O Voto e a Prática Democrática
Democracia e voto, desde sua origem grega, mantiveram uma relação de casamento, embora a democracia em seus moldes gregos, mais especificamente na cidade de Atenas, apresenta-se uma noção mais restritiva ainda do que em nossa atualidade. A maioria não tinha o status político de cidadania e por esse motivo, era negada a sua participação nas questões de governo da cidade. Mulheres e estrangeiros não tinham qualquer possibilidade de participação na vida política. Deve-se destacar que a participação democrática neste quadro era direta, mesmo havendo a eleição de representantes, a partir não do preenchimento de cédulas ou do uso de urnas eletrônicas, mas da contagem de conchas depositadas em sextos, o que serviu de inspiração para a prática eleitoral nos moldes mais atuais.
Temos então a seguinte questão: já desta fase, a manipulação tornava-se viável e praticável nos eventuais pleitos? Uma resposta afirmativa não será nenhum exagero. Por sinal, um dos pontos contemporâneos envolvendo a querela entre o modelo de democracia participativa e representativa, passa por esta questão: uma democracia representativa, apresenta-se sempre exposta aos riscos de fraudes e manipulações. Não perderei tempo aqui discutindo a fundo esse ponto, pois exemplos históricos não faltam para ilustrar esse problema.
Contudo, quero ressaltar que o voto é apenas uma parte da práxis democrática. Essencial, obviamente, mas para se estabelecer uma sociedade mais democraticamente saudável, outras questões devem ser tratadas como as que envolvem a imposição dos interesses de grupos ou indivíduos sobre o interesse público, os conflitos ideológicos que desagregam a estrutura social e política, a desigualdade social e econômica, posturas antiéticas que alijam o povo de seus direitos e as ações autoritárias, solapam e corroem os alicerces democráticos. Sendo assim, tais questões determinam a necessidade de se problematizar muito além do voto ou do modo de se eleger um representante de forma lícita e democraticamente consciente, ultrapassando-se uma urna ou uma cédula, tornando urgente reflexões e ações que nos levem à uma participação cidadã que busque de fato uma democracia senão perfeita, pois seria uma pura utopia, mas possivelmente mais justa, igualitária e ativa para todos.
Rogério Luís da Rocha Seixas
Rogério Luís da Rocha Seixas é Biólogo e Filósofo Docente em Filosofia, Direitos Humanos e Racismo Pesquisador do Grupo Bildung/IFPR e-mail: rogeriosrjb@gmail.com