Capitão América: Admirável Mundo Novo
Filmes de super-heróis já foram uma mina de ouro para os grandes estúdios, sobretudo para a Marvel/Disney, que reinou soberana nesse nicho na última década. Entretanto, tudo que é demais enjoa, e, recentemente, principalmente no período pós-pandêmico, temos assistido ao interesse do grande público migrar para outros tipos de filmes. Tudo bem que ainda existe um grande número de fãs que consomem avidamente esse tipo de entretenimento, porém nada se compara aos tempos áureos, quando havia grande especulação, ansiedade, imensas filas e milhões de pessoas ansiosas para entrar em uma sala de cinema e assistir ao mais novo filme dos Vingadores. Aos poucos, a Marvel e, mais recentemente, também a DC/Warner tomaram decisões mais assertivas nesse ramo, tentando consolidá-lo na indústria cinematográfica como algo constante e lucrativo. Por isso, o filme destaque da coluna nesta semana será Capitão América: Admirável Mundo Novo, que acabou de estrear. Essa é uma trama política repleta de ação, construída com a segurança de quem sabe que um bom filme de herói/ação pode ser extremamente lucrativo.
Vamos contextualizar um pouco mais esse panorama indicado acima. Nos últimos anos, a Marvel passou por uma espécie de crise de identidade. Depois de encerrar a grandiosa Saga do Infinito, o estúdio tentou se reinventar, explorando gêneros diversos e experimentando formatos. Porém, os resultados foram irregulares, e a Fase 4 ficou marcada mais por tropeços do que por acertos. Diante desse cenário, Capitão América: Admirável Mundo Novo chega aos cinemas como um retorno às raízes, uma tentativa de reencontrar o brilho dos tempos áureos do MCU. Mas será que o filme consegue equilibrar tradição e inovação?
Dessa vez, o escudo está nas mãos de Sam Wilson, interpretado por Anthony Mackie, que assumiu o manto após os eventos de Vingadores: Ultimato e da série Falcão e o Soldado Invernal (excelente série e disponível no Disney+). Diferente de Steve Rogers, Sam não tem o soro do supersoldado ou habilidades sobre-humanas. Ele é apenas um homem comum – com um traje de vibranium e asas, é claro –, mas essa limitação é justamente o que torna sua jornada mais interessante. O filme acerta ao explorar o que significa ser o Capitão América sem depender de poderes extraordinários. Além do mais, a escolha de entregar o manto, que representa o idealismo americano, a um homem de origem afrodescendente é um grande acerto e algo completamente alinhado à contemporaneidade.
A trama gira em torno de uma conspiração internacional envolvendo o roubo de Adamantium refinado, um material valioso que chama a atenção de diversas facções. Para os fãs mais atentos, a palavra Adamantium provavelmente ascendeu uma luz de alerta. Esse é o mesmo material que compõe o indestrutível esqueleto do venerado X-Men Wolverine, ou seja, Capitão América: Admirável Mundo Novo está realizando o importante papel de dar os primeiros passos para a esperada introdução dos mutantes X-Men no MCU. Voltando à trama! No centro do conflito está a Sociedade da Serpente, uma organização criminosa liderada pelo enigmático Coral, interpretado pelo sempre brilhante Giancarlo Esposito. O ator, conhecido por seus papéis de vilões magnéticos na TV, entrega um antagonista intrigante, mas que poderia ter sido melhor desenvolvido. Seu personagem tem presença, mas carece de motivações mais aprofundadas.
Harrison Ford faz sua estreia no MCU como o novo presidente dos Estados Unidos, Thaddeus “Thunderbolt” Ross. Sem o tradicional bigode do personagem, Ford molda sua própria versão do general, adicionando um toque de imponência e pragmatismo ao papel. Sua dinâmica com Sam Wilson é um dos pontos altos do filme, marcada por uma relação de respeito mútuo, mas também por uma sutil tensão de egos. O veterano ator entrega uma performance sólida, trazendo credibilidade ao novo status de Ross como líder político.
Outro destaque positivo é a relação entre Sam e Joaquin Torres, papel de Danny Ramirez, o novo Falcão. A química entre os dois atores funciona bem, e a dinâmica de mestre e aprendiz adiciona um frescor à narrativa. É interessante ver como o filme investe nessa parceria, construindo um laço que pode se fortalecer nos próximos capítulos do MCU.
O tom do longa lembra bastante os filmes anteriores do Capitão América, especialmente O Soldado Invernal. Há um clima de thriller político permeando a história, mas o roteiro não se aprofunda tanto nesse aspecto. O mistério em torno do Adamantium e das conspirações governamentais poderia ter sido melhor trabalhado, mas acaba ficando em segundo plano diante das cenas de ação. E, falando nelas, esse é um dos pontos onde o filme brilha.
As sequências de luta são bem coreografadas e fogem do excesso de efeitos visuais que dominou outros filmes recentes da Marvel. Aqui, a ação é mais física, mais crua, e ver Sam Wilson enfrentando inimigos de igual para igual – sem recorrer a superpoderes – torna as batalhas mais envolventes. O uso do escudo, combinado com as asas do novo Capitão, cria combates visualmente interessantes, remetendo aos quadrinhos de forma inteligente.
Por outro lado, nem tudo funciona tão bem. A introdução do Hulk Vermelho, agora interpretado por Harrison Ford, parece deslocada dentro da trama. Embora seja interessante ver o personagem ganhando espaço, a sua presença acaba desviando o foco do filme, que se propunha a ser uma história do Capitão América. O resultado é uma sensação de que o longa tenta abraçar muitas subtramas ao mesmo tempo, o que dilui o impacto de algumas delas.
Outro problema está na construção dos vilões. Além de Coral, temos o retorno de Tim Blake Nelson como Samuel Sterns, o Líder. O personagem já havia sido apresentado pela Marvel no cinema em O Incrível Hulk, de 2008 (aquele em em que o protagonista era Edward Norton), mas sua presença aqui é tão breve que parece mais um aceno nostálgico do que uma peça essencial da narrativa. A Sociedade da Serpente, por sua vez, tem um visual interessante, mas não representa uma ameaça memorável. É um desperdício de potencial, considerando que o MCU já entregou antagonistas muito mais complexos no passado.
Os efeitos visuais também oscilam. Se por um lado temos boas coreografias e cenas de luta bem filmadas, por outro, algumas explosões e a coloração do filme deixam a desejar. O fato do filme insistir nos tons mais pastéis tiram um pouco da identidade vibrante que se espera de um filme da Marvel. A batalha final, por exemplo, apesar de grandiosa, acaba visualmente apagada, algo que pode gerar a sensação de perda de impacto junto ao público.
Por que ver esse filme? Capitão América: Admirável Mundo Novo é um filme que entrega uma experiência divertida, mas sem grandes surpresas. Ele não reinventa a fórmula do MCU, mas também não comete os mesmos erros de algumas produções recentes do estúdio. É uma aventura sólida, com boas cenas de ação e um protagonista carismático, mas que poderia ter sido mais ousada em sua abordagem política e na construção de seus vilões. Se você busca um filme com entretenimento leve, que funcione bem com um balde de pipoca na mão, essa nova aventura do Capitão América cumpre seu papel. No entanto, para aqueles que esperavam um capítulo revolucionário no MCU, como eu, talvez fique a sensação de que este Admirável Mundo Novo ainda não é tão admirável assim. Boa sessão!