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O Poder Envelhecer


Por: Rogério Luís da Rocha Seixas
Data: 01/07/2021
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Dou início a esta nova exposição de ideias, pasmo com uma notícia: a OMS (Organização Mundial de Saúde), pretende classificar a velhice como sendo uma doença. Confesso que pasmo e assustado, pois já estando a caminho do envelhecimento, teço o seguinte questionamento: será que já posso me considerar doente? Caso ainda, não com que idade estarei indicado a estar doente?  Acreditando que tal fato, não passe de um mal-entendido, traço uma reflexão: não se pode mais envelhecer, tornando-se assim algo anormal? Posso a partir deste ponto, desenvolver outra reflexão: Esta situação não poderia agravar maiores preconceitos contra um grupo que já se encontra vulnerável à condição de fardo, inutilidade, descartabilidade e obsolência? Afinal, o respeito ao idoso ou ao velho, não é dos fatores mais intensos em nossas sociedades, apesar das leis e estatutos.

A preocupação com a velhice, existe desde tempos muito remotos, e o modo de perceber e refletir sobre a possibilidade de envelhecer, variou para todos os povos. Destaque-se que a partir da visão filosófica sobre o processo de envelhecimento, podemos ter uma noção destas variações. Para o filósofo chinês Confúcio, a família deve ter como base, a obediência ao ser humano masculino mais velho. Assim, a autoridade do patriarca mantém-se elevada com a idade e até mesmo a mulher, tão subordinada, na velhice, passa a ter poderes mais elevados do que os jovens masculinos, exercendo influência preponderante na educação dos netos. Algo impensável em nossas famílias contemporâneas, onde os mais velhos são colocados em papel de irrelevância e visão atrasada da realidade.

O filósofo romano, Marco Túlio Cícero, demonstrou-se uma figura exponencial nos estudos sobre a velhice. Aos 63 anos de idade, senador da república, resumiu sua visão de envelhecimento como sendo um processo fisiológico, relatando os problemas do idoso como redução da memória e da capacidade funcional, alterações dos órgãos dos sentidos, redução da capacidade de trabalho. Contudo, salientou que com o envelhecimento, os prazeres corporais vão sendo substituídos pelos intelectuais, enfatizando a necessidade de prestigiar os idosos e de fazer-lhes um preparo psicológico para a morte, sem menosprezá-los ou considerá-los como doentes. Ao contrário, a arte de poder envelhecer está em descobrir o prazer que todas as idades proporcionam, pois todas têm as suas virtudes.

Outro filósofo romano, Sêneca, defendia que para se alcançar a tranquilidade, se faz necessário aceitar o processo de envelhecimento e tirar o melhor proveito dessa fase de vida, que poucos seres humanos podem ter o prazer de atingir, destacando que a oportunidade de continuar vivo e lutando pela vida rompe laços de exigências passadas e torna o ser humano idoso um lutador satisfeito, um vencedor.  

Desta forma, refletir acerca do poder envelhecer obviamente com saúde e dignidade, afasta-se da noção de que o envelhecimento em si possa ser uma doença. Deve-se sim apontar para uma elaboração do próprio processo de envelhecimento, difícil e pertinente, direcionando nossos esforços para o cuidar de um ser humano que passa por um processo específico e singular, além de universal.

 

CÍCERO, M. T. Saber envelhecer- Seguido de A amizade. Tradução de Paulo Neves. Porto Alegre: L & PM, 1999.

CONFÚCIO. Vida e doutrina. Os Analectos. Tradução de Mucio Porfirio Ferreira. São Paulo: Pensamento, 1999.

SÊNECA, L. A. Da Tranquilidade da Alma. Tradução de Giulio Davi de Leoni. In: São Paulo: Nova Cultura, 1982. (Os Pensadores

Rogério Luís da Rocha Seixas

Rogério Luís da Rocha Seixas é Biólogo e Filósofo Docente em Filosofia, Direitos Humanos e Racismo Pesquisador do Grupo Bildung/IFPR e-mail: rogeriosrjb@gmail.com


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