A educação negativa
Há diversos fatores que tornam a educação formal, escolar, tão complexa e, não raro, tão difícil de ser empreendida. Há tanto fatores objetivos (como as peculiaridades das várias disciplinas, com suas regras, metodologias e fórmulas) quanto subjetivos (que envolve diretamente as pessoas, como o bloqueio em relação a alguém na escola).
Dia desses ouvi uma de minhas vizinhas brigando com o seu filho de aproximadamente seis anos em pleno domingo a noitinha por causa da tarefa escolar. Não se trata aqui de julgar o comportamento da mãe, nada disso, mas de refletir sobre as consequências que podem advir desse simples ato de brigar.
A criança, que até então passou o sábado e o domingo feliz, a vontade, abruptamente se vê obrigada a sair da zona de conforto para estudar. Não é difícil de pensar que para a criança o estudo se torna sinônimo de fardo. E não é difícil de pressupor que para os pais a educação se torna algo igualmente cansativo, afinal, também eles estavam em uma posição de descanso.
Aos poucos, é possível acreditar que uma esfera agradável e libertadora da educação pode se converter em algo negativo, em uma ideia de que a educação é negativa em relação à vida. Para corroborar, isto é, concordar com essa hipótese, some-se o fato de que muitos pais chegam a dizer para os professores de seus filhos nas famosas reuniões de pais: “fique a vontade com o meu filho”, “pode chamar a atenção dele”. Se fosse para traduzir de forma mais clara e direta, poderia ficar assim dito: “se quiser pode brigar com o meu filho”. Por esses exemplos e muitos outros é que a educação é vista como negativa e a figura do professor pode ser associada à de um carrasco, conforme destacou o filósofo alemão Theodor Adorno.
Quando a criança chega em sala de aula ela não é uma folha em branco, ela já possui uma série de vivências e de impressões que acabam ou ajudando ou dificultando o seu processo de aprendizagem. Uma vez que ninguém é uma ilha, o professor, consequentemente, não pode focar seu labor tão somente no conteúdo, ainda que este seja um aspecto fundamental, mas é preciso, não raro, olhar um pouco o aluno para além do rótulo “aluno”, dito em outras palavras, olhá-lo como um ser humano mais amplo. Esse olhar maior permite ao professor um ganho em sua profissão, que lhe ajudará, por extensão, na parte dos conteúdos.
Uma questão a ser feita, porém, é a seguinte: e por que a educação não é vista no mais das vezes em sua dimensão positiva? Por que, por exemplo, um pai, mãe ou responsável não diz assim ao filho: “na escola você vai aprender tanto e fará boas amizades que te farão muito feliz”. Certamente que esse tipo de comentário, de visão de mundo, facilitaria bastante o trabalho do professor, pois não existiriam tantos bloqueios por parte das crianças.
Não estou aqui a dizer, todavia, que muitos pais/responsáveis não estimulam e não queiram o bem aos seus filhos, não é nada disso, tampouco não estou a dizer que muitos pais/responsáveis não tornam a educação enquanto algo positivo, mas apenas a indicar que a educação precisa sempre ser vista como algo bom, na medida em que isso faz com que a formação formal, escolar, seja facilitada. Uma vez que as coisas se tornam mais fáceis, tudo fica mais leve, inclusive os sábados e os domingos. Tudo fica mais leve!
Dr. Felipe Figueira
Felipe Figueira é doutor em Educação e pós-doutor em História. Professor de História e Pedagogia no Instituto Federal do Paraná (IFPR) Campus Paranavaí.