A generic square placeholder image with rounded corners in a figure.


Sétima Arte


Por: Odailson Volpe de Abreu
Data: 15/05/2020
  • Compartilhar:

Segue o período de cinemas fechados e por isso, mais uma vez, a Coluna Sétima Arte traz uma indicação que você pode conferir direto da sua casa, via streaming. A Netflix estreou um tempo atrás uma obra original que tinha tudo para ser apenas mais uma Comédia Romântica para adolescentes - no estilo de várias outras lançadas recentemente nessa plataforma -, mas que surpreendeu muita gente com uma história mais densa e reflexiva do que se poderia esperar. Hoje você vai conhecer um pouco mais sobre Você Nem Imagina.

Provavelmente você já passou pelo pôster desse filme na tela de abertura da sua Netflix e ele nem chamou muito a sua atenção. Isso porque o pôster é muito parecido com outros de filmes adolescentes e é claro, quem não tem muito interesse por esse gênero acaba seguindo em frente. Além disso, a sinopse dá a entender que a trama segue o ritmo de um triângulo amoroso, um clichê presente em quase todas as obras desse estilo. Mas tudo isso é um engano aparente. Você Nem Imagina envereda sua história por caminhos dramáticos, com uma ambientação soturna e que, ao contrário do que se espera, não é só e simplesmente um romance.

Classificá-lo como romance adolescente seria desmerecer a obra da diretora Alice Wu, que, além de dirigir também escreveu essa história. Pode-se dizer que esse é um filme que aborda as minorias da sociedade, ou seja, aqueles que mesmo à luz do dia vivem nas sombras, pois a ordem estabelecida tende a não querer enxergá-los. Quem são essas minorias? É o imigrante isolado e depressivo num país hostil, é a lésbica que se esconde por medo de não ser aceita, é o bullying sofrido silenciosamente nos corredores da escola, são os pobres castigados pela indiferença e prepotência dos mais afortunados. Esses são os elementos que direcionam a trama de Você Nem Imagina e que atropelam os sentimentos do expectador.

O filme tende a apresentar cada personagem importante de maneira singular, pois aparentemente não aprofunda suas histórias, mas oferece elementos suficientes para que o expectador não seja indiferente a nenhuma delas. A partir disso, apresenta uma visão bastante bruta do mundo adolescente ao qual a protagonista está inserida. Ao fazer isso brinda o público com citações filosóficas e literárias sobre questões existenciais sobre a vida, sobre o amor e sobre a descoberta de si mesmo. Mesmo quem não está familiarizado com Platão, Oscar Wilde ou Sartre vai se identifcar com as referências, porque elas são inerentes a vida e permeam a todos em vários momentos de suas existências. Nesse ponto, cabe dizer que a obra se torna muito mais autoral do que aparenta e que muito da experiência de vida da própria diretora foi transposto para a tela.

Dessa forma, a trama ganha muito mais peso e foge de seu clichê inicial, para se tornar uma trilha de descobertas, de construção de amizade e confusão de sentimentos que vão muito além de apenas mais um romance. Para isso, introduz o despertar à sexualidade da própria protagonista, ao seu encorajamento para enfrentar as pessoas de uma típica cidade pequena do interior americano, extremamente religiosa e cheia de preconceitos. Um expectador mais desavisado ou aquele que gosta de classificar a si mesmo como o tal “cidadão de bem” - tão bradado no Brasil de agora -, pode se surpreender e talvez se questionar com o desenvolvimento da história, mas ninguém pode negar que ela é relevante, sublime e extremamente humana.

Tecnicamente Você Nem Imagina também tem muito a acrescentar. Seus enquadramentos enriquecem a obra e cooperam para que a história em si seja desenvolvida. Muito sutil e melancólica, utiliza cada cena em favor da narrativa, fazendo com que o expectador atento compreenda a partir dos pequenos detalhes o macro da história. Utiliza em certos momentos planos fechados no rosto dos atores para ressaltar um sentimento ou uma ideia e depois expande esse plano para fazer com que o ambiente ao redor colabore para que o expectador compreenda a trama. As cenas na estrada, entre as árvores, são sempre um deleite. Isso tudo é de um requinte visual que não é nada usual para filmes adolescentes.

Por fim, o elenco entrega um ótimo trabalho, tendo destaque Leah Lewis e Daniel Diemer, que possuem uma química excelente juntos e que crescem em tela ao longo do desenvolvimento do filme. Ela sempre controlada, calculista, quase fria, ele o completo oposto, sensível, pouco intelectual, as vezes, quase bobo. Um complementa o outro. Já a bela Alexxis Lemire ilumina a tela sempre que aparece e sua atuação é muito transparente, tanto que ela consegue ilustrar muito bem o que existe de inteligência para além da aparência. Vamos à trama!

Em Você Nem Imagina, Ellie Chu é a típica aluna deslocada que possui o hábito de fazer a lição de casa de seus colegas por dinheiro para contribuir com as contas em casa. Secretamente, ela possui uma paixão pela bela Aster Flores. Quando Paul, um jogador de futebol, se aproxima de Ellie para pedir ajuda para escrever uma carta de amor para sua amada, ela entra em conflito. 

Por que ver esse filme? Porque ele aborda temas difíceis, mas necessários e importantes sobre a atualidade de forma natural, sutil e digna, sem mistificar, coisificar ou criar arquétipos (nesse caso não estou falando apenas da questão LGBT, mas de várias outras questões próprias do nosso tempo). É um drama que faz pensar a vida e a forma como ela obriga cada um a amadurecer e como isso está inerente ao espaço e às pessoas com que cada um tem que conviver. Um drama agradável, com toques de romance e muita reflexão. Se esse é o seu estilo de filme, aproveite o fim de semana e assista em casa. Boa sessão!

Odailson Volpe de Abreu


Anuncie com Jornal Noroeste
A caption for the above image.


Veja Também


smartphone

Acesse o melhor conteúdo jornalístico da região através do seu dispositivos, tablets, celulares e televisores.