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Nada de Novo no Front e Enola Holmes 2


Por: Odailson Volpe de Abreu
Data: 03/11/2022
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Nos cinemas brasileiros, o início de novembro tem sido bem morno, possivelmente, até sem graça. As poucas estreias dessa semana não chamam a atenção e se mostram bastante inexpressivas. Tudo isso tende a mudar nas próximas semanas, principalmente com a chegada de Pantera Negra – Wakanda Para Sempre, da Marvel, que promete animar o público em geral. Mas, por enquanto, o melhor é voltar a atenção para o streaming, pois nas atuais circunstâncias esse serviço se mostra como a melhor opção para diversão no fim de semana. Se considerarmos o clima tenso que os bloqueios antidemocráticos têm gerado no país, ficar em casa e ver um filminho no conforto e na segurança do lar é a decisão mais acertada. Por isso, essa semana, gostaria de comentar sobre dois filmes de peso da Netflix. Um deles estreou semana passada e é um drama de guerra alemão excelente, intitulado Nada de Novo no Front. O outro tem sua estreia marcada para dia 04 de novembro e ainda não havia sido liberado até o fechamento dessa coluna, no entanto, já está agitando o mundo virtual, ele é a aventura juvenil Enola Holmes 2. Sobre eles vamos saber um pouco mais na edição dessa semana.

A primeira coisa importante que deve ficar bem clara sobre os dois filmes, é que são completamente distintos e que tendem a agradar públicos completamente diferentes. Para mais, como Enola Holmes ainda não estreou ele segue como uma incógnita e o que é possível afirmar sobre a obra é apenas o que já foi divulgado pela mídia e pelos trailers, por isso, reservarei apenas alguns breves comentários sobre ele no final da Coluna.

Sendo assim, vamos começar com Nada de Novo no Front. Foi o tempo que me levou a apreciar o cinema europeu. Isso porque a Sétima Arte do “velho mundo” é algo que se contempla plenamente apenas com a maturidade. Com um senso estético completamente diferente daquele comercial/industrial americanizado ao qual estamos acostumados, o cinema europeu tende a surpreender de várias formas, ao mesmo tempo em que desagrada muita gente na mesma medida.

Me lembro com nostalgia do meu primeiro contato com um filme alemão. Era final dos anos 1990 e o filme tinha o tom, o ritmo e as cores da idade que eu possuía na época. Corra, Lola, Corra, tinha tudo o que um adolescente gostava, não se tornou um cult da sua época, mas era divertido, psicodélico e original o suficiente para me fazer gostar daquele jeito estranho de fazer cinema. Depois desse longa consumi outras obras produzidas na Alemanha, com destaque, é claro, para a mais badalada dentre todas, Adeus, Lenin!, de 2003. Um filme impactante, que abordava de forma muito poética o fim de uma era e a abertura de um mundo inteiro ao novo, que inevitavelmente sempre vem (se ficou curioso, o filme fala sobre a maneira como a Alemanha Oriental foi incorporada ao mundo ocidental através dos olhos de um jovem cuja mãe, militante comunista, entra em coma antes do fim do regime. Quando ela corda, um ano depois da queda do Muro de Berlim, o filho tenta criar uma farsa como se nada tivesse mudado para que o choque não venha a matá-la).

De qualquer forma, eu diria que a grande característica dos filmes alemães, muito mais do que suas tramas intrincadas e inteligentes, é sua calma em desenvolver ideias, personagens e tramas. Diferente da forma hollywoodiana consagrada, que impõe agilidade, adrenalina e ritmo acelerado em tudo, os filmes germânicos tendem a ser muito mais demorados e arrastados, como se o ato de ir ao cinema fosse um prazer quase homeopático, servido de forma lenta e em partes que completam um todo. Esse ritmo é reproduzido de forma intensa na obra que a Netflix liberou na semana passada. Nada de Novo no Front é bem devagar, mas nem por isso é menos necessário.

O filme tem como base a história do livro de Erich Maria Remarque, publicado em 1929. Escrito no período intermediário entre a 1ª e a 2ª Guerra Mundial, a obra de Remarque tem um apelo claramente pacifista e, em tempos de guerra entre Rússia e Ucrânia, segue como uma trama mais atual do que nunca.  Essa adaptação, que foi direto para o streaming, é a terceira feita com base nessa obra de Remarque, no entanto, é a única que tem um apelo amplamente popular, já que o alcance de uma estreia na Netflix tem dimensões globais.

O diretor Edward Berger, que também foi responsável pelo roteiro, é eficaz de várias formas. A primeira delas é o fato de se manter fiel ao quão horrorosa é uma guerra. O filme tem o efeito de um soco bem dado na boca do estômago do expectador. Essa crueza é essencial para que o público entenda a mensagem que filme quer passar. Para mais, é de responsabilidade da direção o ótimo resultado de composição de cena que, juntamente com um ótimo trabalho de fotografia, consegue impor beleza até mesmo nas cenas mais terríveis.

Algum tempo atrás, quando comentava aqui na Coluna sobre o filme 1917 (esse filme não ter ganhado o Oscar de Melhor Filme em 2020 foi uma injustiça), trazia a discussão sobre a pouca quantidade obras cinematográficas sobre esse acontecimento histórico, a 1ª Grande Guerra. Interessante é que com Nada de Novo no Front a Netflix aborda justamente o mesmo conflito, mas agora, sob a ótica do país perdedor. A história tende a ser contada pelo lado vencedor e o perdedor, visto sempre como vilão, é costumeiramente subestimado. O filme de Berger, assim como a obra original de Remarque, é muito humano, pois ilustra muito bem como a guerra é desastrosa para todos os lados ganhadores ou perdedorese principalmente para as pessoas que estão imersas na lama podre das trincheiras. Sobre isso, preste atenção numa das cenas finais que se desenvolve entre o protagonista e o soldado francês, é sublime.

Outro aspecto curioso e que dificilmente é abordado nos filmes de guerra americanos é a hipocrisia dos “donos da guerra”. Aqueles figurões de alto escalão que se banqueteiam e ficam em segurança em seus quartéis e palácios enquanto seus comandados sofrem com as agruras do conflito nas barreiras, trincheiras e barricadas da linha de guerra. A guerra não é igual para todos e isso não se aplica apenas ao passado, mas pode e deve ser aplicado principalmente ao presente, quando alguns escolhem ir à luta por algumas guerras já perdidas, sem o menor apoio de seus líderes, que se silenciam em seus palácios.

Outro ponto de destaque no filme é sua trilha sonora. Ela tem uma capacidade ímpar de incomodar constantemente, o que ajuda muito na composição do clima de tensão que o filme buscar impor em seus momentos mais cruciais. O responsável por isso foi o profissional Volker Bertelmann, que possivelmente surpreendeu muita gente com seu trabalho.

Do elenco alemão, claramente desconhecido para nós, o grande destaque é o protagonista Felix Kammerer, que interpreta de maneira primorosa as várias fases do soldado alemão Paul Bäumer, desde sua decisão inocente e patriótica de se alistar na guerra influenciado por outros, até seu brutal cair em si quando se depara com os horrores do conflito. Mas, se você assistiu o já comentando Adeus, Lenin! irá reconhecer prontamente o ator Daniel Brühl em mais uma de suas interpretações.  Vamos à trama!

No filme, um grupo de estudantes alemães é convencido por um professor excessivamente nacionalista a se alistar no Exército durante a Primeira Guerra Mundial. Ao testemunharem morte e mutilações, o heroísmo dá lugar aos horrores e às tragédias da guerra, que atingem a cada um de maneira muito diferente e particular.

Por que ver esse filme? Esse não é um filme fácil de ser visto em vários sentidos. Mesmo assim, isso não faz dele um filme ruim ou desnecessário, pelo contrário. Ao fugir do padrão já pré-definido de filmes de guerra, Nada de Novo no Front não tem um herói, como em 1917, ou uma jornada de redenção, como O Resgate do Soldado Ryan, ele tem apenas uma profunda mensagem central: a guerra não vale a pena. Isso, somado ao trabalho técnico excelente faz com que as mais de duas horas do filme, por vezes arrastadas para o gosto particular de muitos, valha o sacrifício.

Por outro lado, se você não está disposto a enfrentar o brutal choque de realidade que Nada de Novo no Front tem para oferecer, pode se aventurar pela sequência de Enola Holmes, a irmã mais nova do detetive fictício Sherlock Holmes. A produção, que foi dirigida por Harry Bradbeer, marca a continuação da história apresentada pela Netflix em 2020. Trazendo como protagonista a grande estrela da famosa série Stranger Things, Millie Bobby Brown. O filme conta ainda com Henry Cavill, Helena Bonham Carter e Louis Partridge no elenco. Baseado na série literária de Nancy Springer, Enola Holmes 2 é um filme muito bom para quem quer se divertir com uma trama interessante e destinada para toda a família. Boa sessão!

Odailson Volpe de Abreu


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