Restauração ecológica busca aumentar a segurança hídrica e melhorar a renda de agricultores na bacia do Rio Miringuava
Recuperação da vegetação em áreas degradadas e alternativas para a produção agroflorestal são caminhos para melhorar a qualidade de vida na região
Movimento Viva Água deve restaurar 10 hectares em áreas estratégicas de propriedades rurais até o final deste ano
O plantio de mais de 1.400 mudas de mata nativa em uma propriedade rural em São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba (PR), marcou o início da fase de restauração florestal na Bacia do Rio Miringuava. A ação é parte do movimento Viva Água, que busca a conservação e a recuperação de áreas estratégicas da bacia, como nascentes, margens de rios e seus afluentes, com o objetivo contribuir com a segurança hídrica e amenizar impactos gerados por períodos de estiagem e chuva excessiva. Além disso, a restauração deve aumentar a renda de agricultores familiares da região por meio da diversificação da produção, criação de novas oportunidades de negócios e aumento da produtividade nas propriedades. Até o final do ano, 10 hectares de áreas degradadas em pequenas propriedades rurais devem ser recuperados.
“A restauração da cobertura vegetal vai trazer inúmeros benefícios aos agricultores e a toda a comunidade. Um solo bem cuidado funciona como um filtro que reduz a quantidade de sedimentos que chega ao rio, deixando a água mais limpa e reduzindo assim os custos com o tratamento da água. O solo coberto com vegetação funciona como uma esponja, que absorve a água e libera aos poucos, o que garante a disponibilidade desse recurso por mais tempo para todos”, explica Guilherme Karam, gerente de Economia da Biodiversidade da Fundação Grupo Boticário, idealizadora do Movimento Viva Água.
O projeto-piloto – conduzido pela Iniciativa Verde e pela Sociedade Chauá – está sendo realizado na propriedade da agricultora Luciane Krupczak, na comunidade Avencal, em São José dos Pinhais. A proposta é otimizar o uso da terra, integrando mata nativa com espécies que o produtor consiga comercializar. “Fiquei esperançosa com a proposta de restauração. Nossa comunidade é formada por agricultores familiares e é muito bom saber que podemos melhorar a nossa renda e ainda contribuir com o meio ambiente”, afirma Luciane, que nasceu na região e vive há 27 anos na mesma propriedade.
Luciana cedeu pouco mais de um hectare de sua propriedade para o projeto de restauração. Nos quatro hectares restantes, ela se dedica à produção de hortaliças e milho, além de extrair uma pequena quantidade de mel. A integração entre agricultura e floresta deve inserir a erva-mate no terreno e, com o tempo, substituir o cultivo do milho por outras opções que possam manter ou até melhorar a renda.
O incremento na produção de mel deve ser um dos benefícios econômicos no médio prazo. “Foram escolhidas espécies nativas que florescem no inverno. Com isso, é possível beneficiar espécies de abelhas que enfrentam mais restrições de recursos no período mais frio do ano. Espécies como araçá-vermelho, ipê-amarelo, entre outras, serão utilizadas para ampliar o pasto apícola”, conta Karam, lembrando que a restauração promovida pelo Viva Água não tem custo aos produtores.
Luciana explica que o plano para a restauração foi realizado de acordo com suas necessidades e interesses, a partir de diagnóstico elaborado pela equipe do movimento Viva Água. “É muito bom contar com essa assistência e com o apoio de profissionais especializados”, ressalta a agricultora. As próximas propriedades escolhidas para a restauração na região também terão assessoria personalizada. “É importante entender a realidade de cada produtor, a área disponível para restauração e a melhor forma de integrar a floresta com o tipo de cultura existente. A partir desse diagnóstico, podemos escolher os tipos de mudas nativas utilizadas, os sistemas de plantio e a manutenção necessária”, explica Karam.
Além das mudas inseridas em áreas degradadas, o projeto contempla a inserção de espécies nativas para enriquecimento da biodiversidade em partes dos terrenos onde já existe vegetação e a integração da mata nativa com espécies de valor comercial, como a erva-mate.
Em outra frente, o Viva Água está desenvolvendo um mecanismo de vendas de crédito de carbono com os clientes do Programa Carbon Free para a aquisição de novas mudas e a manutenção da assistência aos produtores. Estudos estão em desenvolvimento para a projeção do estoque de carbono que as áreas recuperadas serão capazes de gerar a cada ano.
Mudanças climáticas
De acordo com estudo da pesquisadora Gabriela Goudard, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), chuvas extremas são históricas e recorrentes na bacia hidrográfica do Alto Iguaçu, na qual o Miringuava se constitui como uma sub-bacia, com potencial de causar impactos em áreas mais vulneráveis.
Com as mudanças climáticas, a tendência é de que episódios de chuvas intensas e estiagens severas sejam cada vez mais frequentes na região. Vale lembrar que, em 2020 e 2021, a região da Grande Curitiba registrou a maior crise hídrica dos últimos 100 anos. Fortemente afetada, a região do Miringuava sofreu com a falta de água tanto para o abastecimento público, quanto para a irrigação das lavouras. “Ter uma estratégia de gestão para esse recurso natural, vinculada à conservação de áreas naturais, não é apenas uma oportunidade, mas uma real necessidade para contribuir com a qualidade de vida da população e com o desenvolvimento econômico de toda a Grande Curitiba”, salienta Karam.
O gerente da Fundação Grupo Boticário ressalta ainda que o modelo de trabalho do Viva Água pode ser replicado em outras regiões do país. “Diversos estudos mostram a necessidade de recuperar a cobertura vegetal em áreas de manancial para garantir os recursos hídricos que tanto necessitamos. Portanto, diferentes regiões do Brasil precisam caminhar nessa direção”, analisa Karam.
Sobre o Viva Água
Idealizado pela Fundação Grupo Boticário, o Viva Água surgiu em 2019 com o objetivo de reunir atores estratégicos que atuam na Bacia do Rio Miringuava, um dos principais mananciais da Região Metropolitana de Curitiba. A partir de iniciativas de conservação da natureza e de empreendedorismo sustentável, o movimento promove ações que contemplam a recuperação da vegetação nas margens dos rios, a capacitação de produtores rurais em modelos de agricultura mais sustentável e o incentivo a atividades econômicas de impacto socioambiental positivo, como o turismo rural.
A Bacia do Miringuava beneficia diretamente cerca de 600 mil pessoas da Região Metropolitana de Curitiba, além de empresas e indústrias de diferentes portes e setores econômicos. A bacia também é um importante polo de produção agrícola, respondendo por 70% de toda a distribuição de hortifruti do município de São José dos Pinhais. Isso é possível graças a características como abundância de água – por ser uma região de manancial – e temperaturas amenas, permitindo o cultivo de frutas e verduras durante todo o ano.
Inspirado na experiência paranaense, o Viva Água também chegou à região hidrográfica da Baía de Guanabara em dezembro de 2021. O movimento pretende fortalecer a segurança hídrica em toda a região, que engloba 17 municípios, promover a adaptação às mudanças climáticas e fomentar o empreendedorismo sustentável.
Sobre a Fundação Grupo Boticário
Com 30 anos de história, a Fundação Grupo Boticário é uma das principais fundações empresariais do Brasil que atuam para proteger a natureza brasileira. A instituição atua para que a conservação da biodiversidade seja priorizada nos negócios e em políticas públicas e apoia ações que aproximem diferentes atores e mecanismos em busca de soluções para os principais desafios ambientais, sociais e econômicos. Protege duas áreas de Mata Atlântica e Cerrado – os biomas mais ameaçados do Brasil –, somando 11 mil hectares, o equivalente a 70 Parques do Ibirapuera. Com mais de 1,2 milhão de seguidores nas redes sociais, busca também aproximar a natureza do cotidiano das pessoas. A Fundação é fruto da inspiração de Miguel Krigsner, fundador de O Boticário e atual presidente do Conselho de Administração do Grupo Boticário. A instituição foi criada em 1990, dois anos antes da Rio-92 ou Cúpula da Terra, evento que foi um marco para a conservação ambiental mundial.