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No Ritmo do Coração


Por: Odailson Volpe de Abreu
Data: 23/09/2021
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Se você for um leitor atento e assíduo da Coluna, percebeu que recentemente eu tenho buscado variar bastante os gêneros comentados nesse espaço. Tudo bem que sempre existirão os queridinhos do público em geral, como, por exemplo, a ação ou a comédia, mas dar espaço para o melodrama, o terror, os filmes nacionais e, até mesmo, os filmes Cult é uma forma de diversificar um pouco essa mesmice que nos foi imposta pela pandemia. Na edição dessa semana quero abrir o espaço para um drama que acabou de estrear no cinema e que flerta abertamente com a arte, tocando profundamente no coração. Prepare-se para conhecer melhor a obra No Ritmo do Coração.

Recordando os meus tempos de locadora, eu diria que esse filme é aquele tipo que “não se loca sozinho” (risos). Você deve estar se perguntando o que isso quer dizer! Eu vou explicar. Naquela época, final dos anos 1990, muitos filmes eram excelentes, mas ninguém se interessava por eles porque o título ou a capa eram genéricos demais. Era preciso que o atendente da locadora (no caso eu, na minha versão adolescente – risos) comentasse sobre eles e indicasse. Em geral, o cliente voltava maravilhado com o filme e muito satisfeito. Eu diria que com No Ritmo do Coração acontece a mesma coisa. Se você for desavisadamente ao cinema, sem conhecer nada sobre a trama dificilmente irá se interessar por essa obra. Isso porque tanto o título, quanto o pôster não traduzem a essência do que ele representa. Ou seja, é um filme que não se vende sozinho.

Vamos começar falando sobre o título em português. Não é de hoje que muitas traduções dos títulos deixam demais a desejar e nesse filme não foi diferente. O título original em inglês é CODA, uma sigla para crianças com pais surdos (child of deaf adults), um título extremamente significativo e marcante. Como não existe equivalente para essa sigla em português, o desafio seria encontrar algo que fosse próximo disso, mas não deu certo. No fim, o nome escolhido em nosso idioma ficou demasiado genérico e dá a impressão de ser apenas um romance, um musical ou algo do tipo. E, confiem em mim, esse filme é mais que isso. O pôster oficial também é muito discreto com algumas pessoas sentadas na carroceria de uma caminhonete. Tudo bonito, simples, mas que dificilmente traduz tudo o que a trama apresenta.

Sobre a história, vale a pena comentar que ela não é original, pelo contrário, esse filme é a versão americana de um filme francês intitulado A Família Bélier, de 2014, e que fez muito sucesso no velho mundo, arrebatando o público e a crítica. Essa nova versão teve a direção entregue ao comando de Sian Helder, conhecida por ser uma das responsáveis pela famosa série Orange is The New Black. A diretora fez uma imersão no universo das pessoas surdas, contratou especialistas na linguagem de sinais americana e escolheu um elenco de atores que realmente possuem deficiência auditiva para concretizar seu filme. O resultado não poderia ser melhor.

O elenco é encabeçado por Emilia Jones, ela é a jovem protagonista da trama, uma atriz completamente multifacetada que brilha forte ao longo do filme. Ela interpreta, canta e ainda é interprete de sinais ao longo de toda a história. Eu não sei se ainda é cedo para isso, mas não me surpreenderia se ela recebesse alguma indicação de melhor atriz ao Oscar, ou pelo menos ao Globo de Ouro. Além dela o elenco ostenta a atriz surda e ganhadora do Oscar Marlee Matlin, o divertido Troy Kotsur e também Daniel Durant, todos surdos na vida real e extremamente talentosos. Soma-se a eles Eugenio Derbez, que na trama explicita toda a influência positiva que um bom professor pode ter na vida de qualquer pessoa.

Tecnicamente falando o filme é muito competente, seu roteiro é profundo, mas ainda é assim é leve e engraçado. Faz com que o público se conecte com o drama da protagonista e de sua família, mas não de uma forma pesarosa. É um típico filme de amadurecimento, mas que não se deixa levar pelos clichês fáceis desse tipo de história. Mais que isso, é um filme que não narra apenas o amadurecimento da jovem protagonista, mas de toda a sua família na medida em que ela cresce. Não à toa, em sua estreia no Festival de Sundance em janeiro deste ano, a obra conquistou os grandes prêmios desse festival e teve os seus direitos de exibição adquiridos por uma cifra exorbitante pela todo poderosa Apple. Vamos à trama!

No Ritmo do Coração conta a história de uma família com deficiência auditiva que comanda um negócio de pesca em Gloucester, nos Estados Unidos. Ruby, a única pessoa da família que escuta, ajuda os pais e o irmão surdo com as atividades do dia-a-dia. Na escola, ela se junta ao coral (alguém aqui lembrou de Glee?), onde acaba se envolvendo romanticamente com um de seus colegas. Com o tempo, ela percebe que tem uma grande paixão por cantar e seu professor a encoraja a tentar entrar em uma escola de música. A jovem, então, precisa decidir entre continuar ajudando sua família ou ir atrás de seus sonhos.

Por que ver esse filme? Mais do que entretenimento, o cinema é um meio pelo qual as pessoas aprendem mais sobre a vida. No ano passado eu comentei sobre o excelente O Som do Silêncio, que trazia de forma muito verdadeira a maneira como um jovem músico descobriu sua surdez. Agora, fico feliz que outro filme traga a temática da surdez de maneira mais leve e, ao mesmo tempo, tão intensa! É bom ver o cinema representar histórias de sucesso de pessoas que, muitas vezes, não são compreendidas ou valorizadas pela sociedade. No Ritmo do Coração não emociona por meio do compadecimento, pelo contrário, ao trazer uma abordagem realista, celebra e emociona por meio da grande humanidade que as pessoas com deficiência evidenciam ao longo de suas histórias de vida e superação. Com certeza esse é um filme que não pode ser julgado apenas pelo seu título ou pelo seu pôster. Assista no cinema, ou, caso não queira se arriscar por causa da COVID-19, aproveite que ele está disponível também pelo streaming Apple TV+ e veja em casa. Boa sessão!

 

Assista ao trailer:

Odailson Volpe de Abreu


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