Fantasias do empreendedor de si

Renato Nunes Bittencourt, Doutor em Filosofia pela UFRJ
A partir do crescimento do mercado digital, a informatização da economia e a grande indústria de serviços, passou a prevalecer uma falsa crença do empreendedor de si, o trabalhador que, mesmo explorado, acredita que é livre e que estabelece suas próprias metas profissionais, vendendo sua força de trabalho para empresas que lucram consideravelmente sobre os seus esforços diários. Um regime de precarização disfarçado de liberdade profissional, e essa precarização se caracteriza pela diminuição de direitos trabalhistas, diminuição do tempo de descanso, aceleração operacional, ansiedade para produzir cada vez mais, prejuízos nos cuidados de si etc.
Os resultados imediatos são trabalhadores cada vez mais adoecidos, com grande risco de letalidade e que vivem sob constante estresse psicofísico. E há quem diga que trabalha enquanto você dorme! Na verdade, quem fala isso dorme enquanto todos nós estamos envolvidos totalmente no trabalho exaustivo, fato que aumenta o esgotamento orgânico com consequências graves para nossa subsistência. É preciso que tenhamos o tempo livre aproveitado para o lazer, o descanso adequado e as atividades lúdicas, sem qualquer constrangimento moral por essa pequena liberdade em um estilo de vida estressante e tão exigente. Lutar pelos direitos trabalhistas conquistados por gerações no passado é um ato muito importante para a preservação da dignidade humana. Devemos sempre exigir mais direitos e nunca abrir mão deles. Cidadania também é trabalhar de forma decente, se alimentar bem, descansar o necessário, preservar a própria saúde.
As redes sociais, com a proliferação de discursos vazios de influenciadores e seus pretensos segredos do sucesso imediato, encantam legiões de seguidores, que desacreditam da estabilidade profissional ainda existente e suas regras rígidas, em nome de uma liberdade anárquica que não se sustenta concretamente. As redes sociais, com a proliferação de discursos vazios de influenciadores e seus pretensos segredos do sucesso imediato, encantam legiões de seguidores, que desacreditam da estabilidade profissional ainda existente e suas regras rígidas, em nome de uma liberdade anárquica que não se sustenta concretamente. As novas gerações se encantam com as imagens extraordinárias produzidas pela inteligência artificial e pela digitalização veloz da vida, onde tudo hoje é registrado em redes sociais. A apologia do estilo de vida livre e descontraído gera no seguidor a ilusão de que esse sucesso fácil é possível para todos, basta querer, basta se empenhar. Não é bem assim. Em uma sociedade de classes antagônicas regida pela lógica do mercado, muitos devem sofrer para que uma minoria prospere. A pobreza é fundamental para que esses privilégios se perpetuem. Nenhuma conquista da vida vem sem esforço, é preciso disciplina, estudo, comprometimento, treinamento. Talvez algumas pessoas nasçam em condições econômicas mais favoráveis, outras são ajudadas pela “sorte”, mas mesmo assim se não desenvolverem habilidades para administrar o patrimônio correm o risco de perder tudo ao longo da vida. Portanto, nunca podemos acreditar em imediatismos. Não existe fórmula mágica para o sucesso.

