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A Cor Púrpura


Por: Odailson Volpe de Abreu
Data: 15/02/2024
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Algumas histórias são feitas para serem refletidas; quando bem adaptadas para uma mídia como o cinema, tornam-se clássicos e fixam-se na memória das pessoas como algo intocado. Mas qual é o sentimento quando alguém resolve recontar essa história de uma forma diferente, como um musical? Muita gente tem-se feito essa pergunta e tem ido buscar a resposta no cinema, assistindo à versão musical de A Cor Púrpura que acaba de estrear. Bem por isso, gostaria de construir o texto dessa semana em sentido de comparação.

Vamos recomeçar recordando a trama do filme! A Cor Púrpura conta a história de Celie, uma mulher afro-americana que enfrenta décadas de abuso e adversidades no sul dos Estados Unidos no início do século XX. O enredo acompanha sua jornada de autodescoberta e empoderamento, destacando suas relações complexas com as pessoas ao seu redor. Ao longo da narrativa, Celie encontra apoio em laços inesperados e busca sua própria identidade, superando desafios e injustiças sociais.

Essa história, tanto na versão cinematográfica de 1985 dirigida por Steven Spielberg quanto na mais recente adaptação musical de Blitz Bazawule, transcende o tempo e continua a provocar reflexões sobre questões sociais profundas. Ao analisar ambas as versões, é possível identificar diferenças marcantes, não apenas no estilo narrativo, mas também na abordagem visual e na capacidade de transmitir a intensidade das emoções presentes na trama.

A versão original de Spielberg, lançada em 1985, é reconhecida por sua habilidade em abordar temas pesados como racismo, abuso e violência doméstica de maneira impactante e inesquecível. O filme recebeu aclamação da crítica e estabeleceu-se como um clássico do cinema. A adaptação cinematográfica de Spielberg capturou a essência sombria e poderosa do livro de Alice Walker, apresentando uma narrativa densa que mergulha nas complexidades da vida de Celie.

Ao contrário da versão clássica, a abordagem do filme musical que está em cartaz nos cinemas oferece uma perspectiva mais leve e performática, com uma estética que homenageia os musicais da era de ouro de Hollywood. A escolha por transformar A Cor Púrpura em um musical da Broadway trouxe elementos de teatralidade e musicalidade, introduzindo batidas de jazz e soul para guiar a trama. Essa abordagem, embora vibrante e repleta de cores, criou um contraste marcante com a intensidade do material original, comprometendo a profundidade emocional que define a obra.

Uma das críticas direcionadas à versão musical tem sido a dificuldade em capturar a mesma sobriedade presente na adaptação de Spielberg. A narrativa intensamente impiedosa, que acompanha a vida de Celie ao longo das décadas, é fundamentada na sua passividade diante do abuso, uma escolha que cria um impacto dramático profundo. No entanto, o filme musical não consegue transmitir com a mesma eficácia a gravidade de certas situações, seja pela falta de intensidade em cenas cruciais ou pela escolha de retratar parte do abuso fora da tela.

Outro aspecto que incomoda na versão musical são as armadilhas sentimentalmente artificiais presentes em quase todo o filme, indicando que o cineasta Blitz Bazawule não alcançou o mesmo nível de sensibilidade e contemplação que Spielberg trouxe à narrativa de 1985. A capacidade de permitir que o horror seja absorvido pela audiência, sem apelar para apelos emocionais excessivos, tem que ser compreendida como um aspecto crucial que, nesse caso, pode afetar a imersão na trama.

No que diz respeito ao elenco, a presença de Halle Bailey e Tajai P. Henson chama a atenção, mas é Danielle Brooks quem se destaca, reconhecida pelo público devido à sua participação na série Orange is the New Black. A indicação de Danielle Brooks na categoria de Melhor Atriz Coadjuvante no Oscar deste ano demonstra que, independentemente dos desafios que o filme carrega consigo, sua qualidade foi reconhecida, muito graças ao trabalho excepcional de Brooks.

A decisão de transformar A Cor Púrpura em um musical certamente oferece uma experiência única e vibrante. Independente das questões técnicas, o filme ainda é inspirador, o longa soube explorar de maneira eficaz o arco de suas protagonistas, estabelecendo um contraste entre cada uma delas e transformando-as em um amálgama que reflete a vida da mulher negra no passado. No entanto, é crucial ponderar se essa abordagem, por mais celebrativa que seja, consegue preservar a autenticidade e a intensidade emocional da obra original.

É interessante encarar a versão musical como uma homenagem aos clássicos musicais da MGM, desconsiderando a perda de certos elementos impactantes, especialmente aqueles que têm uma conexão profunda com a versão cinematográfica de 1985, assim a obra se torna mais palatável. De qualquer forma, A Cor Púrpura, tanto na sua versão clássica quanto na adaptação musical, continua a ser uma história poderosa que aborda questões fundamentais da condição humana.

Por que ver esse filme? Mesmo que você já tenha visto a versão de 1985, ainda assim deve prestigiar a versão musical de A Cor Púrpura pois essa é uma oportunidade de vivenciar uma abordagem artística singular e envolvente. A adaptação transforma a narrativa densa do clássico em um espetáculo, onde elementos musicais, como batidas de jazz e soul, enriquecem a trama, proporcionando uma experiência sensorial única. Agora, se você não é fã de musicais e quer uma experiência mais impactante eu aconselho que você veja (ou reveja) a obra de Spielberg de 1985. Boa sessão!

Odailson Volpe de Abreu


Anuncie com Jornal Noroeste
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