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Deficiências e eficiências


Por: Dr. Felipe Figueira
Data: 29/09/2023
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Educação Especial é a área que mais tenho lacunas. E também uma das que mais me sinto desafiado. Prova disso é que quando cursei doutorado em Educação, apesar da minha linha de pesquisa ser mais histórica e filosófica, eu cursei uma disciplina no departamento de Educação Especial. O nome da disciplina era “Tecnologia Assistiva” e foi ministrada por três professoras: uma fonoaudióloga, outra fisioterapeuta e outra terapeuta ocupacional. Antes mesmo do doutorado, eu fiz um aperfeiçoamento de quase trezentas horas, Atendimento Educacional Especializado (AEE), pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Todo esse processo de estudos ainda assim me deixou com um sentimento lacunar. O que fazer?

Desde 2016 eu ministro a disciplina de Fundamentos da Educação Especial e Inclusiva para a Licenciatura em Química do IFPR campus Paranavaí. Gosto de tornar essa disciplina um misto de teoria e atividades práticas. Quanto à teoria, estudamos legislações, tratados internacionais e textos de pesquisadores. Quanto às atividades práticas, elas envolvem desde futebol com todos vendados, jogos táteis, até o contato direto por meio de aulas ou conversas com pessoas com deficiência.

Ao longo do meu vir-a-ser professor já tive a experiência de trabalhar com dois alunos surdos, um cego, vários autistas e vários outros com diversas necessidades específicas (TDAH, TOD, dislexia, etc.). É impossível que um professor seja de fato professor se tratar todos os alunos de forma padronizada. Não se trata de simples “integração” (MENDES, 2006, p. 391), no sentido de colocar os alunos com deficiência em uma roda, mas, dentro desta, eles ficarem à parte; se trata, isto sim, de inclusão, de colocá-los de fato na roda.

Eu sei que o assunto desse texto não é das tarefas mais simples de ser executada na prática e que há trabalhos que um cego, por exemplo, não pode executar, como o de sniper, mas o alvo desse artigo não é esse. No entanto, mesmo não sendo o alvo, é digno mencionar o que afirma a professora doutora Olga Solange Herval Souza, ela própria deficiente visual, mas que possui um pequeno resíduo de visão: “(...) o professor terá como aluno não a cegueira, mas um SER, um SUJEITO, UM CORPO QUE TEM ALMA E HISTÓRIA, ALGUÉM que, circunstancialmente, possui a cegueira COMO COMPANHIA durante as 24 horas do dia” (SOUZA, 2008, p. 76).

A própria educação, que é milenar, se deu ao trabalho, consciente e inconscientemente, sob o auxílio de várias teorias, de excluir a diferença sob a égide de uma falsa igualdade – padronização. A educação tradicional, por mais méritos que possa ter, em matéria de educação especial foi reticente e excludente. Todas essas críticas fazem com que a escola fique no banco dos réus? Talvez. Mas, se assim for, trata-se também de colocar a ciência no banco dos réus.

O que se percebe é que um professor dificilmente dominará as peculiaridades de todas as deficiências, e, mesmo que domine, no dia a dia escolar sempre há situações que fogem do controle do professor. O mais interessante é que o professor se torne um especialista em diversidade, em inclusão, o que fará com que o seu olhar se torne mais capacitado para as diversas realidades que lhe serão apresentadas. O especialista em diversidade sabe que esta deve ser valorizada e que diferenças individuais devem ser vistas como atributos e não como obstáculos.

Enicéia Gonçalves Mendes. A radicalização do debate sobre inclusão escolar no Brasil. Revista Brasileira de Educação v. 11 n. 33 set./dez. 2006.

Olga Solange Herval Souza. Itinerários da Inclusão Escolar: múltiplos olhares, saberes e práticas. Canoas: Ed. ULBRA; Porto Alegre: AGE, 2008.

Dr. Felipe Figueira

Felipe Figueira é doutor em Educação e pós-doutor em História. Professor de História e Pedagogia no Instituto Federal do Paraná (IFPR) Campus Paranavaí.


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