A generic square placeholder image with rounded corners in a figure.


Demarcação e apagamento


Por: Rogério Luís da Rocha Seixas
Data: 05/06/2023
  • Compartilhar:

Quando se abre algum espaço para reflexão, discussão e exposição de ideias, sobre um tema tão polêmico como a restrição da demarcação do território indígena, paixões acaloradas e posições ideológicas exageradas, praticamente calam o debate e obscurecem a tentativa de se construir uma análise mais lúcida e equilibrada. Destaco, entretanto, um ponto que acredito ser indubitável: trata-se de uma temática importante para nossa constituição política, social e histórica. Talvez, posso acrescentar sem nenhum exagero, expressa também uma questão moral.

Deixando de lado oportunismos, vitimismos e idiossincrasias, esta aprovação da demarcação do território indígena, apresenta-se enquanto uma prática de apagamento dos povos indígenas. Uma prática comum, oriunda da nossa herança do Colonialismo. Mas como assim? Ao nos referirmos aos povos indígenas hoje, não podemos deixar de lembrar de seus ancestrais. Que estamos nos referindo a povos originários, onde seus espaços naturais foram invadidos e seus corpos colonizados por “estrangeiros.” Passaram a ser tratados como “seres infantilizados.” Os bons selvagens! Sumariamente, foram sendo expulsos de suas terras! Expulsão que ainda continua. Excluídos e praticamente apagados, quanto a sua importância cultural e histórica, para a construção de nossa sociedade. Muitas vezes, são notados apenas a partir de uma percepção exótica de seus hábitos e costumes ou qualificados na condição de inúteis e “vagabundos.”

A questão da demarcação, acentua diretamente o apagamento físico dos corpos indígenas, sofrendo cada vez mais com as restrições e encolhimento de espaço territorial para se estabelecerem e viverem, encontrando-se mais e mais ameaçados por diferentes e diversas práticas de violência. Negam-se as condições mais básicas para sua existência.  Contudo, quero ressaltar uma outra forma de apagamento violenta e talvez mais comum: apagar a cultura e saberes destes povos indígenas.

Estratégia de apagamento, utilizada pelos colonizadores, tanto os antigos como os atuais, desqualificando o potencial e o papel dos povos originários quanto a constituição de conhecimento de mundo. Apagando os saberes originários! Os desqualificando e excluindo, inclusive no interior das próprias populações indígenas, para recusem os conhecimentos e costumes ancestrais, adotando totalmente a visão colonizadora. Pode-se fazer referência a um assassinato dos conhecimentos próprios aos povos originários, os desqualificando e excluindo. Temos assim, simultaneamente, o apagamento cultural e físico dos corpos indígenas. Há uma contínua prática de desumanização, facilitando o processo de apagamento. Penso que o ponto central passa por aqui:  precisamos reconhecer e respeitar a humanidade dos povos indígenas. Não os idealizando ou romantizando. Respeitando seus direitos de ser e existir. Desta forma, penso que necessitamos evitar e recusar a intensificação das formas de apagamento de sua humanidade, para mantermos viva a humanidade de todos nós.

Rogério Luís da Rocha Seixas

Rogério Luís da Rocha Seixas é Biólogo e Filósofo Docente em Filosofia, Direitos Humanos e Racismo Pesquisador do Grupo Bildung/IFPR e-mail: rogeriosrjb@gmail.com


Anuncie com Jornal Noroeste
A caption for the above image.


Veja Também


smartphone

Acesse o melhor conteúdo jornalístico da região através do seu dispositivos, tablets, celulares e televisores.