Provavelmente você já sentiu muito ódio de alguém. Mas, e se eu te disser que essa pessoa por quem você já odiou ou ainda odeia, não é necessariamente má?
Não importa o quão ela supostamente fez algo que você considera errado, esse ódio é problema seu. Sim, essa doeu!
Charles Bukowski, escritor e poeta, disse certa vez: “Qualquer problema que você tiver comigo, é seu.” Essa frase nos dá a ideia de que somos os únicos responsáveis por nossas ações. Não importa o que o outro tenha nos feito, sou eu a única pessoa responsável por meus sentimentos.
Somos autorizados a sentir ódio, claro! Não é proibido sentir ódio. Mas desautorizados em qualquer racionalização em cima dele. E o que isso quer dizer? Tudo o que já foi mencionado acima.
E é isso o que nos propõe a psicanálise. Passamos muito tempo construindo discursos tentando provar o quanto aquela determinada pessoa foi maldosa conosco. Mas, esse discurso não diz a verdade sobre quem você está dizendo, e sim, sobre quem é você.
O que eu digo do outro diz mais sobre mim do que do outro.
Estou me referindo aqui, a situações corriqueiras de nosso dia-a-dia. As pessoas que convivemos, e em algum momento sentimos ódio.
De acordo com Freud, a realidade é psíquica, isto é, vemos as coisas como somos, e não como elas são. Cada um constrói a sua fantasia em torno da realidade. É por isso que ninguém vivencia exatamente a mesma experiência. Teremos sempre milhares de versões em cima de um determinado contexto.
Nesse sentido, o ódio sempre se remete a mim mesmo. O que aquela pessoa tem que eu odeio tanto? Por que ela me irrita? Por que ela desperta em mim sentimentos agressivos? Às vezes negamos em nós mesmos o que outro nos escancara. Aquilo que eu quero destruir em mim, projeto no outro. É daí que muitas vezes surge o ódio.
O escritor Jorge Luís Borges possui uma frase em que diz: “A verdade é que ninguém pode nos ferir, a não ser as pessoas que amamos.” É muito dispêndio de energia destinado a alguém que não possui importância em nossa vida. O que ela poderia revelar sobre nós mesmos?
O ódio é um sentimento natural e necessário. Ele precisa comparecer inclusive, numa sessão de análise. O ódio também é o outro lado do amor, o oposto dele, é a indiferença.
Quem nunca odiou o parceiro (a), a mãe, o pai, o irmão, o amigo? Sentimos ódio sim! O problema é quando ele ocupa um lugar grande demais em nossa vida nos impedindo de conviver socialmente.
Nessa perspectiva, quando o ódio comparece nas sessões (e ele precisa aparecer em algum momento) libera-se esse sujeito das amarras que o prende ao objeto a quem se destina esse sentimento.
Por isso que a autoajuda ou os discursos motivacionais não conseguem fazer com o que o sujeito se livre disso, porque prega justamente o contrário, tentando escondê-lo, ou adiá-lo, impedindo que o sujeito possa reconhecer aquilo que é seu.
Por fim, digo a vocês uma notícia que talvez você possa causar ódio, ou não:
O inferno não são os outros.
Simony Ornellas Thomazini é Pedagoga com especialização em Psicopedagogia Institucional e Clínica; Psicóloga. Atua como psicóloga no CRAS - Centro de Referência da Assistência Social de Uniflor, e psicanalista na Fênix Desenvolvimento Humano.