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Um procedimento piedoso


Por: Fernando Razente
Data: 01/02/2022
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É comumente aceita a alegação de que a verdadeira ciência não se baseia em nada que seja de caráter dogmático. A ciência é antidogma. Seria essa uma alegação verdadeira? Na coluna de hoje, gostaria de expor, em primeiro lugar, o conceito de dogma e em seguida demonstrar como existem dogmas no empreendimento científico e não somente na religião. 

Por fim, ressaltar como a existência de dogmas na ciência e a história de muitas falhas nas teorias científicas, devem influenciar na maneira como cristãos devem proceder para com as alegações da ciência contra a religião ou sobre qualquer outro tema. Minha conclusão, como se verá, é que o cristão sábio não deve ser precipitado em aceitar ou negar qualquer doutrina científica sem antes uma profunda consideração racional. Como ensina a sabedoria bíblica: “Não é bom proceder sem refletir, e peca quem é precipitado.” (Pv 19.12). 

Afinal, o que é dogma? Segundo Louis Berkhof, a palavra “[...] ‘dogma’ se deriva do termo grego dokein, o qual, na expressão dokei moi significava não só ‘parece-me’ ou ‘agrada-me’, mas também ‘determinei definitivamente algo de modo que para mim é fato estabelecido’.”  Em outras palavras, dogma é o resultado da ação de alguém acreditar em algo mediante sua avaliação pessoal (ou até mesmo comunitária) e considerar esse algo como "definitivamente estabelecido”, ou seja, que não deve ser contestado. 

Neste sentido, o dogma é visto como algo a ser rejeitado pela mente científica, pois trata-se de uma barreira à liberdade exigida para a investigação. Como declarou o físico americano Julius Robert Oppenheimer (1904-1967): “Não deve haver nenhuma barreira à liberdade de investigação. Não há lugar para o dogma na ciência.”

Concordo com Oppenheimer que o dogma (dependendo de qual) pode ser uma barreira para o conhecimento científico, mas por outro lado, até quando a ciência não é ela mesma muito dogmática em algumas questões? Não podemos deixar de considerar aqui como também é perigoso quando cientistas — desejosos por estabelecer uma doutrina insuperável — tornam estranhas teorias em uma verdade “definitivamente estabelecida”; e assim, formam dogmas inquestionáveis na ciência. 

O caso mais clássico de dogma científico que conheço é do próprio evolucionismo, que foi (e ainda é) considerado pela comunidade científica como a teoria-prova da origem do ser humano. Todavia, o que poucos parecem saber é que o evolucionismo já foi revisado por tantas vezes que alguns renomados bioquímicos e geneticistas já sugeriram sua crise ou completa falência.  Ainda assim, esses questionamentos são silenciados para preservar o dogma da evolução das espécies.

De fato, não é incomum encontrar outras inúmeras teorias que são aceitas e preservadas sem nenhum questionamento no âmbito científico, mesmo quando as novas descobertas exigem mudanças. Na verdade, as grandes transformações nos paradigmas científicos, muito bem mapeadas no clássico A Estrutura das Revoluções Científicas de Thomas Samuel Kuhn, atestam que em momentos de desintegração de alguma teoria tradicional de uma disciplina — devido a uma nova descoberta — forçando a comunidade de profissionais a ela ligados a reformular o conjunto de compromissos em que se baseia a prática dessa ciência, a reação geralmente é revolta e indignação. 

O cientista tenta ignorar a natureza e realidade da descoberta que sugere uma nova forma de explicar as coisas. Ele cala a nova descoberta ou cria um autoengano para si mesmo de que é falsa. Em outras palavras, ele cria um dogma e depois vai a público dizer que as novas descobertas se tratam de  dados falsificados, e que sua teoria é uma “verdade verdadeira”.

Por isso, não poucos amigos cristãos nutrem uma preocupação excessiva com alguns argumentos científicos contra a religião ou a fé da maneira como esses argumentos são defendidos como verdades incontestáveis. Mas será que são mesmo? Esse pânico diante de alguma teoria naturalista é mesmo necessário? Acredito que não, exatamente pela maneira como a ciência é dogmática em muitos temas. Muitas informações científicas que são anunciadas em jornais como uma verdade “definitivamente estabelecida”, pode ser, com grande possibilidade, mais um dogma abraçado por pesquisadores ou por uma comunidade de pesquisadores com compromissos ideológicos. 

Portanto, meu conselho a você cristão é: cautela. O teólogo, filósofo e pastor Francis Schaeffer certa vez disse sabiamente que quando encaramos “[...] problemas aparentes entre as teorias científicas atuais e o ensino da Bíblia, a primeira regra é não entrar em pânico, como se a teoria científica sempre fosse correta. A história da ciência, incluindo a ciência em nossos próprios dias, não raro foi bastante dogmática sobre teorias mais tarde descartadas. Dessa forma, não há razão inerente para a aceitação imediata de qualquer teoria científica atual [...] Quando nos depararmos com um problema, devemos separar um tempo como pessoas reflexivas [...] devemos gastar tempo ponderando sobre a questão.”  

Em resumo, não devemos aceitar de pronto as alegações que advém de centros acadêmicos, laboratórios ou agências de informação científica; mas, por outro lado, também não devemos deixar de considerar o que lemos como fazem os dogmáticos irracionais. É necessário um procedimento piedoso e sério, de ponderar e analisar, calma e pacientemente, aquilo que lemos ou ouvimos, até chegar a uma conclusão, pois “[...] o longânimo é grande em entendimento” (Pv 14.29). 

 

1. BERKHOF, Louis. História das Doutrinas Cristãs. São Paulo: PES, 2015. p. 15.

2. Cf. BEHE, Michael J. A Caixa-Preta de Darwin; DENTON, Michael. Evolution: A Theory in Crisis; MEYER, Stephen C. Darwin's Doubt: The Explosive Origin of Animal Life and the Case for Intelligent Design.

3. SCHAEFFER, Francis. Nenhum conflito final: a Bíblia sem erro em tudo o que ela afirma. Brasília, DF: Editora Monergismo, 2018. p. 33.

 

Fernando Razente

Amante de História, atuante com comunicação e mídia, leitor voraz e escritor de artigos de opinião e matérias jornalísticas.


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