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Entre sapataria e museu: Sapataria Fonseca, de Maringá


Por: Especial para JN
Data: 02/03/2022
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Meus sapatos têm entre 8 e 10 anos e costumo utilizá-los para ir à igreja. Sabendo que em Maringá um irmão era sapateiro há mais de 50 anos, resolvi levar meus calçados para alguns reparos, ao mesmo tempo em que poderia lhe perguntar mais sobre essa profissão, já que estaria diante de alguém muito experiente. Mas, mal eu imaginava que, ao entrar na Sapataria Fonseca, de João Fonseca, em Maringá, eu entraria em outro universo: um museu. Literalmente: um museu. Em sua sapataria, irmão João guarda verdadeiras relíquias, todas bem protegidas, mas expostas ao público, que vão desde máquinas de costura do século XIX até telégrafos, máquina de fazer perfume, moedas antigas (brasileiras e de outros países), câmeras e telefones do início do século XX e projéteis utilizados na Segunda Guerra Mundial.

Surpreso, perguntei para o irmão João Fonseca como tudo aquilo começou, como que a sua sapataria se tornou também um museu. Sem ir direto ao ponto, ele, à semelhança de um historiador, fez um resgate de sua própria história. Ele me disse que começou a aprender o ofício com 12 anos de idade e que em 2022 ultrapassará os 60 anos de profissão.

No início, em 1962, o hoje experiente sapateiro, na época com 12 anos, foi morar em Ivaiporã, com o tio, que lhe ensinou os primeiros rudimentos. Depois, retornou a Paranavaí para morar com os pais e foi nessa cidade que recebeu os primeiros pedidos de consertos, até que aprendeu o ofício. Já em Maringá, ele se encontra desde 1989. Segundo declarou: “Se Deus quiser, quero trabalhar de sapateiro até morrer.” O amor pela profissão é tão grande que ele ensinou cinco filhos a trabalhar de sapateiro, sendo que, atualmente, apenas um, que se formou em Direito, que não exerce a tradicional profissão familiar.

E como surgiu a sapataria-museu?

Em 2009, irmão João foi à Itália visitar um de seus filhos e lá foi a um museu dedicado à Primeira Guerra Mundial. Gostando da experiência, ao voltar ao Brasil resolveu colocar, em seu ambiente de trabalho, algumas peças antigas, e quem ia à sapataria, gostando da novidade, passou a doar alguns objetos também. No local há um caderno em que cada item doado é devidamente anotado. A proporção se tornou tão grande, com mais de 600 objetos, que, segundo o sapateiro, os canais de televisão foram diversas vezes filmar, cerca de 20 vezes, fora as reportagens de jornais, e algumas universidades inclusive enviaram acadêmicos para estudá-la.

Eu admito que ter levado meus sapatos para o conserto foi uma das melhores experiências que tive em Maringá. Entrei para algo comum e saí com uma experiência incomum. Em uma de nossas conversas, perguntei ao irmão João Fonseca a importância que ele atribui à história e eis a resposta: “Preservar a história é coisa importante, pois tanto chegam pessoas idosas como os pais trazem os filhos e mostram as peças antigas e cada um tem uma história para contar. Nisso há as recordações e alguns até choram de tanta saudade do passado.”

Eu posso afirmar, diante de várias experiências, que história é mais do que uma disciplina que se deixa na escola ou na universidade tão logo se é aprovado. Gostar de história é um modo de vida que nos permite olhar a existência de outra forma. É tanto um modo de lembrar o que outros querem esquecer, como diz o grande historiador inglês Peter Burke, como um modo de se vincular à vida de modo mais forte.

Irmão João em sua máquina de costura centenária, que funciona perfeitamente

 

Endereço: 

Av. Osíres Stenghel Guimarães, 870 - Conj. Hab. Karina, Maringá - PR, 87047-200


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