Dilemas de um profissional desempregado
Eu já escrevi alguns textos sobre a dificuldade que é conseguir um emprego, em especial o primeiro, mas é sempre válido trazer novas ideias e exemplos.
Em 2018 eu já possuía duas graduações, doutorado em Educação e pós-doutorado em História. Além disso, havia publicado dois livros e era servidor federal há seis anos. Eu tinha um bom currículo. Mas, nem por isso, as portas eram abertas automaticamente.
Com o intuito de expandir horizontes, um dia fui a Maringá divulgar o meu trabalho sobre a Venezuela e pedi, em quatro escolas, a oportunidade de falar com os responsáveis. Em três delas não fui sequer recebido, pois alegaram que os diretores estavam ocupados, e em outra fui recepcionado pela diretora e por vários professores. Na verdade, fui mais decepcionado do que recepcionado. Fizeram uma sabatina de mais de uma hora para saber o que eu pretendia falar para os alunos (o que é razoável), no entanto, em certo momento uma professora bradou:
“- O seu trabalho é o que a Globo faz sobre os venezuelanos. Você parece um jornalista da Globo.”
Toda a minha polidez e paciência desapareceram instantaneamente, pois pensei que o meu trabalho foi inteiro custeado por mim e que nele eu expunha a minha visão sobre a Venezuela. Diante disso, coloquei as fotos e os livros diante da professora e indaguei
- O que é essa foto? E essa? E esse poema?
Visto que a professora dizia “não sei, não sei”, eu disse que era um dever de um professor abrir a mente dos alunos, e não as fechar, algo que provavelmente ela fazia. Após essa dura fala fui embora, mas um dos professores presentes, para a minha surpresa, disse que gostou da minha atitude e me convidou para ministrar a aula magna do curso de História onde ele lecionava. Por fim que entrei na escola que ele trabalhava com uma intenção e saí com a proposta para ministrar uma palestra em um curso superior. Atingi o objetivo.
Agora, eu me pergunto: se mesmo com todo o meu currículo eu recebi pedras e portas fechadas, quanto mais um recém-formado? Provavelmente, ao deixar o currículo na recepção, este será descartado. Eu próprio, quando fazia mestrado, cheguei a entregar currículos para várias faculdades e escolas, sendo que até hoje daqueles lugares não recebi sequer um “não, obrigado.”
É por causa das dificuldades da vida que muitos profissionais acabam por aceitar toda sorte – azar – de trabalho. Que se imagine alguém formado, com vinte e cinco anos, mestre, mas desempregado... Até quando a pessoa conseguirá esperar para que surja uma chance de ouro? Dificilmente ela esperará, o que significa que dirá sim a situações dramáticas. A condição é tão difícil e trágica que não é possível que eu tampe o sol com a peneira, pois este astro é maior do que a maioria dos sonhos.
Dr. Felipe Figueira
Felipe Figueira é doutor em Educação e pós-doutor em História. Professor de História e Pedagogia no Instituto Federal do Paraná (IFPR) Campus Paranavaí.