Como Treinar Seu Dragão
Poucas histórias conseguem realizar o feito empreendido por Como Treinar Seu Dragão, uma sensação que é um misto de doçura, bravura e aventura. Desde os tempos dos livros de Cressida Cowell, passando pela espetacular animação de 2010, até chegar neste live-action que acabou de estrear, a história do jovem viking Soluço e seu improvável amigo Banguela continua tocando profundamente todos que se envolvem com essa trama. Bem por isso, a Coluna Sétima Arte dessa semana é dedicada a comentar um pouco mais sobre esse filme que chega tarde, já que a onda dos live-acitons está beirando o esgotamento, mas que renova o gênero com um frescor e qualidade, isso porque a nova versão em carne, osso e escamas digitais é um voo certeiro direto para o coração do público.
Dirigido novamente por Dean DeBlois, o mesmo responsável pelas versões animadas, este live-action sabe exatamente o que quer ser. Não tenta reinventar a roda — e nem precisa. A produção aposta na força da nostalgia e no respeito ao material original para oferecer um filme que, embora já conhecido, renasce com uma beleza visual estonteante e um cuidado artesanal que faltava em muitas adaptações recentes.
A história segue basicamente a mesma trajetória da animação: na Ilha de Berk, onde dragões são inimigos mortais, vive Soluço, interpretado com muita competência por Mason Thames, um jovem desajeitado que sonha em ser respeitado como seu pai, Stoico, o chefe viking, papel de Gerard Butler, agora não só com a voz, mas em carne e osso, e visivelmente se divertindo no papel. Tudo muda quando Soluço fere, mas não consegue matar, um dos dragões mais temidos do mundo: um Fúria da Noite. A partir daí, nasce uma amizade improvável com o lendário Banguela. Com essa amizade improvável surge também a descoberta de que os dragões não são os monstros que todos imaginavam.
Visualmente, o filme é um deleite. Os efeitos digitais impressionam não apenas pela qualidade técnica, mas por manterem a expressividade e a fofura que tornaram Banguela um ícone da cultura pop. O CGI é tão bem dosado que por vezes esquecemos que aquelas criaturas não existem de verdade. E não é só o dragão que voa alto, o design de produção também chega às alturas. A nova Berk foi construída em locações reais do norte europeu e impressiona pelos detalhes, é praticamente uma experiência de imersão. Você sente o frio do vento nas pedras, o cheiro da madeira nas casas e quase escuta o ranger dos barcos no porto.
Mas o que realmente dá alma ao filme é a sua fidelidade emocional. Dean DeBlois entendeu que o público não precisava de uma reinvenção ousada, mas sim de um reencontro carinhoso com personagens que amamos. A adaptação, em muitos momentos, reproduz cenas da animação quase quadro a quadro e isso, longe de ser uma falha, é uma escolha afetuosa. Estamos num tempo em que o cinema busca constantemente algo “novo”, mas esquece que, às vezes, o que queremos mesmo é reviver uma emoção antiga com um novo olhar.
Ainda assim, o filme poderia ter ido um pouco além. Com atores em cena, havia espaço para aprofundar conflitos, dar mais nuance às relações e explorar camadas inexploradas na versão animada. Há lampejos disso, como, por exemplo a Astrid, que aparece mais ambiciosa e questionadora, e Melequento que ganha um pai que revela algo da rigidez que o moldou. Mas tudo isso são apenas pinceladas breves, que logo cedem espaço à narrativa principal. O que sobra é o gostinho de “quero mais”. Algo que não é ruim, especialmente sabendo que uma sequência já está confirmada.
Sobre as atuações, Mason Thames é uma escolha acertada como Soluço. Ele entrega a timidez e o senso de inadequação do personagem com uma sinceridade tocante, mas também convence na evolução emocional do herói em construção. Nico Parker é uma Astrid segura e carismática, equilibrando firmeza e sensibilidade. Gerard Butler, como Stoico, parece estar se divertindo como nunca, e sua presença em tela oferece peso emocional, especialmente nas cenas mais intensas entre pai e filho.
O live-action também acerta em manter o humor característico da franquia. Os jovens vikings continuam sendo um alívio cômico eficaz e Banguela é um espetáculo à parte. Suas expressões, suas traquinagens, a curiosidade quase canina, tudo está ali, intacto, perfeito. Ver ele e Soluço construindo confiança aos poucos, naquela sequência icônica à beira do lago, é reencontrar um velho amigo. Tudo está ali para emocionar e despertar uma sensação constante de nostalgia, seja pela trilha sonora emocionante, pelas cenas de voo de tirar o fôlego, ou simplesmente pelo reencontro com essa história que é pura aventura.
Por que ver esse filme? Porque Como Treinar Seu Dragão, de 2025, é uma carta de amor ao público. Não tenta impressionar pela inovação, mas pela dedicação. É um filme que respeita sua origem e seus fãs. E ao fazer isso, transforma-se a si mesmo em algo raro: um blockbuster com alma, onde cada detalhe, desde o figurino à direção de arte, passando pelas atuações e o designer dos dragões, parece feito com carinho.
Ao final da sessão, fica clara qual é a grande diferença entre esse live-action e alguns da Disney que sofreram com a crítica do público e dos especialistas, Como Treinar Seu Dragão não tenta superar a animação, mas sim caminhar ao lado dela, como dois bons amigos que conhecem bem o caminho. E para os fãs da animação, esse filme é uma nova chance de sonhar, algo que vale cada minuto na poltrona do cinema. Boa sessão!