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DIREITO E LITERATURA: COMO AS FICÇÕES PODEM NOS TOCAR MAIS DO QUE A REALIDADE?


Por: Assessoria de Imprensa
Data: 04/08/2020
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Literatura é manifestação em forma de história, poesia, conto, fábula etc. O Direito parece mais complexo, um instrumento de justiça, de peticionamento ou puro privilégio. Ao aproximar Direito de Literatura talvez a primeira atitude seja vasculhar na memória um personagem juiz, advogado, promotor, delegado. Ou, mais afundo, refletir sobre movimentos, representatividade e questionar, por exemplo, quantas autoras são reconhecidas por suas obras – para além de Cecília Meireles, Lygia Fagundes Telles, Clarice Lispector, Cora Coralina ou Rachel de Queiroz – autoras da atualidade, latinas, negras, da periferia.

Direito e literatura têm suas áreas específicas, mas como movimento é promissor campo interdisciplinar que favorece uma visão aprofundada e esclarecedora da realidade, do mundo e das relações sociais [1]. Aliás, como propõem Lenio Streck e André Trindade, [2] quanto da realidade tem nas ficções? E quanta ficção tem na realidade? Nas práticas jurídicas parece ter confusão entre as ficções da realidade e a realidade das ficções, o que endurece o ser humano e, então, a literatura, se coloca como um novo canal de aprendizado [3]. A literatura ajuda a existencializar o direito, visto que pela ficção ou realismo todas as certezas caem por terra, mas falar em distopias e utopias provoca ruídos no meio jurídico, pois há quem goste de conceitos prontos, enunciados e súmulas, porque lhes causam tranquilidade e certezas [4]. 

Mas por qual razão dizer que as ficções podem nos tocar mais do que a própria realidade? Experimente refletir com o seguinte: quem não se emocionou com o filme Como eu era antes de você (Me before you), inspirado no best-seller, de mesmo nome, da autora Jojo Moyes, certamente é porque não o assistiu. Mas, quando o assunto é especificamente a eutanásia – abstenção da vida de um indivíduo portador de doença terminal incurável ou invalidez irreversível, motivado por razões humanitárias, piedosas e com o consentimento daquele [5] – a reação não é tão agradável quanto assistir à trama. Prova disso foram as mensagens desconstrutivas e de conteúdo sensível que surgiram sobre o final do filme, e que alcançou um dos tópicos mais comentados no Twitter com a hashtag #MeBeforeEuthanasia, em 2016. Mas sem o referido livro/filme, a questão da eutanásia provocaria, da mesma forma, a intensa reflexão entre jovens e adultos sobre o tema? Provavelmente não, talvez a discussão ficasse restrita a decisões de casos concretos, normas e resoluções.

O direito não se resume em si, deve ser sensível à realidade, às manifestações sociais. A disciplina Direito e Literatura, ainda em expansão no Brasil, possibilita essa abertura de mundo necessária, a literatura pode despertar percepções que ainda não havia sido sentida sem aquela manifestação literária. A literatura se põe tão importante quanto qualquer outra matéria do ensino jurídico.

 

REFERÊNCIAS

[1] KARAM, Henriete. Questões teóricas e metodológicas do direito na literatura: um percurso analítico-interpretativo a partir do conto Suje-se gordo!, de Machado de Assis. Revista direito GV. FGV Direito SP, v. 13, n. 3, set./dez., 2017. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/revdireitogv/article/view/73327/70469. Acesso em: 02 jul. 2020.

[2] STRECK, Lenio Luiz; TRINDADE, André Karam. Introdução. in Direito e literatura: da realidade da ficção à ficção da realidade. STRECK, Lenio Luiz; TRINDADE, André Karam. (Org.). São Paulo: Atlas, 2013.

[3] STRECK, Lenio Luiz. Porque o direito precisa da literatura. 2014. Tv e rádio Unisinos (canal). YouTube. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=4QnEWihhCL4. Acesso em: 02 jul. 2020.

[4] KARAM, Henriete. Entrevista com Lenio Streck: A literatura ajuda a existencializar o direito. ANAMORPHOSIS – Revista internacional de direitos e literatura. v. 4, n.2, jul./dez. 2018. Disponível em: http://rdl.org.br/seer/index.php/anamps/article/view/525. Acesso em: 02 jul. 2020.

[5] CARVALHO, Gisele Mendes de; KAROLENSKY, Natália Regina. Aspectos bioético-jurídicos da eutanásia: análise das recentes Resoluções do CFM e do Anteprojeto de Código Penal de 2012. Anais do XXI Congresso Nacional do CONPEDI. Florianópolis: FUNJAB, 2012.


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