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Expondo as Escrituras: A norma da Lei no coração


Por: Fernando Razente
Data: 29/07/2024
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Romanos 2.15: “Estes mostram a norma da lei gravada no seu coração, testemunhando-lhes também a consciência e os seus pensamentos, mutuamente acusando-se ou defendendo-se,”

No último texto desta coluna — Lei natural e o julgamento de Cristo —  expus o versículo 14 de Romanos 2, apresentando a doutrina de que os gentios (não-judeus), embora não tenham recebido de Deus a revelação especial registrada nas Escrituras (a “Lei”), mostram através de seus comportamentos morais que “(...) procedem, por natureza, de conformidade com a lei,”.

Ou seja, há nos gentios — como reflexo da imagem e semelhança de Deus (Cf. At 17.25) —  uma noção moral (o que chamei de lei natural) a respeito de como devem proceder; há uma norma geral inscrita na consciência dos seres humanos  in foro conscientiae — e essa noção ou norma, em muitos momentos, se coaduna com a revelação especial, pois ambas procedem de um mesmo autor que é Deus. Como comenta o reformador e pastor de Genebra no século XVI João Calvino (1509-1564): “(...) os pagãos, embora não tenham um conjunto de regras do qual possam desviar, ainda possuem o testemunho interior de sua consciência, que age como o juiz deles.”

Hoje pretendo expor a continuidade do argumento de Paulo, presente no verso 15. O argumento paulino tem como objetivo principal mostrar que Cristo — que foi constituído Juiz de vivos e mortos (Cf. At 10.42) — também julgará os gentios, mas não segundo a revelação especial, porém, segundo a luz que receberam do conhecimento de Deus na criação (Cf. Rm 1.18-32) e na consciência moral (Cf. Rm 2.15). Vejamos.

Paulo começa o versículo 15 dizendo que “estes” — isto é, os “gentios” (v. 14) — “mostram”, ou seja, tornam público e evidente a todos — e isso através do “procedimento” (v. 14) — a “norma  da lei” gravada em seus corações. Mas o que é a norma da lei? A lei, como já vimos de acordo com o contexto maior, refere-se a revelação especial de Deus feita escrita na Bíblia. Mas e quanto a sua norma?

O termo “norma” (?ργον/ergon = obra/ação) tem o sentido de um “curso de ação exigido pela lei”. Segundo o comentarista puritano Matthew Henry (1662-1714), Paulo aqui “(...) não quer dizer aquela obra que a lei ordena, como se pudessem produzir uma obediência perfeita; mas aquela obra que a lei faz. A obra da lei é nos direcionar o que fazer, e nos examinar o que fizemos.” Ou seja, a lei possui implicações práticas e são a essas implicações que Paulo se refere. O mandamento de não roubar (Cf. Ex 20.15), por exemplo, é praticado (“obrado”) quando alguém busca viver honestamente respeitando a propriedade e o direito de posse alheio. A norma (obra) da lei é essa vida honesta.

Paulo está dizendo que o gentio tem a consciência desta norma — daquilo que deve ser feito de acordo com a lei —, pois a norma está “gravada” (γραπτ?ν/grapton = inscrito, no sentido figurativo) no seu “coração” (καρδ?α/kardia = substantivo que denota a sede e o centro de toda a vida física e espiritual, no entanto, Calvino diz que “(...) a palavra coração [não] deve ser tomada para a sede das afeições, mas apenas para o entendimento, como é encontrado em Deuteronômio 29:4).

Sendo Deus o criador de todos os seres humanos, podemos verdadeiramente inferir que o autor desta gravação da norma da lei na consciência, isto é, no entendimento de todos, foi o próprio Deus. “A consciência é aquela vela do Senhor que não foi completamente apagada.”, declara Matthew Henry.

Agora, para que serve essa consciência da norma da lei inscrita na mente humana? Ela serve de critério por meio do qual os gentios “(...) distinguem entre o que é justo e injusto, entre o que é honesto e desonesto.”, comenta Calvino. A norma da lei é como uma testemunha no tribunal interno — mais uma vez, in foro conscientiae — de suas consciências e pensamentos morais; e o que faz essa testemunha? Ela, mutuamente, acusa-os de ofensa (κατηγορο?ντων/kat?gorount?n = acusando-se) quando suas ações são contrárias a própria norma, mas também os defende (?πολογουμ?νων/apologoumen?n = defendendo-se) quando são acusados mas suas ações estão de acordo com a norma. “Pela consciência de ter feito o bem”, diz Calvino “(...) os homens se sustentam e se confortam; aqueles que estão conscientes de terem feito o mal, são internamente assediados e atormentados.” Como uma bússola moral, a norma da lei funciona como um critério de auto-avaliação dos gentios.

Por fim, é importante dizer que Paulo “(...) não fala [aqui no v. 15] do poder de cumprir a lei, mas do conhecimento dela”, e um conhecimento amplo e geral, e não um conhecimento pleno da lei, mas “(...) apenas algumas sementes do que é certo implantadas em sua natureza, evidenciadas por atos”, diz Calvino. Note também que Paulo refere-se a esse processo de auto-acusação e auto-defesa não somente no tempo presente (como fato em atual realização na consciência dos gentios), mas também no tempo futuro, “no dia em que Deus, por meio de Cristo Jesus, julgar os segredos dos homens, de conformidade com o meu evangelho”. No grande Dia do Senhor – a segunda vinda de Cristo – os segredos dos homens (suas consciências), gentios e judeus, serão também julgados por Deus em Cristo. Todavia, isso analisaremos no próximo artigo, se Deus permitir.

Queridos leitores, vamos agora às aplicações finais. O que podemos aprender com a exposição de hoje? Em primeiro lugar, aprendamos a vermos a Deus como criador de toda a raça humana e todos os seres humanos como suas criaturas, ainda que caídas e manchadas em pecado. Em segundo lugar, aprendamos que Deus graciosamente implantou na consciência de todos a norma da lei, criou seres morais e não neutros, a fim de não deixar a raça humana na escuridão plena de sua própria depravação, mas concedeu um guia geral sobre o bem e o mal, que preserva a vida natural e faz possível o crescimento ordinário das civilizações. Em terceiro lugar, aprendamos também a amar e valorizar as Escrituras Sagradas, que é o guia perfeito da vontade do Senhor, sua revelação especial dada a nós, enquanto muitos – distantes da Palavra – permanecem apenas com a consciência geral da norma da lei. Em quarto e último lugar, aprendamos que Deus é justo em seus juízos, e julgará os gentios de acordo com a luz que receberam na consciência, caso não conheçam ou venham a conhecer a revelação especial nas Escrituras. Os tais não são inocentes, mas se tornaram indesculpáveis por rejeitarem o Senhor e não viverem de acordo com Sua luz disposta na natureza e na consciência (Cf. Rm 1.19-22).

Amém.

Fernando Razente

Amante de História, atuante com comunicação e mídia, leitor voraz e escritor de artigos de opinião e matérias jornalísticas.


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