As universidades, os estudantes e o mundo do trabalho
Tenho por hábito escrever sobre as minhas experiências e sentimentos. Acredito que isso traz vida para a minha escrita. Assim sendo, nesse texto pretendo tecer considerações sobre a preparação para o mundo do trabalho no seio das universidades. Para tanto, os exemplos que darei são oriundos das minhas experiências nos cursos de História, Pedagogia e Direito.
Para quem cursa História, a docência é o caminho óbvio e chega a se constituir em quase que cem por cento dos empregos na área. Concursos para historiador em museus são raríssimos. Enfim, um dos sonhos de todo estudante e profissional formado em História é o concurso público, seja ele para trabalhar com o ensino fundamental e médio, seja para trabalhar com a educação superior.
Acontece que as provas de concurso, em especial na primeira fase, são feitas de questões objetivas, e o estudante de História, ao longo da graduação, quase nunca tem contato com esse tipo de avaliação, sendo o foco central as provas dissertativas. Não significa que questões dissertativas não sejam importantes, mas questões de múltipla escolha também devem ser disponibilizadas, pois no dia a dia dos concursos elas são comuns. Muitos candidatos, despreparados, ficam perdidos ao se depararem com questões objetivas, ainda mais que em matéria de história a objetividade é sempre questionada.
No curso de História sobra teoria, mas, pouco contato com a prática de concursos e mesmo com o dia a dia escolar, por mais que o estágio faça parte da grade curricular. É em parte diante dessa carência formativa que muitos profissionais, já na condição de docentes, substitutos ou efetivos, veem minada a sua autoconfiança, por se encontrarem despreparados para situações difíceis que não tardam a bater na porta do profissional. A vida é mais complexa do que o que é ensinado nas universidades, entretanto, certos aprendizados capacitam mais o profissional para a labuta do dia a dia. Em matéria de conteúdos, mapas mentais e questões de concurso dariam mais escopo ao estudante quando ele fizesse uma prova de concurso.
O estudante de História deve ser estimulado a ler, além de textos consagrados de teoria da história, de Brasil Colônia, de História Contemporânea, os livros didáticos. Por mais problemáticos que estes materiais possam ser, eles seguem sendo um bom guia tanto para o professor do ensino fundamental e médio quanto para a pessoa que queira ter uma visão geral da história, algo fundamental em concursos.
No que diz respeito à Pedagogia, até por ser uma licenciatura, há vários pontos que tocam no universo da História, como uma ênfase grande na teoria (às vezes em detrimento da prática). Não significa, contudo, dizer que o aluno de graduação deva morar na escola, esvaziando a teoria, pois isso seria igualmente prejudicial à sua formação, porém, a teoria não deve substituir o contato com as peculiaridades da vida. A vida do profissional de Pedagogia, por sua vez, é composta de questões objetivas de concurso público, tanto quanto o é a vida do profissional de História.
Quanto ao curso de Direito, a realidade é diferente se comparada com a do universo das licenciaturas: boa parte dos professores têm na docência uma profissão secundária. Em outras palavras, como regra, primeiro o profissional do direito é procurador, advogado, promotor, para depois ser professor. Às vezes a pessoa passa quarenta horas no escritório e apenas oito ou menos em sala. A iniciativa privada e os concursos públicos são abundantes para o operador do direito.
Todavia, o ensino do Direito também carece do problema da teoria em excesso, às vezes trazida na forma de enunciados pouco relacionados com o dia a dia. Trazer casos reais e complexos, na medida em que cresce o entendimento dos alunos, é fundamental para que eles fiquem a par do dia a dia do operador do direito. Quanto a questões objetivas em avaliações e trabalhos, elas são presentes, o que facilita a assimilação, desde a graduação, de possíveis concursos.
Uma dica que eu daria a todo estudante de Direito é que, além de ler doutrinas consagradas, que tivesse acesso desde o início da graduação a um resumo das principais matérias cobradas no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Esse resumo, longe de ser uma “muleta de preguiçoso”, é um bom guia para orientar o acadêmico diante da complexidade que é o direito.
Ainda sobre o Direito, uma última consideração. No dia a dia do profissional dessa área, todos os procedimentos (ou quase todos) são feitos digitalmente. Entretanto, nas disciplinas de estágio obrigatório ou simulado, os alunos entregam as “peças” (ações) fisicamente. Não seria o caso das universidades terem um sistema capaz de simular como é a vida real?
A pergunta que a universidade deve fazer a si própria e ao seu currículo, consequentemente, é: como determinada ação ocorre, como ela é processada no cotidiano? Diante dessa interrogação, a instituição deve nutrir seus alunos de conteúdos, o que não significa um esvaziamento da formação em detrimento da moda da sociedade. A questão é um olhar mais atento à realidade.
A universidade cumpre um papel fundamental na contemporaneidade para a preparação de indivíduos para o mundo do trabalho. No entanto, mediante alguns ajustes, que dependem de caso para caso, de curso para curso, os alunos podem receber uma qualificação melhor e mais adequada para o dia a dia. Não há fórmulas e nem existe um aluno ideal, porém, um olhar mais atento para o mundo do trabalho, como são os concursos públicos, ajuda o estudante a não se ver perdido em meio a uma sociedade cada vez mais complexa e acirrada.
Dr. Felipe Figueira
Felipe Figueira é doutor em Educação e pós-doutor em História. Professor de História e Pedagogia no Instituto Federal do Paraná (IFPR) Campus Paranavaí.