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Hipervelocidade e a Temporalidade Atual


Por: Rogério Luís da Rocha Seixas
Data: 14/08/2020
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Começo mais uma exposição de ideias, formulando algumas questões: Qual o ritmo de velocidade de nossa existência atual? Nosso cotidiano, apresenta-se suficiente para o tempo que necessitamos e a velocidade que imprimimos em nossas atividades? Estamos em um modo de velocidade mais lenta ou cada vez mais acelerada? Qual a relação entre a velocidade de nossa existência com o nosso tempo de ser? Perguntas que parecem tolas ou vazias, mas que como sempre faço, convido aos amigos e amigas que por gentileza, acompanham às exposições de ideias, para fazer uma reflexão que precisa levar em conta a velocidade de nossa existência contemporânea e o tempo que dispomos na trajetória atual.  Quando conversamos com pessoas de gerações anteriores, estas passam sempre a percepção de que as coisas “corriam mais devagar”. Uma velocidade menor no dia a dia e por consequência, o tempo próprio experimentado por aquela geração, passava também mais lentamente ou assim o percebiam. Em nossa temporalidade contemporânea, a percepção de tempo torna-se ao contrário excessivamente rápida e quantitativamente insuficiente para nossas atividades. Penso eu que tal percepção deve-se a nossa necessidade de muito produzir e ao mesmo tempo consumir, contudo a velocidade dos avanços tecnológicos nos levam a perceber que o tempo se encurta e as informações, além das tarefas tornam-se mais constantes. Destaco um pensador, Paul Virilio se concentrou ao extremo sobre os impactos da velocidade da tecnologia na cultura e a percepção humana sobre a existência do modo de ser que passamos a levar. Virilio faz uma releitura do mundo, da história do Ocidente, a partir da perspectiva de que a lógica da corrida se tornou a referência absoluta, equivalente geral, a velocidade substitui a riqueza. A velocidade é considerada como um valor, a partir do advento da revolução tecnocientífica. Virilio diagnostica a sociedade contemporânea como uma “dromocracia”, um tipo de governo da velocidade por onde se tem a “entrada no mundo do equivalente-velocidade ao equivalente-riqueza” (VIRILIO e LOTRINGER, 1984: 48). Significa dizer, que a velocidade de produção e tempo de circulação de capital, intensifica-se e ditando o modo de nossas condutas. Há uma forte conotação de reflexão política nesta descrição, pois nos vemos cada vez mais despolitizados. Simultaneamente, perde-se o lugar da sedentariedade do não-movimento, mas se estabelece a sedentariedade no “instante da velocidade absoluta” como forma de redução do mundo, a um único lugar com identidade unitária. Talvez possamos vislumbrar a descrição de um conjunto de corpos interligados como um corpo único, algo almejado ou idealizado pela globalização tecnológica. Neste contexto, o tempo se esvai de modo tal que nos perdemos em seu escoamento. Ao mesmo tempo, entramos na angústia de produzir mais. Consumir mais. O desejo de ter mais tempo e de fato, as tecnologias no campo biomédico nos permitem hoje maior longevidade. Por sua vez, o “lugar situado” desloca-se pelas redes sociais, que nos capacitam a ultrapassar limitações de espaço e tempo, que a velocidade atual nos impõe. Contudo, há sempre custos, pois diferente de Virilio que não acompanhou a explosão das tecnociências de forma tão intensiva como tem ocorrido, o tempo nos parece insuficiente para viver mais plenamente, interferindo inclusive em nossa sociabilidade, imprimindo um modo der ser quase que maquinal.  A velocidade percebida pelo autor, penso eu, transformou-se em uma “Hipervelocidade” que ganha volume tamanho, sufocando mais e mais a nossa temporalidade atual, mas que habituados com esse ritmo, quase não nos damos conta desta tensão, que recrudesce devido aos efeitos da pandemia do Coronavírus.  Teremos que aprender a lidar mais ainda com a condução de nossa temporalidade e o controle de nossa velocidade, se ainda for possível. Afinal, quanto maior a velocidade, menos tempo para sermos nós mesmos e pensarmos talvez em questões essenciais como a democracia e a liberdade.

VIRILIO, Paul e LOTRINGER, Sylvere. Guerra Pura: a militarização do cotidiano. Tradução de Elza Miné e Laymert Garcia dos Santos. São Paulo: Brasiliense, 1984. 

VIRILIO, Paul. Velocidade e Política. Tradução de Celso Mauro Paciornik e prefácio de Laymert Garcia dos Santos. São Paulo: Estação Liberdade, 1996.

Rogério Luís da Rocha Seixas

Rogério Luís da Rocha Seixas é Biólogo e Filósofo Docente em Filosofia, Direitos Humanos e Racismo Pesquisador do Grupo Bildung/IFPR e-mail: rogeriosrjb@gmail.com


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