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A Justificação do pecador


Por: Fernando Razente
Data: 24/06/2024
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Romanos 2.13: “Porque os simples ouvidores da lei não são justos diante de Deus, mas os que praticam a lei hão de ser justificados.”

No último texto, expondo o versículo 12, tratei de descrever ao leitor a natureza do juízo de Deus sobre aqueles que sem lei pecaram (gentios) e sobre aqueles que com lei pecaram (judeus). Ambos – compondo o quadro todo da humanidade – estão debaixo de pecado, maldição e condenação.

A respeito dos judeus, Paulo vem argumentando ao longo do capítulo 2 que devido sua hipocrisia e dureza de coração – ainda que sejam herdeiros da lei – serão julgados por Deus. O mero fato de serem israelitas e descendentes de Abraão não os isenta da culpa e do castigo divino. Pois, aqueles que pecaram com lei, diz Paulo, “(...) mediante lei serão julgados.” (Rm 2.12).

Agora, no versículo 13, Paulo parece estar indicando com mais clareza que está lidando com uma objeção judaica maliciosa, baseada na posse da lei. Afinal, não são eles “(...) israelitas.”, e não “Pertence-lhes a adoção e também a glória, as alianças, a legislação, o culto e as promessas; deles são os patriarcas, e também deles descende o Cristo, segundo a carne, o qual é sobre todos, Deus bendito para todo o sempre. Amém!” (Rm 9.4-5)? Não foram aos judeus “(...) confiados os oráculos de Deus” (Rm 3.2b)?

Não são os judeus os grandes conhecedores da lei e dos profetas? Não são os judeus grandes eruditos e especialistas na revelação? Não são os judeus os preservadores da Escritura e leitores assíduos da Palavra de Deus? E se a legislação, os oráculos, o culto, as alianças e as promessas foram dadas aos judeus de modo gracioso e especial, como os tais serão julgados e condenados por Deus? O erro destes argumentos e questionamentos maliciosos consiste em presumir que a simples posse, leitura ou conhecimento teórico da Lei do Senhor concede aos judeus (ou aos cristãos) a garantia de imunidade no julgamento, mesmo com vidas marcadas pela hipocrisia e dureza de coração.

É precisamente contra esses pensamentos que Paulo se levanta, e declara que “(...) os simples ouvidores da lei”, isto é, os judeus assíduos em ouvir a leitura da Lei no Templo, nas Sinagogas e em demais atividades religiosas, “(...) não são justos diante de Deus”. Ouvir a lei não basta. Não interessa a Deus quantos sermões um judeu antigo ou um cristão contemporâneo possa ter ouvido. Ou seja, possuir um conhecimento teológico sobre quem Deus é, o que Deus fez, faz e fará e qual o Seu querer não justifica e não redime um pecador!

Embora a Lei de Deus seja a regra da justiça humana (Dt 4.1), o mero conhecimento dela não traz a salvação. Como declarou João Calvino (1509-1564): “(...) ouvir a lei ou [ter] qualquer conhecimento dela não é de nenhuma [valia] que qualquer um deveria, por esse motivo, reivindicar a justiça.” Por isso, Paulo conclui o versículo dizendo que, na verdade, “(...) os que praticam a lei hão de ser justificados.”

Evidentemente, Paulo não está se contradizendo aqui, como se quisesse dizer que a salvação vem por meio das obras, ou que a justificação – o ato de Deus considerar um pecador justo – é alcançada mediante o esforço prático de seres humanos em cumprir a Lei cabalmente. Quem, deste versículo, extrai uma doutrina de salvação pelas obras, inverte completamente o sentido original da passagem. Tal argumento pode ser descrito, nos termos de Calvino, como um “sofisma fútil”.

O que pode facilitar a nossa compreensão da intenção do autor inspirado ao dizer que os que praticam a lei é que serão justificados é entender o dito paulino como prescritivo. Paulo não está dando esperanças aos leitores judeus de buscarem a salvação no cumprimento da lei. Na verdade, Paulo apenas lembra aos judeus que a regra legal para que um pecador seja justificado e aceito por Deus é ele não apenas conhecer a lei, mas tê-la no coração e praticá-la sem transgredi-la uma vez se quer, pois “(...) qualquer que guarda toda a lei, mas tropeça em um só ponto, se torna culpado de todos.” (Tg 2.10).

Ou seja, “(...) a justiça perfeita está prescrita na lei;”, como escreveu Calvino. Logo, aqueles que querem ser aceitos por Deus, que pratiquem – e não apenas ouçam – a lei! No entanto, essa regra, como Paulo mostrará no capítulo 3, não pode ser cumprida por nenhum ser humano; esse único caminho de salvação estabelecido pelo próprio Deus está completamente fechado aos seres humanos, pois “(...) já temos demonstrado que todos, tanto judeus como gregos, estão debaixo do pecado” (Rm 3.9b), e que “(...) todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Rm 3.23). Ninguém é capaz de trilhar esse caminho de perfeição. Ninguém é capaz de não apenas ouvir, mas viver integralmente a Lei do Senhor. Logo, o que faremos? Como seremos salvos?

Judeus e gentios – pecadores dentre toda a humanidade – precisam desesperadamente de uma solução. Nós precisamos de uma solução. Precisamos de alguém que seja capaz de cumprir perfeitamente a Lei em nosso lugar, pois estamos incapazes disso pelo pecado. Precisamos de alguém que ouça a Lei, interprete-a corretamente e que também a ame, a tenha em seu coração, a viva, a pratique perfeitamente e, por isso mesmo, conquiste meritoriamente uma justiça aceitável a Deus; e não apenas isto, mas que, no fim, ainda este alguém seja gracioso ao ponto de transferir tal justiça aos pecadores por amor e assumir as consequências da ilegalidade dos pecadores. Em suma, como bem disse Calvino, se “(...) todos são condenados pela transgressão, dizemos que outra justiça deve ser buscada.” Precisamos de uma justiça alheia, como gostava de colocar o Dr. Martinho Lutero (1483-1546).

Mas para onde devemos lançar o nosso olhar em busca dessa justiça que justifica? Eu escrevi há pouco que ninguém foi capaz de praticar a lei do Senhor perfeitamente do início ao fim, ninguém… exceto um: Jesus, o Cristo, o Messias prometido da descendência de Davi segundo a carne, e designado Filho de Deus com poder. Nele, atesta o apóstolo João, “(...) não existe pecado” ( 1 Jo 3.5), e também confirma o apóstolo Pedro que Jesus “(...) não cometeu pecado, nem dolo algum se achou em sua boca;” (1 Pe 2.22). É n’Ele – e somente em Jesus – que devemos confiar para obtermos a justificação. As Sagradas Escrituras nos ensinam que pela fé em Cristo – em sua vida de retidão e justiça conforme a Lei e por sua morte expiatória – somos revestidos de sua Justiça Perfeita, nossos pecados são retirados de nós e pela graça somos considerados justos diante de Deus e aceitáveis a Ele. Somos reconciliados com o nosso Criador. Quando somos justificados “(...) mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo;” (Rm 5.1).

Essa é a “(...) justiça de Deus mediante a fé em Jesus Cristo, para todos [e sobre todos] os que creem” (Rm 3.22). Tal justiça – o conjunto da vida de integral obediência e santidade de Jesus –, diz o Evangelho, nos é concedida gratuitamente mediante o crer. No ato de crer, como declarou Horatius Bonar (1808-1889) nossas “(...) responsabilidades judiciais, como transgressores da lei, são transferidas a Ele [Jesus], e o direito legal dEle, como Aquele que cumpriu a lei, passa para nós. Não entendemos que isso seja uma transferência de caráter ou troca de personalidade, mas uma transferência de dívidas, uma troca de pleitos judiciais.” (2012, p. 92).

O caminho da justificação para os pecadores é um caminho que os próprios não podem trilhar; é um caminho de vida de obediência integral (conhecimento e piedade) à lei de Deus. Um caminho inexorável e inalterável. Um caminho perfeito para uma humanidade imperfeita. Em uma só palavra, uma impossibilidade. Mas, como declarou Jesus (falando sobre a salvação) aos seus discípulos, “Os impossíveis dos homens são possíveis para Deus.” (Lc 18.27). Por isso, cremos na graça soberana e no imenso amor de Deus Pai que enviou seu Filho Eterno Jesus Cristo para trilhar esse caminho por nós e em nosso lugar, cumprindo cabalmente a lei, resistindo a todas as tentações, vencendo o mundo e Satanás, padecendo na cruz assumindo as nossas ilegalidades, mas ressurgindo dos mortos e assentando-se gloriosamente à direita de Deus Pai Todo-Poderoso. Assim, Cristo concedeu a todo aquele que crê uma Justiça Eterna. Sendo assim, Paulo declarou aos judeus em Antioquia, que “(...) por meio dele, todo o que crê é justificado de todas as coisas das quais vós não pudestes ser justificados pela lei de Moisés. (At 13.39).

Amém.

Fernando Razente

Amante de História, atuante com comunicação e mídia, leitor voraz e escritor de artigos de opinião e matérias jornalísticas.


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