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Existe acolhimento nos hospitais para as pessoas que tentam suicídio?


Por: Simony Ornellas Thomazini
Data: 13/09/2019
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Qual a chance de um suicida que dá entrada em um hospital sofrer maus tratos, preconceito, falta de atenção e cuidados?

Infelizmente a chance disso acontecer é imensa e é grave. E é sobre essa discussão que quero trazer aqui para vocês, leitores. 

Existe um estigma em nossa sociedade em torno do suicídio, e é muito comum presenciar as reações da equipe médica com “brincadeiras” de mau gosto, e procedimentos agressivos. 

Quando uma pessoa que atenta contra a própria vida dá entrada no hospital, muitas vezes a equipe médica e de enfermagem que a atende não possuem a capacitação necessária para realizar o acolhimento, ou um tratamento digno a qualquer ser humano.

Para algumas pessoas da área da saúde, essas pessoas não merecem acolhimento, atenção e cuidado porque segundo elas, estão ali para cuidarem de quem quer viver, e um suicida é alguém que só “dá trabalho”, não merece atenção, além de gerar custos para o plano de saúde. 

Porém, a equipe esquece-se que essa pessoa também está doente, que depressão é um problema grave, mas a doença da alma não aparece em nenhum exame. 

É claro que não podemos generalizar. Não estou afirmando que todos tratam dessa forma, há equipes muito bem capacitadas que oferecem um tratamento humanizado.

No entanto, o mínimo que esperamos de um profissional da saúde é que ele acolha sem julgar, e dispense seus valores morais em relação às pessoas que atentam contra a própria vida.

Se um profissional que trabalha com indivíduos que estão em seus momentos mais frágeis, pensam que depressão é frescura, falta de Deus, ou esses clichês que ouvimos muito por aí, imaginem uma pessoa que não tem noção alguma disso?

As equipes não precisam ser especialistas em suicídio, mas um tratamento humanizado e digno é direito para qualquer ser humano. 

O artigo “Tentativas de suicídio e o acolhimento nos serviços de urgência: a percepção de quem tenta” publicado em 2013, destaca alguns relatos que trago aqui como importante contribuição a respeito da nossa discussão.

Foram entrevistados pelos autores 28 mulheres com histórico de tentativa de suicídio que haviam sido referenciados num serviço de urgência no município de Barbacena, em Minas Gerais. 

 

Alguns dos relatos das entrevistadas:

“No hospital eu lembro que o médico chegou perto de mim, bateu no meu ombro, falou que eu não tinha nada, que eu era uma moça bonita, pra viver minha vida, que era pra arrumar um namorado”.

“A reação das pessoas, dos médicos, quando eu tomava remédio e ia pro hospital, sempre que eu chegava, as enfermeiras e o médico falavam ‘tem juízo não? vaso ruim não quebra, entra na frente de um trem […] remédio não mata não, remédio melhora”.

“As enfermeiras falavam ´toma chumbinho, água de bateria, não adianta vir pra cá, tomar remédio, só dá trabalho pra gente´. Eu me sentia um rato quando tentava, quando elas me falavam ficava pior ainda. Por que elas não falaram que eu precisava era de um psiquiatra? Elas falavam “vai pra casa e dorme bastante, isso não é nada, isso vai passar”.

Infelizmente essas falas são uma realidade para quem trabalha na área de prevenção e posvenção do suicídio. É importante ressaltar que os resultados não podem ser generalizados, uma vez que existem muitos serviços de saúde que sensibilizam os profissionais para o acolhimento mais humanizado para essas pessoas que chegaram em um nível de sofrimento tão intenso a ponto de desistir da vida. 

Por fim, destaco também uma falha nos cursos na área de saúde que não abordam o comportamento do suicida, com isso, o senso comum acaba adentrando-se nos hospitais chegando até a essas pessoas e suas famílias que sofrem ainda mais com esses maus tratos por parte da equipe. 

Por isso, fica aqui o alerta: Suicídio não é frescura, não é falta de Deus, não é para chamar a atenção, e embora a dor da alma não apareça em nenhum exame, essas pessoas merecem o mesmo ou maior cuidado e acolhimento que qualquer outro ser humano. 

É preciso quebrar o tabu sobre o suicídio, falarmos sobre a posvenção, e desmitificar a depressão, inclusive, na área médica. 

Simony Ornellas Thomazini


Anuncie com Jornal Noroeste
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