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Laicidade e liberdade religiosa como direito humano


Por: Rogério Luís da Rocha Seixas
Data: 23/06/2020
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Expondo as minhas ideias com vocês em mais uma oportunidade, trago um tema um tanto espinhosos, mas essencial para uma sociedade que se quer democrática: a laicidade, as liberdades e os direitos humanos ou mais especificamente a liberdade religiosa como direito humano e  a necessidade do reconhecimento de todas as confissões, além de também reconhecer os direitos e liberdades dos que não professam qualquer tipo de crença. Minha iniciativa em expor esta problematização passa pelo incômodo de testemunhar o crescimento da intolerância religiosa em nossa sociedade contra principalmente religiões de matriz africana, fato que não deixa de expressar uma face do racismo estrutural. Outro ponto que me estimulou foi o abandono da discussão referente à importância da laicidade que se encontra declarada em nossa constituição. 

Indubitavelmente, a novidade estabelecida pela modernidade, refere-se ao seu antropocentrismo, reconhecendo o ser humano como sujeito de consciência moral autônoma e portador de determinados direitos inalienáveis: os direitos humanos. Direitos como a vida e a liberdade são naturais e próprios ao ser humano. Significa afirmar que enquanto pertencentes ao gênero humano, todos nascem iguais e livres

Acerca do conceito de liberdade religiosa, chegou-se à conclusão que essa se constitui como um direito subjetivo, relativo à singularidade de cada pessoa natural, levando-se em conta as respectivas condições de existência e expressão, responsável pelo livre desenvolvimento da sua personalidade humana e autodeterminação.  Não obstante o individualismo imanente à liberdade religiosa, a realidade plural religiosa, característica das sociedades modernas, especialmente como a brasileira, pressupõe o exercício de expressão religiosa e da prática de cultos religiosos com base na alteridade e no encontro e respeito às religiões diferentes, eixos que se fundem na dignidade da pessoa humana, e, por conseguinte, na de toda a sociedade. Como fenômeno subjetivo, a confissão religiosa do indivíduo representa um valor e um interesse que também podem ser próprios de uma comunidade específica perante outras comunidades com valores e interesses outros, todas devendo ser resguardadas pelo Estado laico em sua liberdade e em seu direito de manifestação. Por sua vez, a condição do Estado laico tem como objetivo, estipular a separação entre Igreja e Estado, embasado no direito positivo de modo a reger as relações entre o Estado e as confissões religiosas nos espaços nacionais.  

A laicidade reconhece e garante a mais ampla liberdade de consciência e de expressão religiosa, não discriminando os cidadãos por razão de suas crenças e por também não professarem nenhuma, seja por meio de privilégios, seja mediante desvantagens quaisquer. Sendo assim, demonstra-se incompatível com qualquer privilégio temporal ou espiritual conferido a uma opção particular, quer seja religiosa ou mesmo ateia.  O que se pode constatar desse modo é o seguinte: 1) a liberdade religiosa como direito só pode ser garantida quando o Estado é laico — aqui se dá a importância da Lei; 2) o Estado laico aparece como fruto da crença no progresso das relações humanas.

Os direitos mais universais do ser humano, liberdade e igualdade, permitem ou deveriam permitir uma união verdadeira que não impeça as diferenças, mas sim que organize a sua convivência fraterna. A laicidade visa promover a tolerância com relação às diferentes cosmovisões religiosas, sem favorecer, promover ou subvencionar religiões; obstaculizar ou discriminar religiões; sem tomar a religião como orientação para a Estado. Ressalte-se que a modernidade e a democracia, como a experimentamos, somente foram possíveis em razão do processo de laicização do espaço público. Faz-se necessário entender que a religião não é incompatível com a democracia, a questão passa pela subordinação da ação política a um princípio não político e subjugado por princípios estabelecidos por grupos clericais, sem respeitar o espaço público. A Laicidade ganha então a forma de reivindicação e ação cidadã por reconhecimento e garantia de direitos. Deve-se ressaltar que a diversidade religiosa se encontra presente na construção de nossa sociedade e compõe a sua esfera pública.  A função do Estado laico torna-se indispensável para a preservação da democracia, da pluralidade e da igualdade religiosa (da crença e não-crença). 

No contexto étnico-cultural nacional, marcado pela diversidade religiosa, o Estado, deve promover e garantir a convivência harmoniosa entre os diversos credos e evitar qualquer tipo de prática de intolerância. Assim, a concretização do princípio do Estado laico na sociedade brasileira, deve passar pelo compromisso dos agentes públicos, em respeitarem a diversidade religiosa, reforçando a neutralidade estatal e a prática democrática. Garantir atualmente a liberdade religiosa significa a garantia em primeiro plano da identidade religiosa. O ideal laico é positivo, mas não é não reativo, cuidando e pondo em destaque o que é comum a todos os homens, buscando preservar uma esfera pública para a liberdade e convivência das suas diferenças. Por esse motivo rejeita-se a tentativa de estabelecimento de poder clerical, mas não se rejeita a presença da religião.

Rogério Luís da Rocha Seixas

Rogério Luís da Rocha Seixas é Biólogo e Filósofo Docente em Filosofia, Direitos Humanos e Racismo Pesquisador do Grupo Bildung/IFPR e-mail: rogeriosrjb@gmail.com


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