“Em briga de marido e mulher ninguém mete a colher.” Será?
P / Ana Elisa Silva Fernandes*
Comumente se ouve falar que em discussões familiares, terceiros não devem se envolver. Inclusive esta ideia é representada em ditado muito conhecido: “em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”. Contudo, muitos são os benefícios em ter um terceiro auxiliando as partes em um conflito familiar. Este terceiro poderá ser o próprio Estado, na figura do juiz, em uma demanda judicial, quando incentiva as partes, por exemplo, a levarem em consideração os cuidados que o ex-casal de genitores deve ter para com os filhos menores. Ou até mesmo a figura de um terceiro neutro, imparcial, conhecido como mediador de conflitos, cuja atuação poderá ser tanto no processo de família (de forma incidental), na via pré-processual (antes de iniciar o processo) ou extrajudicial (fora do Judiciário). O atual sistema jurídico brasileiro prevê o auxílio às partes de terceiro para buscar a melhor solução ao conflito de família, tanto no decorrer de um processo judicial quanto na área privada, segundo as normas previstas no art. 692 a 699 do atual Código de Processo Civil [1], Lei de Mediação, nº 13.140 (que dispõe sobre as normas relativas a mediação judicial e extrajudicial) [2], e a Resolução nº 125 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) [3].
A mediação familiar consiste em um procedimento voluntário, em que as partes, com o auxílio de um terceiro imparcial (mediador) buscarão identificar as razões e motivos para o conflito de família e juntas tentarão encontrar uma solução para as questões envolvidas no conflito. A mediação pode ser realizada tanto no decorrer de uma ação judicial quanto no âmbito privado. O mediador, que não irá tomar partido em relação a uma das partes, fará uso de técnicas de negociação para ajudar as partes a melhorarem a comunicação entre si a fim de se comunicarem melhor e chegar a um acordo em comum. A técnica tem se mostrado muito benéfica, principalmente em casos que envolvam filhos menores e os pais devido as mágoas e questões não resolvidas no divórcio, não conseguem chegar a um acordo.
Quanto aos benefícios da intervenção do mediador nos conflitos de família, recentemente, foi publicada na revista internacional Cortex, uma pesquisa realizada na Universidade de Genebra (Unige) na Suíça de um estudo realizado com 36 casais e os resultados comprovaram as vantagens do uso da mediação nos conflitos de casais, inclusive com efeitos positivos no cérebro. Pelos resultados, foi possível identificar o aumento da atividade em regiões-chave do cérebro pertencentes ao circuito de recompensa. Isto é, os casais que receberam mediação ativa de um terceiro que os auxiliou na condução do conflito, relataram maior satisfação no processo de resolução do que os casais que não foram mediados.[4]
Além dos benefícios mentais e psíquicos que o estudo comprovou, a intervenção de alguém capacitado e treinado para a condução de conflitos poderá auxiliar os pais a prestarem maior atenção e cuidados aos filhos que também vivenciam o processo de divórcio, e que inevitavelmente serão afetados pela ruptura conjugal, seja pelo não convívio diário e rotineiro com ambos os pais, ou pelas as brigas e discussões do casal que acabam influenciando psicologicamente os filhos. Assim, os filhos serão beneficiados com a atitude dos pais de procurarem ajuda para a família, mesmo com o término da relação conjugal. O mediador de família, tanto o que atua no processo judicial, quanto o privado, por meio de técnicas específicas, terá a habilidade de auxiliar os pais a identificarem os interesses em comum em relação aos filhos, e ajudá-los a encontrar a solução que melhor se adapte àquela realidade familiar.
Em tempos em que os conflitos de família são cada vez mais comuns, é muito importante contar com a presença de um profissional capacitado para intervir no conflito especialmente no caso de existirem filhos, em que as decisões após a separação do casal irão repercutir no futuro dos menores. De acordo com o atual Código Civil brasileiro [5] e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) [6], estas decisões devem ser tomadas sempre visando o melhor interesse do menor, de forma a manter a convivência familiar e o exercício da parentalidade responsável, tendo em vista que a criança ou adolescente está em processo de formação e desenvolvimento da personalidade e nessa fase o convívio saudável com ambos os genitores é essencial para a construção de referenciais para a vida em sociedade.
Caso você esteja vivenciando o processo de divórcio, em que se discuta a guarda, pensão alimentícia ou outros temas de família, e tenha o interesse em passar pela mediação familiar, procure um advogado especializado na área, vá até as instituições de ensino superior que ofereçam, gratuitamente, o serviço de assistência jurídica, ou vá até o fórum de sua cidade e procure pelos serviços do Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs).
Referências utilizadas:
[1] BRASIL. Lei n.º 13.105, de 16 de março de 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm#art1045. Acesso em: 14 set. 2020.
[2] BRASIL. Lei n.º 13.140, de 26 de junho de 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm. Acesso em: 14 set. 2020.
[3] BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 125 de 29 de novembro de 2010. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/files/resolucao_comp_125_29112010_19082019150021.pdf. Acesso em: 14 set. 2020.
[4] MANIERO, Valéria. Estudo suíço mostra que mediação externa pode ser solução em brigas de casal. UOL Notícias, 3 ago. 2020. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/rfi/2020/08/03/estudo-suico-mostra-que-mediacao-externa-pode-ser-solucao-em-brigas-de-casal.htm. Acesso em: 15 set. 2020.