O silêncio que grita
Na semana passada, voltei com a coluna.
E comecei do começo — Machado de Assis. Literatura brasileira, casa, raiz.
Mas hoje, sigo adiante com um livro que está longe de ser clássico, mas tem feito barulho. Ou melhor: tem feito silêncio. A Paciente Silenciosa.
Lançado em 2019, esse thriller psicológico virou um fenômeno editorial — vendeu milhões, ficou meses nas listas de mais vendidos e conquistou até quem achava que já estava cansado de histórias com reviravoltas. E o mais curioso? O autor, Alex Michaelides, nunca tinha publicado um romance antes. Foi roteirista, estudou psicologia... e acabou acertando um suspense que parece ter saído de uma clínica de psicanálise com final de série da Netflix.
A trama gira em torno de Alicia Berenson, uma pintora bem-sucedida, casada, rica, bonita — e que um dia, do nada, mata o marido com cinco tiros no rosto. Depois disso, ela simplesmente para de falar. Não dá uma palavra. Nem para a polícia, nem para a terapeuta, nem para a família. Nada.
É aí que entra Theo Faber, o psicoterapeuta narrador da história. Ele se oferece para tratá-la — e, claro, para entender o que levou aquela mulher a um crime tão brutal... e a um silêncio tão absoluto.
O livro é escrito em capítulos curtos, viciantes, quase como se fosse um confessionário. O leitor vira cúmplice: quer descobrir o passado de Alicia, quer saber o que ela viu, o que sentiu, o que está escondendo. E quanto mais se lê, mais o tapete vai sendo puxado dos nossos pés.
O silêncio da paciente, aqui, não é apenas ausência de fala. É estratégia narrativa. É o que nos obriga a preencher os vazios com projeções, medos, hipóteses — como um bom thriller deve fazer.
E sim, o final tem uma reviravolta. Daquelas que dividem os leitores: uns acham brilhante; outros, forçado. Mas ninguém sai ileso. E isso, por si só, já é um bom sinal.
O que mais me interessa na leitura, no entanto, não é o assassinato em si, nem o “quem fez o quê”. É o que o livro revela sobre a maneira como olhamos para o trauma, o silêncio e as versões que contamos sobre nós mesmos.
A pergunta que fica não é só “por que Alicia não fala?”, mas: e nós? O que temos deixado de dizer?