O Estado de Guerra no cotidiano das Comunidades
Ao iniciar esta nova troca de ideias, preciso agradecer ao amigo Cacá, por sua contribuição para discussão sobre um tema tão importante do ponto de vista, social, ético, político e econômico, que diz respeito a uma sociedade desejosa de fato em se tornar cada vez mais consolidada em valores como justiça, solidariedade, respeito a diversidade e a alteridade, a promoção da equidade e reconhecimento da vida humana. Ressalto que Cacá é morador de uma comunidade afetada intensamente por este estado de guerra, na cidade do Rio de Janeiro. Sendo assim, sua contribuição para a reflexão desta nova troca de ideias foi essencial.
Inquestionavelmente, o panorama de grandes cidades como a do Rio de Janeiro, apresenta em comum um estado de guerra quotidiano, que afeta a vida principalmente das populações das assim denominadas comunidades. Um estado de guerra onde cada indivíduo encontra-se encurralado por um lado por facções criminosas que traficam drogas e impõe uma ordem de terror no dia-a-dia das comunidades. Por outro lado, as forças ditas de segurança do Estado, que também estabelecem medidas de intensamente bélicas e repressoras, impondo uma forma de terror oficial em nome do combate ao crime. Em uma guerra há sempre violação de corpos e de direitos. No estado de guerra cotidiano que afeta as comunidades, as violações e mortes acontecem enquanto realidades e ameaças diários que se tornam até comuns.
Neste ambiente de guerra naturalizada e diária, existem alguns aspectos que devem ser refletidos e discutidos: Mortandade e violações de corporais e de direitos são comuns neste quadro. Os moradores das comunidades são identificados como “colaboradores dos criminosos”, logo estão envolvidos com a atividade criminosa e são caracterizados como potencialmente “bandidos” e “ameaças à segurança pública”
Ao mesmo tempo, os corpos negros ou não brancos, que compõe a maior parte dos moradores das comunidades, são vistos como potencialmente perigosos e violentos. A cor negra representa violência, agressividade e marginalidade. Desta forma, a guerra ganha uma conformação social, econômica e racial. Estabelece-se um maniqueísmo onde o corpo negro-pobre-morador de comunidade, representa um “mal”, uma “bestialidade”, a “imoralidade” e a “marginalidade”. Impõe-se uma forma de desumanização aos corpos dos moradores de comunidades, legitimando o estado de guerra e justificando a morte e a violação constante, pois não são vistos enquanto seres humanos, mas sim na condição sub-humana e degenerada, ou seja “criminosos” ou “bandidos”. Sendo assim, são naturalizados enquanto ameaças que precisam ser eliminadas, mesmo que por meio de um estado de guerra cotidiano. Penso que precisamos e devemos trabalhar cada vez mais para buscar um estado de paz.
Rogério Luís da Rocha Seixas
Rogério Luís da Rocha Seixas é Biólogo e Filósofo Docente em Filosofia, Direitos Humanos e Racismo Pesquisador do Grupo Bildung/IFPR e-mail: rogeriosrjb@gmail.com