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O Que Ficou Para Trás


Por: Odailson Volpe de Abreu
Data: 12/11/2020
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A Netflix fez um bom investimento em filmes de terror para o último Halloween e aos poucos vamos descobrindo e nos deleitando com suas novas obras desse gênero. Essa semana quero comentar sobre um filme que me surpreendeu muito positivamente, tanto pelo enredo, quanto pela qualidade, mas que não tem sido tão badalado entre os fãs locais. A Coluna Sétima Arte dessa semana traz para você uma análise sobre tudo o que é relevante a respeito de O Que Ficou Para Trás.

O talentoso roteirista e diretor Jordan Peele tem feito escola no cinema. Digo isso porque é impossível assistir O Que Ficou Para Trás e não perceber sua motivação e sua estética. É claro que ele não foi o primeiro a relacionar terror e crítica social em obras cinematográficas, mas, com certeza, poucos fizeram isso com tanta maestria. Quem assistiu recentemente à sua grande obra Corra numa segunda-feira à noite na tv aberta sabe sobre o que estou falando. Seguindo à risca o caminho indicado por Peele, o estreante Remi Weekes entrega um fascinante trabalho para o público por meio de seu roteiro e de sua direção.

O Que Ficou Para Trás é aquele tipo de filme do qual você vê a capa na Netflix e não sabe muito o que esperar, mas depois de poucos minutos já está envolvido com a história e mergulhado no misticismo e no drama apresentado pela trama. Weekes constrói um terror inteligente, que se sustenta para além dos sustos fáceis (conhecidos como jump scares), de maneira que o público fica dividido entre o que mais assusta: o drama da vida real ou o risco do sobrenatural?

Deixando o didatismo completamente de lado, ele oferece informações importantes sobre a vida de seus protagonistas de maneira homeopática, em vista disto, você sempre acha que sabe o suficiente, mas, mesmo assim, está sempre em busca de descobrir mais. Bem por isso, induz o expectador a deduzir muita coisa que não condiz com o rumo da trama gerando vários plot twists ao longo dela.

Além disso, Weekes demonstrou que não se precisa de muito para se fazer um bom filme, pois com o pouco que tem, consegue criar tensão, medo e empatia nas medidas certas. O mundo por si só é apresentado por ele como um lugar de terror, por isso, tarefas do cotidiano, como ir à rua ou pedir uma informação tornam-se momentos de angústia e medo. Para mais, os fantasmas do passado são projetados nos traumas da vida ou no ambiente decadente e opressor ao qual os protagonistas são obrigados a se confinarem.

Soma-se a tudo isso um ótimo trabalho de câmera e fotografia, uma trilha sonora competente e atuações de encher os olhos. A dupla principal de atores, Wunmi Mosaku e Sope Dirisu, constroem suas personagens a partir de um forte antagonismo. Mosaku, que ficou conhecida recentemente devido ao seu papel na série Lovecraft Country da HBO, ao interpretar Rial, apresenta uma calma e uma ternura que são advindas das raízes de seu país de origem, que ela busca não esquecer. Por outro lado, Bol papel de Dirisu —, se mostra ansioso, às vezes irritadiço e com oscilações de humor, manifestando constantemente o desejo de romper com suas raízes e se adaptar ao novo mundo que insiste em não aceitá-lo.

Os antagonismos são uma constante nessa obra de Weekes. Além do casal de protagonistas, essa característica pode ser percebida também nos sentimentos e nas ações, como, por exemplo, os sentimentos antagônicos de dor e alegria. O primeiro pela perda da filha e o segundo pela entrada no país dos sonhos, pode ser percebido ainda no governo que oferece liberdade para além do centro de refugiados, mas confina os pobres imigrantes na casa precária de um bairro pobre.

Junto com o antagonismo vem a forte crítica social, perceptível algumas vezes no papel do governo e outras na população em si, pois ambos tratam os imigrantes como seres indesejáveis, desprezíveis e de classe inferior, algo que dói no coração. A cena em que meninos afrodescendentes gritam com Rial mandando que ela retorne para a África é, no mínimo, revoltante. A esses terrores da vida soma-se o terror sobrenatural que, na maior parte do filme, é abordado de forma subjetiva, mas que se materializa no clímax da história. Talvez esse seja o único conceito que não me atrai completamente em Em O Que Ficou Para Trás, eu preferia que ele continuasse a ser trabalhado de forma subjetiva e psicológica, mas esse desfecho se dá tão rápido que nem chega a atrapalhar o todo da obra. Vamos à trama!

Em O Que Ficou Para Trás, um casal de refugiados faz uma fuga angustiante do Sudão do Sul, devastado pela guerra, lutando para se ajustar à sua nova vida em uma cidade inglesa. O que eles não contavam é que nessa cidade irão se deparar com um terrível mal que está à espreita, esperando apenas o momento certo para ascender.

Por que ver esse filme? Primeiro, pelo seu caráter de crítica social, ele faz uma abordagem muito bem feita, respeitosa e relevante da realidade dos imigrantes africanos e de sua situação socioeconômica. Segundo, pelo seu caráter técnico, a direção é competente, o roteiro e instigante e o ritmo, hora lento e hora acelerado, confere à obra uma aura cult muito interessante. Os dramas do passado, a casa mal assombrada e as questões mal resolvidas são a cereja do bolo nesse excelente terror. Boa sessão!

Sétima Arte - Odailson Volpe de Abreu

Odailson Volpe de Abreu


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