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A importância da microssociologia para a tolerância com a diversidade


Por: Especial para JN
Data: 07/07/2023
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Foto: Divulgação

 

Maria Júlia Araki Pallone Favretto[1]

Valentina Cardoso Escobar[2]

Orientador: Prof. Fernando Razente[3]

A sociologia é a ciência que estuda o funcionamento da sociedade. Sabe-se que para isso, é necessário muitos estudos e pesquisas. Neste primeiro semestre, nas aulas de Teoria da Sociologia — com o Prof. Fernando Razente — estivemos aprendendo sobre duas das vertentes mais conhecidas de análise e pesquisa social: a macrossociologia e a microssociologia.[4]

Essas duas ferramentas de pesquisa social  servem justamente para a compreensão de partes —  micro  que compõem o todo —  macro  orgânico da sociedade em que vivemos.[5] Enquanto a macrossociologia tem como objetivo principal o estudo social por meio da generalização de instituições de poder e de influências usando como base grupos ou uma ‘grande massa’, a microssociologia consiste na compreensão da sociedade centrada no indivíduo e suas ideias pessoais em relação com os outros.

Como o Prof. Fernando costumava explicar essa diferença usando uma analogia: enquanto a macrossociologia teria a mesma função que um telescópio, a microssociologia teria a mesma função de um microscópio. A microssociologia, estudando indivíduos em situações de interação direta no cotidiano, revela algo de muito significativo para as ciências sociais, que, aqui, queremos explorar.

Partimos da tese que a técnica mais eficaz e capaz de nos dar uma visão mais precisa do tecido social é a microssociologia e, explicaremos. Entendemos que reduzir as individualidades à padrões generalizadores e amplos — como algumas teorias sociológicas fazem, como o Materialismo Histórico-Dialético[6] de Karl Marx[7] — pode significar, parcialmente, anular a essência característica de cada um e as diferenças existentes entre várias comunidades sociais.[8]

O fato da generalização ser uma característica marcante das teorias macrossociológicas traz vários problemas. Quando fazemos generalizações no nível teórico, estamos postulando que há uma igualdade de opiniões e ações de muitos indivíduos, encaixando-se em conceitos abstratos e muitas vezes vagos, como ‘classes’,[9] quando, na verdade, essas opiniões e ações dizem respeito somente a um ou a poucos indivíduos (que ainda se diferem em inúmeras outras situações).[10]

Por outro lado, a abordagem microssocial com um individualismo metodológico, proporciona ao pesquisador uma transição “(...) das estruturas às redes, dos sistemas de posições às situações vividas, das normas coletivas às estratégias singulares”, conforme defende o pesquisador Chartier, em À beira da falésia – a história entre certezas e inquietude (2002).

A generalização não causa problemas apenas no nível de inadequação teórica no entendimento do funcionamento da sociedade, mas, em casos mais concretos, pode fomentar injustiça, ódio e sofrimento. Por exemplo: descritivamente, cada pessoa pensa de um jeito e pode agir de maneiras diferentes também; não é possível, portanto agrupar os homens em classes cujos membros reajam da mesma maneira e, para um melhor convívio com as diferenças, cada indivíduo deve ser tolerado em sua individualidade e não enquadrado em rótulos generalizadores e condicionadores.

Concluímos que a análise microssociológica nos ensina que cada indivíduo é diferente e imprevisível em seus costumes, formas de pensar, escolhas, preferências, experiências e maneiras de agir. Logo, como é uma forma de estudo sociológico que visa focar em um indivíduo e seus pensamentos pessoais, acreditamos que seja a forma mais segura de atingir resultados precisos quando nos referimos a pesquisas e estatísticas sociológicas e nos proporcionar uma visão e prática mais tolerantes com as diversidades políticas, sociais e até mesmo religiosas.



[1]Aluna da 1ª série 2 do Novo Ensino Médio do Colégio Sagrado Coração de Jesus.

[2]Aluna da 1ª série 2 do Novo Ensino Médio do Colégio Sagrado Coração de Jesus.

[3]Professor de Sociologia, História, Filosofia e Cultura Religiosa no Colégio Sagrado Coração de Jesus.

[4]Conforme o ex-diretor da London School of Economics Anthony Giddens, na sua obra Sociologia (2012), “(...) o estudo do comportamento cotidiano em situações de interações pessoais costuma ser chamado de microssociologia. Já a macrossociologia é a análise de sistemas sociais de grande escala, como o sistema político ou a ordem econômica.” (p. 33).

[5]É importante reconhecer a relação de dependência entre as duas teorias, especialmente a macro em relação a micro, pois conforme lembra Giddens, à primeira vista “(...) pode parecer que a microanálise e a macroanálise são distintas, mas, na verdade, as duas estão intimamente conectadas.” (GIDDENS, Anthony. 2012, p. 33)

[6]Roger Chartier (1945-), historiador francês vinculado à quarta geração da historiografia da Escola dos Annales, em seu livro À beira da falésia – a história entre certezas e inquietude (2002), no capítulo sobre A História entre narrativa e conhecimento, inicia seu texto citando uma famosa e aterradora constatação a respeito da obsolência das antigas formas de se pensar a formação das sociedades, incluindo o Materialismo Histórico-Dialético. Segundo Chartier, “o tempo das incertezas” chegou, onde os paradigmas dominantes para se entender a sociedade, como os “marxismos ou (…) estruturalismos”, perderam definitivamente suas “capacidades estruturantes”, ou seja, de captar a essência do funcionamento social, muito por conta de seu apelo generalizador numa realidade cheia de diversidade e diferenças sociais, políticas, ideológicas e econômicas.

[7]Embora seja mais conhecido como uma teórico da ciência História, Karl Marx também é reconhecido como um teórico da ciência Sociológica, bem como sua teoria tem sido aplicada para entender a sociedade (Cf. Raymond Aron, Etapas do Pensamento Sociológico, pp. 185-301)..

[8]Dipesh Chakrabarty (1948-), professor de História no Lawrence A. Kimpton Distinguished Service, em artigo publicado na Economic and Political Weekly (Vol. 28, nº 22 [29 de maio de 1993], pp. 1094-1096 [3 páginas]), cujo título é Marx depois do marxismo: a perspectiva de um historiador subalterno, mostra a ineficiência do marxismo ortodoxo para captar e compreender sociologicamente as idiossincrasias dos povos na Índia.

[9]O filósofo e sociólogo alemão Karl Marx (1818-1883), por exemplo, refere-se à formação das sociedades em sua obra conjunta com Friedrich Engels (1820-1895) Manifesto do Partido Comunista (1848) como resultante de ‘conflitos de classes’, embotando a perspectiva de individualidade: "A História de toda sociedade até agora é a história das lutas de classes. (...) Em épocas históricas do passado, encontramos quase em todos os lugares uma estruturação da sociedade em diversos estamentos, uma escala de múltiplas posições sociais. Na Roma Antiga temos patrícios, cavaleiros, plebeus, escravos; na Idade Média, senhores feudais, vassalos, mestre de guilda, aprendizes e servos, e ainda, dentro de quase todas as classes, escalonamentos especiais." (2016, p. 52). Cientistas sociais lembram que embora o termo ‘classes’ possa ser entendido e usado apenas como um conceito amarrador e puramente didático, não deve ser considerado como algo que reflita uma realidade estanque e absoluta de um ‘grupo’, como pretende o Materialismo de Marx.

[10]Para Chartier, as teorias que agora estão abaladas podem ser definidas como aquelas que tentaram lidar com a responsabilidade de “identificar as estruturas e as relações que independentemente das percepções e das intenções dos indivíduos, comandavam os mecanismos econômicos, organizavam as relações sociais, engendram as formas de discurso.” O marxismo ortodoxo e sua ideia materialista de classes e de consciências rígidas, e os estruturalistas e suas percepções de um mundo com divisões estanques, buscavam pôr em prática tentativas de estabelecer aquilo que Carlo Ginzburg (1939-) chamou de método “galileano” – isto é, supor a as transformações das sociedades em linguagem matemática a fim de estabelecer suas leis de funcionamento, negando a realidade de individualidades não previsíveis e não determinadas.


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