Daqui sessenta anos poderei falar de tudo
Repreenderam-me em um dos meus textos:
“- Você é um jovem professor, que só leu a história e não a viveu.”
Sob esse ponto de vista, só posso falar de trinta e dois anos para cá, sobre Paranavaí e, quem sabe, sobre Maringá. Na verdade, como pouco me lembro dos meus dez primeiros anos de vida, só posso falar de vinte e dois anos para cá.
Que difícil a minha vida: enquanto professor de História, não poderei falar dos gregos, dos romanos, do Brasil Colônia, Império, e nada poderei falar sobre a ditadura militar brasileira.
Que difícil a minha vida: como nunca estive no Acre, não posso falar desse estado; tampouco posso falar, por essa lógica, do Amapá, do Rio Grande do Norte, do Egito, da Rússia, etc. etc. Quantos etc.!
Ao contrário, a centenária rainha da Inglaterra, ou a bisavó da minha esposa (que tem cento e onze anos), podem falar de tudo, até do surgimento do mundo.
Quantas conclusões óbvias.
Quando dizem que não vivi no tempo da ditadura, logo, que não posso falar a respeito:
“O argumento de que não podemos julgar se não estivemos presentes e envolvidos parece convencer todo mundo em toda parte, embora pareça óbvio que, se fosse verdadeiro, nem a administração da justiça, nem a historiografia jamais seriam possíveis.” (ARENDT, 2021, p. 319).
Dr. Felipe Figueira
Felipe Figueira é doutor em Educação e pós-doutor em História. Professor de História e Pedagogia no Instituto Federal do Paraná (IFPR) Campus Paranavaí.