filmes do gênero ação é a troca no perfil dos protagonistas, antes eram musculosos e truculentos, agora apresentam um tipo físico muito mais comum e versátil, o que gera mais identificação entre o público e os protagonistas.

Nessa onda de novos filmes de ação, estreou recentemente nos cinemas o longa Contra o Mundo, que segue bem essa cartilha da nova ação, oferecendo uma narrativa frenética e embalada por cenas de luta coreografadas com maestria. Com direão de Moritz Mohr e produção de ninguém menos que o mestre Sam Raimi (responsável pela melhor franquia cinematográfica do Homem-Aranha de todos os tempos), o filme se constrói tendo como bases fortes muitas referências de cultura pop, apresentando uma obra que se aproxima tanto da linguagem dos quadrinhos, quanto do visual e ritmo dos jogos de luta. 

O ponto de partida de Contra o Mundo está em uma trama que se baseia essencialmente em vingança, um conto de redenção embalado por uma atmosfera distópica e opressora. A história acompanha Boy, interpretado pelo talentoso Bill Skarsgård, um jovem cuja vida foi brutalmente transformada pelo regime totalitário da dinastia Van Der Koy. Após testemunhar o assassinato de sua família e sofrer torturas que o deixaram surdo e mudo, Boy emerge das sombras como uma máquina de vingança, determinado a derrubar aqueles que oprimem a sociedade. Seu treinamento com um xamã impiedoso, vivido por Yayan Ruhian, molda-o em um guerreiro formidável, pronto para desafiar o poder estabelecido em um festival anual de brutalidade e corrupção. Nesse ponto o público encontrará algo muito interessante em relação ao protagonista. Isso porque ele, após o treinamento, se transforma numa verdadeira máquina de matar, mas seu desenvolvimento emocional não acompanha o seu treinamento, fazendo com que ele seja uma verdadeira criança no corpo de um grande guerreiro, algo que torna o personagem muito mais complexo.

A já citada forma como o filme combina elementos do mundo pop em uma colagem empolgante, tece uma narrativa que é ao mesmo tempo familiar e surpreendente, tornando Contra o Mundo uma obra verdadeiramente excepcional. Das referências aos filmes de Quentin Tarantino à estética hiper-realista de Blade Runner, passando pela velocidade estonteante de diretores como David Leitch e Guy Ritchie, o filme se apropria de uma miríade de influências para criar um universo cinematográfico único. Este é um mundo onde a violência é elevada à categoria de arte, onde cada cena de ação é uma dança mortal, uma coreografia de destruição que desafia as leis da gravidade e da razão.

No entanto, Contra o Mundo não se contenta em ser apenas uma ode aos clássicos do cinema de ação. Ele também apresenta uma série de reviravoltas inesperadas, um humor insano e um elenco que brilha em cada cena. Começando pelo próprio Skarsgård, que personifica o protagonista com uma intensidade magnética, enquanto Michelle Dockery, Brett Gelman e Sharlto Copley trazem uma dose de irreverência à trama, interpretando membros excêntricos da dinastia Van Der Koy. Suas performances são um verdadeiro deleite para o público, injetando uma dose de humor ácido em meio à carnificina desenfreada.

A estética de Contra o Mundo também merece destaque, com uma direção que valoriza cada detalhe visual, cada momento de tensão e cada explosão de violência. As cenas de luta são coreografadas com uma precisão impressionante, capturando a brutalidade crua do combate e a elegância fluida dos movimentos. É como se o filme dançasse entre a vida e a morte, entre a luz e a escuridão, em uma sinfonia de caos e destruição. Os fãs de jogos no estilo Mortal Kombat irão se identificar prontamente com a estética e os exageros das lutas, que lembram muito as finalizações famosas e absurdas dos embates desse jogo. Vale a pena ressaltar que nesse sentido, o filme não se leva tanto a sério, abrindo espaço para esses exageros. Há quem reclame desse tom mais descontraído da obra, sem perceber que isso, no entanto, é proposital.

Assim, também é preciso considerar que Contra o Mundo não é isento de críticas. A falta de inovação na narrativa e o foco excessivo na ação em detrimento do desenvolvimento dos personagens podem limitar o impacto emocional que o filme poderia produzir junto ao público. Além disso, algumas reviravoltas podem parecer forçadas ou previsíveis para alguns, diminuindo o impacto geral da trama. No entanto, essas falhas são amplamente compensadas pela intensidade visceral da experiência cinematográfica, pelo humor afiado e pelas performances magnéticas do elenco.

Um último ponto que chama a atenção e merece destaque é a forma como o protagonista conduz a trama. O fato de Boy ser surdo e mudo faz com que seus pensamentos narrem a história, estabelecendo uma relação muito singular entre ele e o público. É como se o público estivesse lendo uma HQ de ação ao longo do filme, e os pensamentos de Boy fossem balões de diálogo, gerando uma forma muito peculiar de interação.

Por que ver esse filme? Contra o Mundo é uma obra que transcende as fronteiras do gênero de ação, oferecendo uma experiência cinematográfica que é ao mesmo tempo emocionante, provocativa e profundamente humana. É um filme que desafia as convenções do cinema mainstream, ao mesmo tempo em que celebra sua essência mais pura. Em um mundo dominado por sequências intermináveis de blockbusters repletos de clichês e sem alma, Contra o Mundo é um lembrete poderoso sobre a força que o cinema tem para transportar o público para mundos indesejáveis, desafiando-o a questionar e a explorar os limites da própria humanidade. Um filme para assistir sem muito esforço ou reflexão, onde o único foco está na diversão. Bom divertimento e boa sessão!

 

Odailson Volpe de Abreu


Anuncie com Jornal Noroeste
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