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A Baleia e Os Banshees de Inisherin


Por: Odailson Volpe de Abreu
Data: 02/03/2023
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Com a proximidade da premiação do Oscar, cada vez mais filmes concorrentes estão em exibição no cinema. Se existe um bom período para assistir um ótimo filme na tela grande, é sempre esse, que antecede a cerimônia. Na última semana eu comentei sobre um filme muito interessante que ganhou uma indicação de melhor ator. Hoje quero me dedicar a outros dois concorrentes fortes, que estão em cartaz, e que também possuem indicações. Um deles é A Baleia, o controverso drama que concedeu a Brendan Fraser uma indicação ao Oscar de Melhor Ator. Já o outro é Os Banshees de Inisherin, que possui nada menos do que nove indicações.

Vamos começar com o drama. A Baleia tem sido vendido ao mundo como um filme sensível, dramático e capaz de tocar fundo no coração. Na verdade, ele é tudo isso, mas embalado numa caixa enfeitada por preconceito. Ninguém pode negar que há arte no filme, tanto que Brendan Fraser conseguiu esfregar na cara de Hollywood, que o havia esnobado por anos, todo o seu talento. No entanto, o diretor Darren Aronofsky é conhecido por seus filmes controversos, surrealistas e perturbadores. Se ele já havia feito isso em filmes anteriores, em A Baleia ele vai além e escancara sua forma de ver o mundo sob um prisma muito particular. Algo que incomoda bastante, já que ele reproduz em sua película posicionamentos sociais sobre as pessoas gordas que necessariamente não refletem o modo de pensar da atualidade.

Vamos ao ponto, na verdade três pontos! Primeiro, ele errou já no começo, quando escolheu para o papel principal Fraser, que não possui o corpo exigido pela trama e precisou usar próteses para simulá-lo, isso quando existem muitos bons atores que sem encaixariam no que é exigido para esse filme. Segundo, seu roteiro sem ritmo e verborrágico tende a levar o público a acreditar que a obesidade foi uma escolha do personagem, quando na verdade não é. Já faz um tempo que a Organização Mundial da Saúde declarou obesidade como uma condição e um problema crônico. Terceiro, o filme reforça a ideia errada de que a obesidade vem acompanhada pelo desleixo ou sujeira, algo que não tem sentido e nem fundamento.

O diretor, Aronofsky, tende sempre a ser polêmico e nesse filme até o título tem um tom subjetivo, no mínimo, provocante. Isso porque o título faz alusão à uma redação sobre Moby Dick, mas que no Brasil pode suscitar as piores piadas possíveis, bem naquele estilo quinta série que alguns “tiozões” de plantão insistem em não abandonar.

A obra tem seu valor artístico e isso justifica a indicação ao Oscar ou os demais prêmios já recebidos nessa temporada. Independente das polêmicas, Darren Aronofsky é um diretor de qualidade e sabe trabalhar muito bem com um texto pesado, com uma trama densa e com um set de filmagem reduzido. O fato do protagonista estar preso dentro de seu apartamento permite que o diretor explore um tipo de claustrofobia que leva o público ao desespero e colabora para despertar o sentimento de empatia. A forma brutal de colocar na tela a humanidade do personagem central é avassaladora, suas escolhas certas e erradas dão o tom à obra e fazem dela uma experiência muito particular. Vamos à trama!

Um professor de inglês com obesidade severa vive recluso em seu apartamento. Solidão, depressão e culpa orbitam ao seu redor desde que seu último relacionamento acabou. Ao receber a notícia de seu eminente fim ele busca se reconectar com sua filha adolescente para uma última chance de redenção.

Por que ver esse filme? Sinceramente, existem aspectos nesse filme que me lembram muito um filme dos anos 2000 que eu abomino, O Amor é Cego. Eram outros tempos, por isso, aquela comédia romântica non sense se encaixava naquele momento da história, mas hoje em dia vai contra tudo o que construímos em relação a respeito e inclusão nos últimos vinte anos. Por isso, A Baleia, destoa e parece um retorno para esse passado onde explorar a dificuldade dos outros mesmo com a desculpa de fazer arte era algo permitido. No entanto, nada é tão ruim que não possa se salvar, dessa forma, ainda é possível focar no drama, no sentimento e na superação para tirar alguma coisa proveitosa do filme. Assista ao filme, assim você também poderá criticar depois o que lhe agrada ou não nessa obra controversa.

Agora, vamos comentar um pouco sobre Os Banshees de Inisherin, que também está em cartaz nos cinemas. Esse é um filme muito mais denso que o anterior comentado nessa coluna. Seu pano de fundo que contempla a Guerra Civil Irlandesa pode ser entendido como uma alusão ao que é desenvolvido durante a trama.

Repleto de metáforas, esse é um filme que exige atenção e reflexão, ao mesmo tempo que encanta pelo visual e por seus planos abertos de filmagem. Basicamente essa é uma tragicomédia que expõe a pouca habilidade de um homem simples em não saber lidar com o fim de uma amizade.

Bem por isso, Os Banshees de Inisherin deve ser compreendido como um filme profundamente relacional. Prádaic e Colm, os personagens principais, dão o ritmo à trama a partir do fim da relação entre os dois. Tudo o que acontece posteriormente a esse desenrolar se dá dentro de um contexto específico muito bem delimitado pela vida mediana da pequena Inisherin. De forma que, mais importante do que o texto do filme são suas representações. Os atores Colin Farrell, Brendam Gleeson e também Kerry Condon são excelentes e brilham ao longo da trama. Vale a pena destacar Colin Farrel, que volta às suas origensisso porque o ator é irlandês e está muito à vontade nesse papel, mostrando para todo mundo que ainda tem muito a oferecer para Hollywood.

O trabalho de fotografia contempla uma Irlanda que está para além da imaginação de uma população tropical como a nossa. Bem Davis, o responsável técnico por isso, leva o expectador para vales e montanhas de uma forma muito bonita e até mesmo poética.

O diretor Martin McDonagh conferiu a seu filme aspectos bem peculiares, como a teatralidade estampada nos diálogos de seus personagens caricatos, o modo de vida atrasado, ou mesmo o turbilhão de sentimentos que motivam seus protagonistas e tudo é escancarado na tela e absorvido pelo público. Desde seu excelente Três Anúncios Para Um Crime, de 2018, o diretor McDonagh tem chamado a atenção da crítica e do público para sua capacidade de envolver o público por meio de suas histórias dramáticas e muito humanas. Por isso, é esperado que o diretor extraía o máximo dos atores que têm à sua disposição e por isso o filme acaba sendo tão impactante, mesmo sendo simples.

Não se iluda com a ideia de comédia, essa obra é um verdadeiro drama, mas que vem embalado por pequenas e sutis tiradas cômicas que um expectador desatento pode até mesmo nem perceber. Sutilezas de um diretor seguro e que sabe o que quer entregar ao público. Uma obra prima que vale a pena ser contemplada no cinema, isso porque mesmo fazendo rir, tem um tom muito mais trágico do que o habitual, marcando profundamente a memória de quem o assiste. Um candidato de peso para premiação do Oscar que está cada vez mais próxima. Boa sessão!

Odailson Volpe de Abreu


Anuncie com Jornal Noroeste
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