Quero entregar meu filho para adoção, estarei cometendo um crime?
Por Ana Maria Maneta
De forma recorrente se vê notícias de bebês que foram deixados em rodoviárias, sacos de lixo em matagais ou que são entregues dentro do próprio hospital para adoção, e situações como essas assustam, impressionam e mexem com a sociedade em geral. Contudo, nos exemplos citados existem duas situações diversas: uma dessas constitui crime e ilícito civil - o abandono de incapaz - e outra é completamente possível e protegida pela Lei - a entrega voluntária (e regular) para adoção.
O abandono de incapaz é um crime, tipificado no art. 133 do Código Penal, que se caracteriza quando os responsáveis por uma pessoa impossibilitada de se defender sozinha a abandonam. Inclusive, quando este é cometido por uma mãe ou pai contra seu próprio filho, a pena pode ser aumentada em 1/3. É uma situação extremamente grave, que não pode ocorrer de forma alguma, já que os pais têm o Poder Familiar (que engloba os direitos e deveres estes têm em relação aos filhos) e o dever de cuidar destes. Além disso, é ilícito civil, passível de responsabilização (indenização) conforme arts. 186 e 227 do Código Civil.
Mas e se a pessoa (mãe ou gestante) não tem a possibilidade de cuidar de seus filhos, o que fazer? Aí entra o ato lícito e livre de qualquer constrangimento, por parte dos profissionais que terão contato com essa mulher, sejam de saúde ou demais áreas: a entrega voluntária para adoção. Segundo os arts. 19-A e 13, §1º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) a pessoa que deseja entregar seu filho (criança ou adolescente) para adoção será encaminhada à Vara de Infância e Juventude para que seja atendida de forma adequada.
E como funciona essa entrega? Será precedida de orientações que serão prestadas pela equipe técnica do Fórum, formada por psicólogas e assistentes sociais. Além disso, é garantido o sigilo do ato, a mãe tem o direito de não comunicar sua família sobre o nascimento do bebê e também de não dizer quem é o pai. Esta não pode ser realizada por escrito, é necessário que os pais ou a mãe seja(m) ouvido(s) em audiência, e serão acompanhados por advogado ou pela Defensoria Pública. Depois de serem ouvidos, confirmado o desejo da entrega, o juiz irá proferir uma sentença extinguindo o Poder Familiar.
Faz-se necessário dizer também, que os pais ou a mãe têm o direto de se arrepender desta entrega para adoção em até 10 dias depois da sentença. Em havendo o arrependimento, nesse período, a criança será devolvida aos pais e o Poder Judiciário acompanhará o caso por 180 dias. Salienta-se que passado esse prazo de 10 dias, não há como voltar atrás. Além disso, não é possível que os pais escolham por quem o filho será adotado, muito menos receber dinheiro para que entregue esta criança a um terceiro, pois tal ato também constitui crime, conforme o art. 238, caput, do ECA.
Portanto, é necessário que as pessoas estejam informadas sobre seus direitos, bem como os profissionais que atuam na proteção das crianças e adolescentes. Para tanto, cita-se o exemplo da Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Maringá, que criou a campanha Adoção Segura com o objetivo de instruir todos aqueles que trabalham na Rede de Proteção aos infantes e também a população em geral, como forma de evitar que adoções e/ou entregas irregulares para adoção aconteçam, coibindo, dessa forma, o cometimento de crimes e orientando as pessoas sobre o que podem e não podem fazer. Afinal, várias são as razões para que as gestantes ou mães decidam por entregar seus filhos, não cabendo à sociedade o julgamento, mas sim o amor, da mesma forma que a adoção demonstra ser possível amar nas mais diversas situações.