Quando um ano acaba é natural que a maioria das pessoas faça as suas retrospectivas e planejem o novo ano que se inicia.
Começar uma dieta, fazer aulas de dança, gastar menos, e seguimos com uma lista que é enorme. Parece que ao encerrar um ano, as pessoas adquirem mais esperanças de que algo mude no ano que vem. E digo que esse sentimento de esperança é necessário. Quando se encerra um ciclo, e não apenas o ano - que também é um ciclo de 12 meses - é natural que um novo começo surja, e com ele, novas experiências.
Algumas outras pessoas, porém, devido talvez a vivências ruins, não conseguem esperar que coisas boas coisas aconteçam no próximo ano. Não querem criar expectativas para não frustrarem-se, preferindo ficar, portanto, no limbo de sua própria existência aonde os dias apenas seguem o seu fluxo.
Há ainda um terceiro tipo de pessoas: as indiferentes. Normalmente essas pessoas também possuem esse tipo de comportamento com outras mudanças e passagens durante a vida. Esse grupo de pessoas são aquelas que quase não verbalizam seus sentimentos, guardam mágoas, rancores, dificilmente fazem planos para o que quer que seja, e continuam com suas vidas, sobrevivendo dia após dia.
Para uma grande parcela das pessoas, o final do ano traz tristeza e angústias, dificultando com isso, o começo de algo novo. Estão fixas em suas posições diante do mundo, diante do que aconteceram com elas. É preciso o espaço do vazio para que algo novo aconteça, e algumas pessoas, têm tanto medo de criar esse lugar, que às vezes passam uma vida inteira lamentando como teria sido se tivesse feito outras escolhas.
Encerrar ciclos não é tarefa fácil para ninguém, é preciso tempo, trabalho de elaboração, lutos, e preciso coragem, muita coragem para dar o primeiro passo em direção a isso.
Mas, a boa notícia é que sempre há tempo, uma vez que a vida começa todos os dias. As metas, objetivos, desejos para o novo ano por vezes são muitos, são tantos, que ás vezes, sem saber por onde começar acaba-se não se fazendo nada.
Precisamos contar sempre com aquilo que é possível. Às vezes, a pessoa “planeja” uma viagem para a Europa, por exemplo, mas está desempregada. É preciso sonhar, é preciso querer sim, mas é necessário que façamos uma avaliação interior e exterior para que nossas ações sejam concretizadas. Dei esse exemplo, mas poderia ter dado muitos outros. O ponto é só para mostrar a vocês sobre a necessidade de contar sempre com aquilo que podemos, entendendo os nossos limites, pois a maioria das nossas frustrações vem de nossas escolhas.
E por falar em escolhas, quando optamos por um caminho, outros ficam para trás. É a lei da vida. É por isso que um novo ano nos dá esse gás, essa coragem para decidir sobre algumas questões importantes em nossa vida. Uma dieta, por exemplo. E qualquer outra coisa que você decida fazer no próximo ano que se inicia, se não tiver outras coisas envolvidas, a possibilidade de desistência em alguns meses, ou até semanas, é grande.
O que quero dizer é que uma meta sozinha não se sustenta, é preciso mais. É preciso se indagar, questionar-se qual é o seu verdadeiro desejo. Tomamos o exemplo da dieta novamente.
Se eu quero emagrecer para atender aos ideias da sociedade, é possível que isso não se sustente por muito tempo. O desejo não é para mim, talvez até seja numa mensagem invertida, mas o verdadeiro desejo não é meu. Compreendem?
Qualquer coisa que você deseje precisa partir de você, e ter como principal foco, a mim mesma. O que vier depois disso são as colheitas, que se forem plantadas por nós mesmos, rendem sempre ótimos frutos.
Deixo aqui como reflexão um poema de Carlos Drummond de Andrade:
Receita de Ano Novo
Para você ganhar um belíssimo Ano Novo
cor do arco íris, ou da cor da sua paz,
Ano novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
Para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
Novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens? Passa telegramas?)
Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumidas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo.
Eu sei que não é fácil,
Mas, tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila desde sempre.