Os Cavaleiros do Apocalipse em Tempos do Ômicron
Reconheço que o título desta nova exposição de ideias parece a chamada de um livro ou filme de ficção científica. Ou mesmo, algum tema que se proponha a uma discussão ou pregação religiosa. Contudo, longe de qualquer cenário fictício, Ômicron refere-se à denominação escolhida para batizar a nova variante da Coronavírus, responsável pelo efeito avassalador de contágios pelo mundo. Remeto-me aqui à figura bíblica dos quatro cavaleiros do apocalipse: a peste, a fome, a guerra e a morte, não objetivando desenvolver uma reflexão ou discussão teológica, mas sim indicar a presença constante destes cavaleiros na história humana com as guerras, que por mais que se busque a paz, o eco dos tambores se mantém ativo. Ao fazer menção à guerra, nosso ano novo, marcado pela presença da pandemia da Covi-19 na figura da variante Ômicrom, traz consigo ecos da guerra. Assiste-se por exemplo, ao agravamento de tensões quanto à ameaça de uma intervenção militar na Ucrânia, por parte da Rússia. O conflito na Síria, que se faz persistente e chancelado pela disputa entre Estados com diferentes aspirações, intensificam tanto a permanência desta cruenta guerra, assim como a sua violência e mortandade. Ecos de novos conflitos nos balcãs europeu, palco histórico de guerras, começa a preocupar a tão combalida União Europeia. Tal quadro beligerante, ecoa em meio a uma pandemia que por si só, atua enquanto um inimigo, oriundo de nossa total irresponsabilidade, diga-se de passagem.
Significativamente, a atual pandemia da Covid-19, persiste em demonstrar a nossa fragilidade, perante epidemias e doenças, que devastaram populações inteiras como a peste negra e que ainda devastam populações, ao longo de toda a história humana. A sombra da morte nos acompanha e em geral, tememos muito mais por não aceitarmos exatamente tanto a nossa fragilidade quanto uma existência de finitude. Outro ponto: o como morrer nos assusta. Contraditoriamente, continuamos aperfeiçoando formas mais eficazes de matar. Quanto a fome, penso que seja o cavaleiro que se sobressai, pois com a guerra gera-se a destruição dos modos de suprir a vida. Por sua vez, a peste se fortalece, ceifando a vida de muitos. A morte triunfa, por meio de nossa ignorância e vontade de destruir e dominar os outros. Prevalece o desejo de poder e conquista. Temos a expressão permanente do aço, dos germes e das armas, como terrenos férteis, para a cavalgada dos cavaleiros. Sob as patas destes cavaleiros da barbárie, princípios éticos básicos como a sacralidade da vida ou do direito ao bem viver, além do direito político a ter direitos, são destruídos.
Observando nossa atualidade, aparentemente não escapamos desta epopeia humana, marcada pela violência à vida e descaso com as condições mínimas de existir. Apesar da sofisticação e potencial tecnocientífico elevado e mesmo com condições sociais e econômicas mais ricas e desenvolvidas do que em outras épocas, a fome mundialmente continua ceifando com a morte por inanição e abertura para doenças, populações inteiras, que ainda são assoladas pelas guerras.
Obviamente, necessitamos ser otimistas realistas. Evitar o excessivo pessimismo, assim como o cinismo político e moral. Rejeitar os negacionismos e fanatismos. Todavia, finalizo nossa discussão, destacando o livro de Jared Diamond denominado de “Armas, Germes e Aço – Os Destinos das Sociedades Humanas”. Não é um livro recente, mas continua essencial para refletirmos e cuidarmos da história humana em sua coletividade. Nesta obra, o autor descreve que a história da Humanidade desde a Antiguidade, constrói-se pela busca de povos que dominam as armas, utilizando-se do poder bélico para matar e conquistar. Os germes, se dominados por uns povos e não por outros, pode auxiliar nas conquistas e dominações. E o aço, representando a tecnologia empregada para suplantar o outro e dominá-lo. Estes fatores históricos que apresentam as faces dos nossos cavaleiros do apocalipse têm sido vitoriosos. Assim, a história humana é um mosaico de conquistadores e conquistados. Custe o que custar. Em qualquer situação. A Covid-19 pode nos servir de lição, para que aprendamos algo e possamos tentar de fato, refrear a cavalgada dos cavaleiros.
Jared Diamond. Armas, Germes e Aço – Os Destinos das Sociedades Humanas. Ed. Record. 1997.
Rogério Luís da Rocha Seixas
Rogério Luís da Rocha Seixas é Biólogo e Filósofo Docente em Filosofia, Direitos Humanos e Racismo Pesquisador do Grupo Bildung/IFPR e-mail: rogeriosrjb@gmail.com