Midiaserável (poema do livro “Midiaserável”, Editora Patuá, 2020)
I
Embora cidadezinhas-províncias
onde ainda galos é tic-tac e fogão
(de barro) a lenha
aquece rio riachos
antropófagas, automatizam o vi-
ver a vida-relógio;
se nem todos libertam as razões
como logo existir
e aspirar o pasmo
à margem da íris o nascer do sol
às vezes não nasce
acentua-se poente
II
pôr de caos: sono
precipício, acordar poroso. Súbito
a costurar a carne
corpo às 5h: a erguer-se o sistema
a pesar, não os pormenores do sol
e da indigestão, do
ar impróprio e das
artérias com suas vísceras: aclives
declives e enclaves;
sofre o tal homematéria, pernoites
no inabitável sofre-
dor útero invertido
III
pôr de caos: eletro-
encefalograma para os inconclusos
do agora (o ontem)
corpo às 6h: a língua a fala esvaída
a pesar, não os reversos do manhã
e dos jejuns (do só)
por multidões e do
fluxo com suas urgências: lapsos
relapsos, colapsos;
sobre o tal homemporâneo, noites
(noitadas e acasos)
e horas proteladas
IV
às 7h30min: por extenso ou digital
apesar, o miserável sem sentir-se
à vista se prende
a prazo o infarto
a contínua morte semanal: a suar
o suor o sangue;
sobretudo, homem-mídia quando
em bolso furado
põe o sal do mês
à mesa da família que acorda pôr
do sol natimorto,
corpo estatística.
Delalves Costa (13 de dezembro, 1981 – Osório, RS), escritor e poeta com vários livros editados e publicações em plataformas literárias impressas e digitais. É sócio-fundador e membro honorário da Academia dos Escritores do Litoral Norte (AELN/RS) e sócio da Associação Gaúcha de Escritores (AGES).
Dr. Felipe Figueira
Felipe Figueira é doutor em Educação e pós-doutor em História. Professor de História e Pedagogia no Instituto Federal do Paraná (IFPR) Campus Paranavaí.