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O mito da democracia racial


Por: Alex Fernandes França
Data: 05/06/2020
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A morte do ex-segurança George Floyd, covardemente sufocado pelos joelhos de um policial branco em Minneapolis, nos Estados Unidos desencadeou uma onda de protestos mundo afora.   O homem tinha 40 anos e a cena grotesca foi filmada e exibida exaustivamente.  Mesmo ante os apelos de que não conseguia respirar, Floyd acabou tendo suas forças esgotadas até dar seu último fôlego de vida. O episódio trouxe à tona um assunto que sempre esteve entranhado no seio da sociedade e que por vezes acabou sendo mascarado pela convivência harmoniosa, de forma aparente, entre pessoas de cores e raças diferentes. 

O sociólogo brasileiro Florestan Fernandes (1920-1995) defendeu que no Brasil, a democracia racial, ou seja, a igualdade de condições diversas entre as pessoas, independentemente de cor, raça ou etnia não existe, ou seja, trata-se de um mito. A ideia da existência da democracia racial ganhou força na famosa obra Casa-grande e Senzala, de 1933 do escritor Gilberto Freyre (1900-1987).    Muito embora a expressão nunca tenha sido utilizada pelo autor em sua obra mais célebre, ele começa a adotá-la em publicações posteriores e tal máxima passa então a ser difundida também por outros estudiosos que acabaram por popularizar a ideia. 

Com efeito, o latifúndio e a escravidão que existiram no Brasil se entrelaçam com a relação Casa-grande/senzala; uma representando o grande poderio do patriarcalismo e a outra a eterna dependência escravista cujas mazelas se arrastam até os dias atuais. Difícil defender o pensamento de meritocracia em uma sociedade tão plural e por vezes segregada pelos desmandos e desigualdades sociais de ordem histórico-sociológica.  

O patriarcalismo, mesmo depois de abolida a escravidão no Brasil, segue influenciando condutas, discursos e atitudes morais em nosso país. A segregação persiste, ainda que veladamente e segue na esteira da aparente democracia racial. 

Para estudiosos seguidores da linha de pensamento de Gilberto Freyre, no Brasil, diferentemente do que acontece em outros países, como por exemplo nos Estados Unidos da América,  não se vê o outro a partir do conceito de raça, ou seja, segundo eles, não existe, portanto preconceitos raciais.

 Florestan Fernandes, por sua vez, entende que no caso do Brasil, mesmo após a abolição da escravatura, tardiamente ocorrida em 13 de maio de 1888, persiste a desigualdade social entre pessoas negras e brancas no seio da sociedade e que a “democracia racial” na verdade é utópica ou seja, não passa de mero mito. Segundo ele, as transformações econômicas que ocorreram no Brasil, no início do século XX, beneficiaram a “raça dominante”, que ocupava posições importantes na estrutura de poder político e econômico e, em extensão menor, os imigrantes europeus.

As desigualdades raciais no Brasil possuem múltiplas dimensões que vão muito além de uma eventual convivência harmoniosa entre seres de diferentes origens. Nelas estão abarcadas raízes sociológicas profundas: rendimentos, empregos, oportunidades, acesso à educação de qualidade, locais de moradia, por isso se faz necessário cada vez mais o aprimoramento de políticas sociais de enfrentamento a estas e tantas outras demandas. É por meio de políticas de inclusões que se busca ampliar o acesso às populações, sobretudo às que se encontram em situação de vulnerabilidade social. Só para se ter uma ideia, um trabalhador negro recebe, em média, 50% menos que um branco na mesma função e com a mesma formação técnica. Recente relatório do IBGE mostrou que o salário médio de um negro no Brasil era de R$ 1.545 contra R$ 2.924 dos brancos.

Políticas afirmativas tem sido adotadas em nosso país no sentido de  romper com ideário de reparação histórica em que se busca apenas recompensar um passado discriminatório. Devem caminhar no sentido de corrigir distorções no presente, proporcionando igualdade de condições para todos. Todos!

Alex Fernandes França


Anuncie com Jornal Noroeste
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