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Natal: o modo mais realista de ver a vida


Por: Fernando Razente
Data: 23/12/2024
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“Não procure em cortes ou palácios

Nem em desenhos de cortinas reais –

Mas procura no estábulo, vê o teu Deus

Estendido sobre a palha.”

 

– William Billings (1746-1800), compositor americano. 

 

O Natal Escondido (Hidden Christmas) é o título do livro escrito em 2016 pelo falecido pastor presbiteriano Timothy Keller (1950-2023). Publicado no Brasil em 2017 pela Editora Vida Nova, a obra tem sido uma referência para reflexões neste período de Natal. Nesta ocasião, quero abordar com os leitores alguns importantes insights de Keller neste livro sobre o significado do Natal cristão.

Seria o Natal apenas uma celebração cultural ou um momento festivo, cuja mensagem principal é que juntos “conseguiremos construir um mundo de união e paz”?[1]  Bom, essa é a perspectiva predominante em nossa cultura secular, esvaziando o significado teológico e espiritual dessa celebração. Mas tal visão está biblicamente errada.

Keller desafia a percepção popular do Natal como simplesmente um feriado cheio de luzes, presentes e confraternizações. De modo perspicaz, o autor explora em seu livro o significado espiritual e pessoal da celebração do nascimento de Jesus e, como um exímio crítico cultural, consegue explorar as conexões do Natal com questões humanas existenciais e universais.

O Natal, segundo Keller, possui um caráter radical no que se refere a maneira como estamos acostumados a pensar sobre a capacidade humana e sobre a realidade. A história do nascimento de Jesus, biblicamente compreendida, ensina que Deus se encarnou, se submeteu às limitações do tempo da história, e desde seu nascimento viveu em circunstâncias de humildade e simplicidade.

Além disso, Deus se encarnou por uma razão: porque nós, seremos humanos pecadores dignos do inferno eterno, éramos (e somos) completamente incapazes de nos salvar por nossos próprios esforços. O Natal é luz em meio às trevas da humanidade. Por isso, “(...) Ele veio para tomar o nosso lugar, para pagar o preço por nosso pecado, para receber o que merecemos.”[2], diz Keller.

Esse ato milagroso da encarnação é, por Keller, conectado ao plano maior da redenção bíblica. O Natal não é um evento isolado; ele é, diz Keller, “(...) só o começo da história de como Deus veio nos salvar”.[3] Evidentemente, no enredo da redenção dos pecadores, iniciado por Deus no Éden – descrita em Gênesis 3.15 – o Natal já estava prometido naquela declaração divina de que do descendente da mulher nasceria aquele que finalmente esmagaria a cabeça da serpente (o diabo).[4] Essa promessa se cumpre no nascimento de Jesus, que realiza a salvação dos eleitos de Deus em sua vida, morte e ressurreição.

É interessante observar que Keller divide sua análise bíblica, histórica e cultural do Natal em tópicos que abordam diferentes temas: a pecaminosidade humana, a antiga promessa de um Salvador, a inclusão divina de pessoas simples e marginalizadas em seu plano redentivo e a resposta de fé e arrependimento de pecados que a encarnação exige.

Keller também mostra como o nascimento de Cristo é a resposta definitiva às necessidades mais profundas da humanidade, como culpa, medo, angústia, tristeza e morte. O Natal, diz Keller, veio de graça, para oferecer de graça aos pecadores que creem em Cristo a tão desejada paz, alegria[5], perdão e salvação que este mundo opulento, mas espiritualmente falido, não pode fornecer.

Outro ponto forte da obra é a relevância contemporânea de sua mensagem. Keller é conhecido como tendo sido um dos grandes críticos culturais e apologista cristão do século XXI. Com uma abordagem erudita, mas ao mesmo tempo simples e dinâmica, Keller demonstra como o Natal, quando compreendido em sua essência bíblica, desafia concepções filosóficas, idealistas e pessimistas, como o materialismo, o individualismo, o niilismo e as diversas manifestações de orgulho, soberba e sentimentalismo humano que frequentemente dominam o ethos da vida moderna.

A mensagem do Natal, neste sentido, é um verdadeiro choque de realidade e sobriedade em um mundo inebriado de falsas promessas e expectativas irreais sobre a vida. “O Natal portanto, é o modo menos sentimental e mais realista de se ver a vida.”[6], diz Keller. Por quê? Pois ele diz com franqueza que as coisas neste mundo vão muito mal mesmo; e que – diferente do que diz a filosofia antropocêntrica – não temos como curar ou salvar a nós mesmos. Contudo, há esperança, diz a mensagem do Natal. E essa esperança é aquela luz que resplandeceu sobre os que habitavam na terra da sombra da morte, isto é, Jesus Cristo, o Deus-Homem.

Creio que neste Natal, o livro “O Natal Escondido – a surpreendente verdade por trás do nascimento de Cristo” será de grande utilidade para você e sua família, querido leitor. A obra é um convite a resgatar o significado genuíno do Natal. Com uma escrita acessível e argumentos teologicamente sólidos, Timothy Keller o guiará a uma redescoberta da amplitude espiritual e cultural do Natal, deixando clara a radicalidade eterna do nascimento de Cristo.

Boa leitura, e um feliz Natal!

·         Fernando Razente é professor de Filosofia e Ciência da Religião no Centro Universitário São Camilo (SP) e das disciplinas de História, Filosofia, Sociologia e Cultura Religiosa no Colégio Coração de Jesus. É diácono ordenado da Igreja Presbiteriana do Brasil em Nova Esperança e coordenador de conteúdo da Associação Brasileira de Cristãos na Ciência, núcleo Maringá.



[1] KELLER, Timothy. O Natal Escondido. São Paulo: Vida Nova, 2017. p. 27.

[2] Ibidem, p. 38.

[3] Ibidem, p. 38.

[4] O texto de Gênesis 3.15 também é chamado por alguns teólogos de protoevangelium (latim) ou simplesmente protoevangelho. O termo técnico protoevangelium significa “primeiro evangelho” e é usado para explicar onde nas Escrituras ocorre o primeiro anúncio das boas novas de salvação. Em Gênesis 3.15 vemos a promessa de Deus a Adão e Eva – na qual eles deveriam crer – de que da semente da mulher viria o redentor, que destruiria as obras de Satanás, a antiga serpente. O evangelho de Jesus, segundo Berkhof, “(...) já foi ouvido na promessa materna, Gn 3.15”. In BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. São Paulo: Cultura Cristã, 2012. p. 259. No século XVI, teólogos puritanos, como o erudito John Owen, defendia que o protoevangelium consiste em que “(...) a totalidade da aliança da graça estava [ali] praticamente incluída” (OWEN, Theologoumena, in: Works, 17:135), sendo Gn 3.15, conforme o teólogo Dr. Joel Beeke, “(...) uma referência explícita a Cristo como aquele que com sua morte, restaurará a humanidade, tirando-a do pecado e da miséria.” In BEEKE, Joel. Teologia Puritana. São Paulo: Vida Nova, 2016. p. 389).

[5] “Natal significa alegria – ‘novas de grande alegria’.” in KELLER, Timothy. O Natal Escondido. São Paulo: Vida Nova, 2017. p. 169.

[6] Ibidem, p. 22-23.

Fernando Razente

Amante de História, atuante com comunicação e mídia, leitor voraz e escritor de artigos de opinião e matérias jornalísticas.


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