M3GAN
Como prometido, essa semana é tempo de falar de M3GAN, o filme já estreou há mais de uma semana e tem surpreendido positivamente, isso porque ele vai muito além da dança performática da boneca assassina que quebrou a internet recentemente. Se você não viu, é porque não está fazendo o devido uso do seu pacote de dados (risos)! Essa semana, você vai ficar muito bem informado sobre a nova boneca queridinha a aterrorizar o cinema, M3GAN.
Convenhamos, a premissa não é nova. Desde que a humanidade resolveu reproduzir sua imagem e semelhança em miniaturas para entreter sua prole, homens e mulheres tem sido atormentados por esses pequenos objetos: as bonecas. Bem por isso, já faz tempo que elas estão protagonizando filmes do gênero terror. Só para citar alguns bem conhecidos, temos Chucky, o Brinquedo Assassino, Anabelle, ou mesmo o Boneco do Mal, que fugiu bastante do estereotipo. Mas, mesmo assim, M3GAN chegou aos cinemas com ares de novidade, isso porque dentre os filmes citados esse é o único capaz de conectar plenamente as novas gerações tecnológicas a esse subgênero do terror.
Diante disso, nem preciso comentar que o maior feito de M3GAN é não ter nenhuma pegada sobrenatural. Nesse sentido, James Wan, o mesmo de filmes como Jogos Mortais e Invocação do Mal, acerta em cheio em seu roteiro, que foi escrito com a ajuda de Akela Cooper. O roteiro é rápido, bem embalado e recheado de situações e dilemas do tempo atual, por isso, é tão fácil se identificar com a história. Tudo é muito simples e muito plausível. Diante das maravilhas tecnológicas que contemplamos todos os dias, ninguém irá se assustar se no lugar de um Tesla (os maravilhosos carros elétricos), a empresa de Elon Musk lançasse uma boneca/androide.
O diretor Gerard Johstone é quase um desconhecido em Hollywood, no entanto, ele faz uma construção muito sólida de personagens, inclusive da boneca, de forma que o público nutre desde o início muita empatia para com as figuras femininas da trama. Interessante que a boneca, ao longo do filme, acaba sendo um reflexo da personalidade de sua dona, a pequena e “traumatizada” Cady. É muito divertido ver que, quanto mais a garota se apega à boneca e se torna dissimulada, mais a boneca distorce suas expressões em ares de perversidade. Isso é muito divertido, porque vai acontecendo aos poucos e a sensação que se tem é que apenas você, como público, percebe, já os protagonistas não.
Alinhando seu filme terror de boneco diretamente com o subgênero slasher (aquele com assassinos psicopatas que matam aleatoriamente), M3GAN vai eliminando todos que se colocam no seu caminho e atrapalham a sua missão de proteger física e emocionalmente a pobre Cady. O filme é muito divertido, porque as mortes são inusitadas e ocorrem com muita criatividade, de forma que há um certo bom gosto em apenas sugestionar certas situações, sem necessariamente torná-las explícitas. Um exemplo disso é a morte do garoto malvado, malcriado e dado a se divertir por meio do bullying.
Sobre o elenco, as duas protagonistas merecem todo o destaque. Primeiro Violet McGraw, que com sua forma de interpretar faz com que o público oscile seus sentimentos em relação a ela. No início, existe pena e empatia, mas conforme ela vai se fechando no mundo que criou juntamente com seu brinquedo e se torna, emburrada, birrenta e dissimulada, essa identificação entra para um segundo plano e há uma certa revolta. Depois, a atriz Allison Williams, que brilhantemente faz com que sua personagem caminhe pelo sentido contrário, por isso, da pouca identificação por parte do público no início — quando se revela como uma engenheira nerd, egoísta e antipática —, ela passa a ser vista como a vítima de toda a situação.
Diante disso, algo que precisa ser destacado é a forma como a história original se descola de outras obras que apresentaram robôs ou androides fora de controle recentemente, dentre elas o próprio Vingadores — Era de Ultron. Em M3GAN o diretor se inspira menos nesses filmes famosos e muito mais na série Black Mirror, aquela que aproxima a sua trama tanto da cultura pop, quanto da morbidez tecnológica. E mais, o diretor lança mão abertamente disso para construir sua personagem central, o que lhe confere um carisma e um sarcasmo todo especial. Preste atenção, por exemplo, na trilha sonora que casa perfeitamente com a personalidade psicótica e assassina de M3GAN, fique atento à forma como ela canta docilmente a música Titanium, de David Guetta, para impor sua indestrutibilidade.
Vamos à trama! Após um acidente de carro na neve, a jovem Cady perde seus pais e fica órfã, por isso, precisa ir morar com sua tia Gemma, uma brilhante engenheira que trabalha numa indústria de brinquedos. Ao enfrentar dificuldades em se conectar com a criança e vendo a possibilidade de perder sua guarda, Gemma retoma um projeto para criar uma boneca androide que possa auxiliar, instruir e proteger sua sobrinha. Tudo vai bem, até que a inteligência artificial da boneca começa a dar indícios de perversidade e psicopatia.
Por que ver esse filme? Porque o filme é, ao mesmo tempo, tenso e divertido. Mesmo sendo sanguinário, ele nos faz repensar nossa própria relação com o mundo tecnológico atual e nos faz rir da forma como o nicho dos brinquedos infantis acaba ganhando espaço para além das crianças no mundo atual. O filme é de terror, mas a crítica é para todos, pais, filhos, consumidores, nerds e, até mesmo, para a própria indústria e mercado. Um filme realmente pop, de fácil acesso, porém divertido. Com uma história interessante e bem direcionado para as novas gerações. Como era de se esperar, o desfecho aponta para uma possível sequência, para a alegria dos fãs de plantão. Boa sessão!
Assista ao trailer: