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Depois do adeus: como lidar com os lutos?


Por: Simony Ornellas Thomazini
Data: 31/07/2020
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Quando falamos do luto nos referimos a toda e qualquer tipo de perda. E quem perde? Eu. Eu que sou um corpo, ou seja, eu sou mulher, homem, filho, filha, etc. E ao mesmo tempo que sou isso, também estou “junto com”. Isto significa dizer que vivemos em interrelações. Nesse sentido, há sempre um sujeito e um objeto. 

Dito isso, o que se pode pensar do que é a morte ou a perda?

É quando essa engrenagem, esse estar “junto com”, sofre uma ruptura. E às vezes dói, porque arranca, ou seja, a morte, ou a perda é isso: arrancou uma parte de mim, materialmente ou imaginariamente, algo que estava aqui e de repente não está mais. Por exemplo: perdi o emprego, morreu alguém, perdi um braço, uma perna ou qualquer outra parte de mim do corpo, perdi o pai, a mãe, o filho (a), um irmão (ã), perdi um amor, o cabelo, o casamento, a juventude, dentre milhares de outras perdas. 

Qualquer morte ou perda desiquilibra esse Eu que não se reconhece mais, isto é, não sabe mais quem ele é. É muito comum presenciarmos esse tipo de experiência quando se perde um filho (a), a própria juventude, etc. Quem sou eu agora sem esse filho (a)? Quem é este que me encara no espelho?

Por que acontecem muitos suicídios quando se perde um amor? Ou quando se perde milhões na bolsa? Ou quando meu pai ou minha mãe não aceitam minha sexualidade?  Por que eu posso me matar ou matar o outro quando algo valioso é tirado de mim? 

Porque eu não existo sem aquilo. E com isso, prefere-se perder a vida ou tirar a vida de outro porque aquilo que eu era sofre uma desestabilização. Assim, o Eu sempre está “junto com”, ou seja, não existe uma independência do Eu, bem como é falso dizer que somos como indivíduos que não precisa de outras relações. 

Sabendo que estamos todos interrelacionados uns aos outros, precisamos entender que em algum momento de nossa vida, as rupturas irão acontecer. Haverão perdas, porém, acontecerá também novos arranjos, outras possibilidades de se criar outros elos com outras pessoas e tudo bem. É essa a melhor elaboração possível do luto. É quando é possível descobrir novas saída através de outros vínculos diante do que nos foi arrancado. 

O luto é você saber aceitar a perda do objeto e, ao mesmo tempo, conquistar algo desse objeto para levar com você pela vida. Isso também equivale a dizer sobre um resto desse objeto que irá pairar sobre o Eu, como Freud escreveu lindamente em “Luto e Melancolia”.

O luto, a morte, as perdas, são as grandes metamorfoses do eu que acontecem o tempo todo. Porque à medida que vamos vivendo, iremos nos moldando conforme nossas experiências, vínculos, conexões. Nada é estático, pois estamos sempre sendo outra coisa. 

A verdadeira morte é quando a gente recusa o término de uma relação que já acabou, quando terminou o compartilhamento daquilo que é importante. É quando já não tem mais graça segurar na mão do outro, ir ao cinema, não existe mais troca, partilha e diálogo com emoção e interesse. 

A verdadeira morte é quando se recusa um fim. É quando você já não sabe e nem pode reconhecer que não está mais dentro, que não está mais criando com energia, ou seja, você está na inércia e paralisado diante da própria vida. E essa é a verdadeira morte, isto é, quando você está morto, é quando você não tem mais o elo que faz troca com o objeto que até então te sustentava. É apenas uma coisa mortificada. E isso já aconteceu, mas você demora muito para se dar conta disso e romper esse tipo de relação. 

O que acontece é que você continua nessa lógica paralisante e fica 10 anos no mesmo emprego, mais uns 5 anos num namoro ou casamento e mais uns 20 anos falando a mesma coisa, pensando a mesma coisa e se defendendo das mesmas coisas. E é essa a real morte, quando sua vida está presa na repetição e você vive um loop infinito das mesmas coisas. 

Como lidar com isso? Primeiro passo é reconhecer o fim, saber que as coisas terminam, e, depois disso, elaborar os lutos para que se possam criar novos vínculos e conexões.  Só há vida para quem escolhe ações e movimentos a favor dela.

Simony Ornellas Thomazini


Anuncie com Jornal Noroeste
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