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Abram alas para o amendoim


Por: Jacilene Cruz
Data: 02/09/2024
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Essa é uma crônica cheia de curiosidades amendoísticas, vale a pena ler.

Seu Albertino vendia amendoim na feira. A medida eram as caixas. Eu só lembro da que era um pouco maior que a de fósforos. Não sei se em algum lugar ainda é assim, mas depois de medidos, os caroços eram colocados em um papel de embrulho que se estendia pela mão do vendedor e, em seguida, dobrado com muito capricho. Nenhunzinho caía.

Talvez essa lembrança não seja só minha, mas, com certeza, o amendoim é todo nosso. Leguminosa da América do Sul, merece uma história inteirinha só pra ela. Não pouparei esforços.

Meu amigo Geraldo[1], com quem sempre converso quando escrevo, me disse que o nome “amendoim” já foi mendubi, mindoim, menduí, amendoí, ameñdui. Todos eles vêm do tupi manu’wi que se deixou influenciar pela palavra amêndoa. Desta eu não contarei a história. Ao menos hoje.

Resumindo: manu’wi + amêndoa = amendoim.

Mas o caminho até ser jogado para cima e cair direto na boca não é tão simples. O mandubi, assim chamavam os mais antigos lá da Tapera[2], tem uma flor tímida. Já clareio para vocês.

É bem assim. Jogamos dois ou três grãos na cova feita com só uma enxadada. Depois que a planta nasce, não cresce muito, floresce e logo é polinizada. Aí, a flor fica com vergonha e se curva.

É terra adentro que a mágica acontece: BUM!!! As vagens crescem.

Meu pai e outros tantos que viviam sobre um pedacinho de chão, mesmo não sendo seu, plantavam. Se São José abençoasse, São João se fartaria. O período da colheita era animado. As mãos ágeis, como as de Seu Albertino que vendia os caroços na feira, despencavam as leguminosas com vontade.

A agilidade das mãos nos impelia a que, de vez em quando, abríssemos uma vagem e jogássemos os grãos para dentro da boca. Comíamos a terra junto. Junho era realmente o mês mais saboroso de todos.

Lá em casa, a colheita era dividida em três partes desiguais. A maior era vendida na feira. Em preço atual, o litro custava uns 5,00 reais. A segunda maior era pendurada para secar e virava semente.

A menor era a melhor de todas. Comíamos cozida. Depois de lavadas para tirar toda a terra, Mainha fazia uma pasta com cinza e água e passava no fundo do maior caldeirão para ficar mais fácil de lavar.  Depois, colocava água e cozinhava as vagens no fogão à lenha. Eram muitas bocas, todos gostavam demais.

Não demorava muito, o fogo forte cozinhava ao mesmo tempo que o sal acrescentava um toque especial no adocicado grão.

Creio que grande parte do Brasil desconhece essa iguaria de sabor único, típica das festas juninas. Nesse período é fácil achar, pelas ruas da Bahia ou Sergipe, alguém vendendo meio, um, dois, três litros e a quebra do mais delicioso amendoim maduro cozinhado, como diz meu amigo Márcio.

Além disso, a leguminosa é base de pratos tradicionais na Bahia. Vocês não sabem, mas caruru e vatapá levam amendoim. Sem falar no pé-de-moleque e na paçoca.

É um fruto tão encantador que já existe até o “amendoim japonês”. Eu devoro com tanta pressa que não observo se ele tem os olhos puxados.

Independente do prato, quando pego esses pequenos caroços nas mãos, antes de engolir sem mastigar direito, lembro que eles nos alimentaram inúmeras vezes. Lembro também do Seu Albertino com seu chapéu de couro preto, que curtindo sua negra pele ao sol ou a hidratando quando vinha a chuva, estava a postos na sua barraca, vendendo amendoim e distribuindo simpatia.

 

Amendoim florescendo

Vagens prontas para serem despencadas

 

 

Fonte: Produtividade do amendoim obtido de cultivares arranjadas em sistema de cultivo | South American Sciences

Fonte: Plantação de Amendoim – Guia Fácil e Completo!?2024? (casaeconstrucao.org)

Amendoim cozinhando e já cozido

 

 

Fonte: Como Conservar o Amendoim Torrado? Onde Guardar Após Cozido? | Mundo Ecologia

 

Fonte: Vivo intensamente as coisas mais simples: * Amendoim cozido

 

 

 

 

 

 



[1] Antônio Geraldo da Cunha foi um estudioso brasileiro conhecido principalmente por seu dicionário que traz a origem histórica das palavras.

[2] Zona rural do município de Cruz das Almas – BA.

 

 

Jacilene Cruz


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